Algumas Notas de Política – contribuições à leitura do contemporâneo 3x613h

[avatar =”X-CDD – Sonia M M Ogiba” size=”medium” align=”left” /] Sonia Mara M. Ogiba* Perplexos pelo avanço nos últimos tempos na política brasileira de movimentos conservadores de direita, nos campos da cultura e da educação, movimentos esses movidos por uma onda crescente de ódio e intolerância para com as diferenças de toda ordem, e pela recusa de valores históricos, somos instados a dar um lugar para nossa angústia pela via da palavra, e do pensamento. Por que as palavras e o pensamento? As palavras são nossas “metralhadoras”, como já nos transmitiram escritores e poetas, em todas as épocas, lembrando apenas dois, Mallarmé, no século XIX, ou Pier Paolo Pasolini, no século XX. Pasolini, nascido em 1922 e morto em 1975, está próximo dos que buscaram não se deixar cegar pelas luzes e holofotes dos movimentos contemporâneos de cunho fascista, crescentes não somente no Brasil, no Mundo, mas em escala planetária. É inevitável não se lembrar de Pasolini, poeta, romancista, italiano. Além de crítico de arte e de literatura, foi jornalista, teatrólogo, cineasta. Sua Italietta (Italinha, no diminutivo carinhoso), nos últimos anos de sua vida, era uma Itália anacrônica, provinciana, racista, discriminatória. Ele por ser alguém que lê o seu tempo com uma agudeza critica impressionante está entre aqueles que são tidos como diagnosticadores dos tempos que viriam. Soube como poucos “identificar os sinais de mudanças no mundo e buscar respostas novas, na condição de homem, artista e pensador”. E o pensamento? Bem, evocaremos Hanna Arendt, na leitura que faz George Didi-Huberman, para lembrar com ela a necessidade de que a atividade do pensamento seja diagonal em relação ao ado e ao futuro. Ao situar o pensamento enquanto força diagonal, e não como fechamento sobre si mesmo, esse não se separa da ação, da potencia da contestação, sendo sua direção determinada pelo ado e pelo futuro. Ainda na leitura realizada por Didi-Huberman, podemos encontrar em sua tocante obra chamada Sobrevivência dos Vaga-lumes, uma tal resistência do pensamento, como também dos signos e das imagens a isto que Walter Benjamin refletiu acerca da “destruição da experiência” na Modernidade. Destruição que não significa destruição simplesmente, diz Didi-Huberman, mas uma paradoxal ressurgência, e que Hanna Arendt parece ter expressado magnificamente em “Da humanidade em tempos sombrios”, um elogio a Gotthold E. Lessing, poeta, dramaturgo e filósofo alemão no século XVIII, ao afirmar que “essa liberdade de fazer aparecerem os povos apesar de tudo, apesar das censuras do reino e das luzes ofuscantes da glória”. Mas é também na associação feita com Sigmund Freud, em sua Traumdeutung – A interpretação dos sonhos, de 1900, que Didi-Huberman ilustra, quer a não “destruição da experiência”, quer a “força diagonal” do pensamento, em sua faculdade de fazer aparecer o desejo como o indestrutível por excelência. Nas palavras freudianas: “esse futuro, presente para o sonhador, é modelado, pelo desejo indestrutível, à imagem do ado”. É, pois, essa faculdade de fazermos aparecer o desejo como indestrutível, nas palavras de Didi-Huberman, e de nos imbuir diuturnamente de um espírito diagnosticador do nosso tempo, na esteira dos pensadores que mencionamos acima (e de muitos outros, pois exemplos não faltariam em todas as culturas e épocas), que podemos observar se erguerem em nossas sociedades contemporâneas, movimentos de reação e de resistência ao avanço dos assim chamados regimes políticos de exceção, aos ataques a democracia e aos direitos humanos, a emergência da discriminação social e cultural, aos fundamentalismos, e as explicitas tentativas de se rasgar a Constituição Brasileira nos últimos acontecimentos do mês de abril do corrente ano. No entendimento do filósofo italiano Giorgio Agamben, em Meios sem fim – notas sobre a política, ensaios do ano de 1995, portanto, reflexões de quase três décadas atrás, está para ser realizada diante dos nossos olhos, onde quer que seja, a “grande transformação” na direção do Estado espetacular integrado, já apontado por Guy Deboard, nos anos de 1967, e ao “capital-parlamentarismo”, proposto por Alain Badiou, vindo a constituir o estágio extremo da forma-Estado. Agamben que faz o alerta acima, ainda nesse ensaio de 1995 avança na compreensão de que “a política contemporânea é esse experimento devastador, que desarticula e esvazia em todo o planeta instituições e crenças, ideologias e religiões, identidades e comunidades, para voltar depois a repropor a sua forma definitiva nulificada”. Buscamos em outro ensaio do mesmo pensador, ensaio dos anos de 2006-2007, chamado de O que é o contemporâneo?, algo que a nosso juízo tem potência para fazer operar em nós todos que acreditamos naquela força diagonal do pensamento e na indestrutível força do desejo, antes mencionada, uma terceira força que a essas se entrelaça, a do “sentido de uma ação”, ainda na esteira de Hanna Arendt. Esse sentido “só é revelado quando o próprio agir (…) se tornou história narrável”. Vejamos essa terceira força – a do sentido do nosso agir – na reflexão que faz Giorgio Agamben no ensaio O que é o contemporâneo?: “(…) Todos os tempos são, para quem deles experimenta contemporaneidade, obscuros. Contemporâneo é, justamente, aquele que sabe ver essa obscuridade, que é capaz de escrever mergulhando a pena nas trevas do presente. Mas o que significa “ver as trevas”, “perceber o escuro”? Eis, então, uma exigência da nossa atualidade: Instrumentalizar-nos na percepção do escuro do nosso tempo. De que maneira? Reflete Agamben: exercitando nosso olhar na escuridão, mergulhando a pena nas trevas do presente. Um agir, certamente, na linha do que Hanna Arendt aponta, ou seja, quando nosso próprio agir se torna história narrável. Acrescentaríamos, ainda, que esse mergulhar a pena nas trevas do presente, implica também um “pensar” com os ouvidos, em virtude de que aí ressoam “vozes da humanidade”. Assim, seguindo na diretriz que nos sugerem Agamben e Didi-Huberman, nos recortes que fizemos uso nesse texto estamos na urgência de um “fixar o olhar” no nosso tempo – experimentação que Agamben vê no gesto e na escrita do poeta, em um desenvolvimento minucioso que faz no ensaio O que é o Contemporâneo? tendo por mote o poema de Osip Mandelstam – Vek (O século), do ano de 1923 –, como um modo de agir no presente para que apareçam as palavras, e as imagens, em suas ressonâncias com a temporalidade impura do desejo. Ou ainda, interrogar as “Luzes do poder versus lampejos dos contrapoderes”, como em Didi-Huberman, inspirado na “pequena luz” (lucciola) dos pirilampos, dos vaga-lumes. * Professora da UFRGS, Membro da APPOA – Associação Psicanalítica de Porto Alegre e do Instituto APPOA – clinica, pesquisa e intervenção 13859

Atenção: a ideologia de gênero já está no ministério interino! 2j1e37

foto FabiolaFabíola Rohden*
Quando o ministério do governo interino de Michel Temer foi anunciado, uma das primeiras reações foi quanto à ausência de mulheres, assim como também de negros ou integrantes de outras etnias e segmentos sociais que representassem a diversidade da população brasileira. O interessante é que nem foi preciso a academia ou os movimentos feministas chamarem a atenção para isto. Acredito que a escolha da composição e a ampla reação a ela podem ser avaliadas à luz do que é se dar conta das diferenças de gênero hoje em dia e de quem é capaz desta percepção.
Supostamente, segundo declarações posteriores, o privilégio aos homens não teria sido intencional. Isso quer dizer que os ministros interinos foram escolhidos “naturalmente” em função de suas posições no campo político, deixando evidente a desvinculação com a capacidade técnica. Se acreditamos nesta explicação, foi um fenômeno “natural” as mulheres terem sido ignoradas. Ou seja, o proponente do ministério não teria sequer se dado conta de que em pleno século XXI, nem que fosse por razões demagógicas e estratégias, seria inaceitável e até mesmo ridículo uma composição tão homogênea e avessa à diversidade. Inaceitável e ridículo porque em qualquer lugar do mundo contemporâneo que valorize a democracia e a igualdade, em qualquer documento envolvendo acordos e organismos internacionais emitido desde meados do século XX, a busca por representações mais plurais e igualitárias é imprescindível, inclusive para o reconhecimento da legitimidade de um governo. O que poderia então explicar esta espécie de cegueira, que impediu que durante as várias semanas de planejamento que antecederam a tomada do poder, esta questão não tivesse vindo à tona?
É difícil de acreditar que nenhum dos senhores envolvidos naquelas articulações não tivesse sequer um vago pressentimento de que o arranjo do grupo teria que ser pensado sob outros ângulos e que, por exemplo, a presença das mulheres deveria ser considerada. Em contraste, se pensamos na reação da imensa maioria das pessoas, o que vem à tona é o estranhamento. Algo parece estar errado quando se vê a foto da “posse” e os atos subsequentes só confirmaram as desconfianças iniciais. Tudo parece um tanto antigo, inadequado, ultraado ou, pior ainda, traz à cena uma nítida imagem de retrocesso.
Este incômodo parece revelador da época em que vivemos. E pode ser entendido por meio de dois caminhos. O primeiro diz respeito ao fato de que, se do lado de cima, do conforto da posição de quem está assumindo o poder sequer se notou que a ausência das mulheres seria um problema; do lado da imensa maioria da população, composta de pessoas necessariamente atentas às desigualdades, isto é escandaloso. Este é o lado de quem sente, percebe, se identifica e se solidariza diante de qualquer forma de discriminação e se posiciona sempre com ouvidos e olhos atentos a ações que reproduzam as desigualdades. Temos, portanto, em um plano, a suposta falta de percepção do problema; no outro, a vigilância constante, produzida e lapidada por séculos de exclusão.
http://www.facebook.com/midiaNINJA/videos/652647691560046/
O segundo caminho de compreensão sobre o incômodo se refere ao panorama de mudanças que foram sendo construídas mais amplamente na sociedade. Felizmente, apesar de todas as dificuldades e retrocessos constantes, a trajetória em direção à conquista do reconhecimento da diversidade em termos de gênero, de raça/etnia, de orientação sexual dentre outros aspectos, tem se mantido constante. Não há mais como fechar esta janela de percepção das desigualdades e de empenho na luta pela construção de uma sociedade mais justa. Frente à cegueira daqueles que se colocam acima dessas reivindicações, crescem os desejos, os compromissos e a capacidade de articulação de quem já vislumbrou um outro mundo possível.
Esta competência para perceber como as diferenças sociais, traduzidas em assimetrias de poder e injustiças, foram historicamente produzidas e continuam a ser perpetuadas é o que vem sendo chamado, em tom acusatório, de “ideologia de gênero”, por muitos daqueles que se arvoram detentores do poder. Este termo não é usado no campo acadêmico ou na fundamentação de projetos de intervenção bem fundamentados. Mas neste contexto a referência me parece adequada. Recorrendo à acepção mais geral do termo ideologia, trata-se do conjunto de crenças ou certezas culturais e políticas de um indivíduo ou grupo em determinado momento histórico. Pode-se dizer, então, que a “ideologia de gênero” assumida pelo governo interino reflete a crença ou a certeza de que não é necessário pensar ou considerar as diferenças entre os gêneros na nossa sociedade. Trata-se de uma certeza que é simplesmente assumida, neste caso, pela naturalização da ideia de que as mulheres e outros grupos não precisariam estar presentes no primeiro escalão do governo mas deveriam sim se manter alijados das decisões sobre os rumos do país. O problema, infelizmente para eles, é que em contraste à esta cegueira intencional, há muito tempo já se projetam os holofotes que nos obrigam, todos os dias, a perceber as diferenças. A presença das mulheres nas ruas não deixa dúvida sobre isso.
*Antropóloga
 

No rastro da nova-velha direita e o giro reacionário do senso comum brasileiro – 1 5c5w4e

bruno_KQBruno Lima Rocha*
Introdução
Neste primeiro artigo, inicio uma breve série tentando mapear a nova (velha) direita. O objetivo deste e dos textos que seguirão é tentar identificar a origem contemporânea do giro reacionário do senso comum brasileiro e suas similitudes com o conservadorismo dos EUA, e, por consequência, a transferência do léxico, do glossário e das identidades políticas gestadas no interior do sistema político do Império. Entendo que, se identificarmos os focos domésticos e internacionais do pensamento conservador, reacionário, ultraliberal e com laços neofascistas, estaremos aptos a tentar estancar o que venho afirmando como “fedor de linha chilena” tendo vasto crescimento no Brasil.
A ascensão do reacionarismo nos últimos dez anos: a aliança entre neopentecostais e a extrema direita militar e policial 
O Brasil vive um momento de ascensão de ideias conservadoras, a maior parte destas transitando pelo ultraliberalismo, podendo ser rastreada esta linha como equivalente às da direita do Partido Republicano (ou seja, a extrema direita de corte neoliberal) e combinadas com o pensamento conservador, ou do pacto neoconservador. Este que se avoluma nos EUA a partir da vitória de Richard Nixon em 1968, reforçada com a Doutrina Reagan e a desregulação financeira – primeiramente em 1973 e depois, ao longo dos anos ’80 do século XX – e por fim, ganhando dimensões absurdas, durante o primeiro mandato do governo democrata de Bill Clinton (1993-2000). A nova direita republicana já constava na convenção deste partido quando George H. W. Bush (Bush pai) era considerado, para a constelação política conservadora do período, como o menos mentecapto dos pré-candidatos da bolha conservadora para a Casa Branca. Da corrida eleitoral no Império, em 1992, ando pela famigerada reeleição de Bush Jr. Em 2004, até a nova onda de golpes brancos na América Latina temos como identificar a transferência da identidade política estadunidense para nosso país.
No Brasil, somos atingidos pela combinação dos neoconservadores no comportamento – uma espécie de reação contra a ação afirmativa e os direitos de reconhecimento – e a primazia do capital financeiro e a cruzada dos neoliberais contra o pacto keynesiano que atinge o Brasil durante o lulismo. Esta soma, bastante explosiva, tem na classe média brasileira, e em sua classe média alta, um bastião mobilizado através das redes sociais e que pode ter ou não algum contato com o fascismo brasileiro na versão contemporânea.
É como se fosse um jogo com rodadas simultâneas, onde os reacionários no comportamento somam viúvas da ditadura e por vezes se encontram nas pautas programáticas de inspiração totalitária e obscurantista, como a famigerada “escola sem partido”, ou campanha contra a doutrinação nos aparelhos ideológicos de reprodução. Por vezes os ultraliberais se encontram, domesticam as “feras” medievais brasileiras, e noutras, de forma autônoma, operam como “cavalo de batalha” da agenda neoliberal de desmonte das capacidades de intervenção estatal na economia capitalista e na regulação do agente econômico por sobre a vida cotidiana.
Podemos identificar os movimentos ultraliberais como as empresas de marketing digital, a exemplo da empresa líder, o Movimento Brasil Livre (MBL). Tais instituições privadas respondem ao agendamento da Fundação Koch (charleskochfoundation.org) e da Rede Atlas (atlasnetwork.org) e demandam um texto específico, ainda nesta série. Já quanto ao neofascismo brasileiro, este é manifesto pelo líder caricato embora perigoso, deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e sua aliança com as estruturas do pastor Everaldo (Assembleia de Deus em Madureira) e o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP,que comanda uma matriz autônoma e dono da rede de franquias da fé, o Ministério Tempo de Avivamento). Estes dois operadores político-religiosos de matriz econômica (no mercado da exploração da fé) se aproximam, afirmo, perigosamente, de um programa ultraliberal (vinculando seu programa ao do Tea Party), com as viúvas e viúvos da ditadura – tendo a bandeira do reconhecimento dos torturadores e repressores como “heróis nacionais” – e um culto ao revanchismo da linha dura diante da transição negociada comandada por Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva.
Ainda mais obscena é sua liderança ideológica, com o ainda mais caricato e lunático astrólogo Olavo de Carvalho. Este pregador virtual, mescla um libelo em defesa da “civilização judaico-cristã” para fortalecer ambas as posturas acima narradas – neopentecostal e de extrema direita policial militar. A pregação anti-esquerda e anti-latinoamericana do “professor” Olavo de Carvalho, produzindo demências por internet a partir do estado da Virgínia (EUA), surpreendentemente traz consigo centenas de milhares de seguidores. Olavo é em si mesmo a síntese desta perigosa caricatura da nova direita brasileira, e sua pregação de “escola sem partido”, onde afirma que a doutrina se diluiu no comportamento pregado em sala de aula ao ponto de sequer ser explicitada. Ou seja, se a acusação for válida, então o comportamento orientado pela técnica a serviço do mundo do trabalho controlado pelo capital, é a única válida. O fascismo social existente nestas afirmações está na moral conservadora, na negação do outro (ausência de alteridade), na afirmação da norma “ocidental” (judaico-cristã, capitalista, conservador, heteronormativa) como valor único e na disposição para gerar o caos para que deste surja um novo sentido de ordem.
Uma consequência tangível do revigoramento das viúvas da linha dura
É este tipo de demência, retroalimentada pelos programas policialescos e editoriais reacionários de TV aberta – comandados por gente como José Luiz Datena e Raquel Sherazade – acaba por ter dois efeitos políticos simultâneos. Um aponta para a redução da maioridade penal e uma defesa da violência estatal sem questionar o falido e corrupto modelo de polícia brasileiro. O outro foi visto de forma estarrecedora na defesa da intervenção militar ou a volta da ditadura. Tais defensores da ditadura afirmam que todo o pensamento de esquerda – mesmo o de centro-esquerda -, em última análise, não seria compatível com a democracia parlamentar e estaria o tempo todo promovendo a luta ideológica para controlar instituições reprodutoras dos aparelhos centrais – como escolas e universidades – e assim aplicar uma visão de mundo centrada na luta social e no coletivismo. A direita considera isso uma espécie de “totalitarismo” e chega a aceitar a possibilidade de que, na ausência de ordem pública, tenhamos uma intervenção militar (o texto constitucional, no seu artigo 142, tem realmente alguma leitura ível de controvérsia). Neste sentido, ao negar a possibilidade de que qualquer pensamento de esquerda possa conviver em democracia parlamentar e na concorrência pelo poder do Estado burguês, há similitude na análise dos ultraliberais e da extrema direita policial e militar. Daí viria à convergência destas duas formas de pensamento na defesa da suposta “escola sem partido” e de absurdos como o “ensino neutro das ciências humanas e sociais”. Se observarmos a movimentação dos apoiadores de Bolsonaro nos campi da UFRGS, estes afirmam que “a universidade não é um espaço para lutar, mas somente para estudar”. Repetem de forma bastante concreta um dos lemas da ditadura, “estudante estuda e trabalhador trabalha”, aplicando uma fórmula de obediência social cuja única forma de mobilidade seria através da acumulação de capital ou na seleção “meritocrática”.
Mesmo observando que não há nenhuma exequibilidade por parte das Forças Armadas em fazer nada parecido como intervenção militar constitucional, há um ponto de convergência. O governo “interino” – no meu entender, golpista – trouxe o retorno dos militares GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e o seu comando a cargo do general de exército (da ativa, quatro estrelas) Sérgio Westphalen Etchegoyen. Esta medida, além de apontar um enlace do presidente golpista Michel  Temer com a ala mais reacionária da Força Terrestre na ativa, seria uma espécie de acerto de contas com a Comissão da Verdade. Esta fora uma tímida comissão e cujo relatório final foi bastante criticado por militantes históricos dos direitos humanos. Mesmo assim, ao mencionar o nome do general Leo Guedes Etchegoyen como um dos 377 agentes do Estado diretamente responsáveis por crimes contra os direitos humanos, atiçou o grito de “revanchismo” por seu filho, general da ativa que ocupava desde março de 2015, o importante cargo de chefe do Estado-Maior do Exército.
Ao se manifestar contra a Comissão da Verdade mesmo estando na ativa, o general Etchegoyen abrira um perigoso expediente. Sua indicação para o cargo de ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional termina soando como um reforço das viúvas da caserna, aproximando-os dos militares da reserva que têm discurso de mágoa em relação ao período pós-Anistia.
* Bruno Lima Rocha é professor de ciência política e relações internacionais.
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