Vereadores adiam mais uma vez decisão sobre o Plano Diretor 32305v

O país parou para ouvir as acusações do deputado federal Roberto Jefferson (PTB) em 14 de junho. Dois dias depois, a Câmara Municipal de Porto Alegre ainda se ocupava quase que exclusivamente da crise em Brasília. Os vereadores de oposicão ao governo Lula e ao PT acusavam o Planalto de ter “culpa no cartório”. Os petistas e aliados, por seu turno, defendiam o governo e denunciavam o “golpismo de direita”. Coube ao experiente vereador João Dib (PP) dar um puxão de orelhas nos colegas. Ele observou que a população espera que a Câmara Municipal ofereça soluções para os problemas da cidade e criticou a falta de quórum durante a sessão plenária, no dia 15, o que fez com que os trabalhos fossem encerrados mais cedo. “Será que é para isto que o povo nos paga?”, questionou, lembrando que o Legislativo ainda precisa discutir a formação da comissão especial para revisar o Plano Diretor. A discussao sobre o Plano se arrasta desde o ano ado, sem qualquer perspectiva. O secretário do Planejamento, Isaac Ainhorn (PDT), afirmou que a revisão deveria ser concluída em 2005. Mas até agora não mandou os projetos de lei que prometeu enviar a partir de abril. Entre eles está o que trata das áreas especiais de interesse cultural e da revisão das alturas das edificações e dos índices construtivos. Os vereadores, ao invés de fiscalizar a Prefeitura e cobrar os projetos, se omitem. O presidente da Câmara Municipal, Elói Guimarães, garantiu que se esforçaria para implantar a Comissão do Plano Diretor o quanto antes. Mas na metade do ano, o tema não entrou na pauta dos legisladores. O assunto só é discutido por iniciativa dos moradores, que ocupam a Tribuna Popular para pedir providências quanto às distorcoes introduzidas no Plano. Enquanto isso, no mesmo dia 16 de junho em que João Dib chamou a atenção dos colegas, foram aprovados quatro projetos instituindo premiações a serem concedidas na Câmara, como o “Prêmio Leonel Brizola de Ética Política”. Outros três projetos aprovaram o nome para uma rua, para um terminal de ônibus, e para o complexo cultural Porto Seco. Teve um legislador que vibrou com o sinal verde para a instalação de um busto numa praça. Mais três projetos instituíram um dia para determinado tema (como o dia da Grécia), e a inclusão da Festa do Ridículo no Calendário de Eventos Oficiais de Porto Alegre. Ainda no dia 16, dois projetos de lei entraram em discussão. Um deles inclui no calendário de eventos oficiais de Porto Alegre o Mix Bazaar. Outro de autoria da vereadora Mônica Leal (PP), concede o título honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao ex-vereador Pedro Américo Leal, pai da parlamentar. Ou seja, pelo andar da carruagem, ainda em 2005, diversas ruas da cidade vão ganhar nome. Vários habitantes da Capital irão receber o título de Cidadão de Porto Alegre, mas o município vai continuar sem concluir a revisão de seu criticado e ainda incompleto Plano Diretor. 4i18m

“O poder público cedeu a interesses privados” 47b4m

Guilherme Kolling
Lauro Hagemann foi o relator do Plano Diretor de Porto Alegre, em seu quinto e último mandato na Câmara (1997-2000). Hoje ele é crítico do Plano que ajudou a construir.
Diz que idéias nobres, como o Solo Criado, foram deturpadas. E que a cidade “está a mercê de aproveitadores, que iludem um debilitado Poder Público”.
“Os es não se interessam por urbanismo e são ludibriados por outros interesses, particulares. No tempo do PT já era assim, mas ainda tinha algum equilíbrio. Agora, com o Fogaça, piorou. Entregaram a chave do galinheiro para o gambá cuidar”, aponta, enigmaticamente.
Aos 75 anos, Hagemann completa 59 anos de rádio. Locutor do famoso “Repórter Esso”, voz da resistência no episódio da Legalidade, líder estudantil e militante comunista há décadas, ele pretende relatar suas memórias num livro que já tem até título: “O vendedor de histórias”.
Para falar do Plano Diretor ele recebeu a reportagem do JÁ, nas tardes de 13 e 16 de maio, no seu apartamento no bairro Petrópolis, onde mora há dois anos.
Que está achando do Plano Diretor após cinco anos em vigor?
Esse Plano Diretor que está em vigor tem um artigo que prevê a revisão em cinco anos. Mas existe o Conselho do Plano Diretor, que pode modificar a qualquer hora. Claro, tem regras, não é uma mexida indiscriminada, os processos mais complicados têm que ar pela Câmara. Mas ajustes pequenos, o próprio Conselho do Plano pode formular.
E esta participação está ocorrendo?
Acontece que o Plano Diretor deveria ser – deveria, mas não é – um assunto dominante da sociedade, porque afeta a vida de cada um. A metragem dos terrenos, a altura dos edifícios, a insolação, a aeração, o tráfego, a estrutura viária, tudo, tudo! A vida do cidadão em geral é afetada pelo Plano Diretor.
Não é por nada que o Estatudo das Cidades está obrigando municípios com mais de 20 mil habitantes a ter um Plano Diretor, pois mais de 80% da população brasileira vive em áreas urbanas. E as nossas cidades são muito mal cuidadas, mal planejadas. Isso aqui parece um pé de mandioca! Sai uma raiz para cada lado.
O resultado estamos vendo aí. Claro, o país ainda é muito pobre, muito novo, e tem muita coisa por fazer antes disso, como alimentar essa tribo toda. Então, estamos num brete. Ou a gente começa a cuidar disso imediatamente, ou nós vamos nos dar mal daqui há alguns anos.
[quote style=”4″ author=”LH”]A nomeação de Isaac Ainhorn para a Secretaria do Planejamento é sintomática do que está acontecendo[/quote]
Explique essa comparação de Porto Alegre com um pé de mandioca?

A cidade está crescendo desorganizadamente. Sai uma raiz para cada lado. Porto Alegre sempre teve a fama de ter sido organizada, teve Planos Diretores e gente interessada em manter esse planejamento urbano. Mas agora, parece que se desequilibrou um pouco. E o desequilíbrio é de origem econômica.
O setor interessado em valorizar cada vez mais o território urbano predomina, ao que parece, na reformulação da cidade. E isso não é bom, porque a cidade não é propriedade de uns poucos, ela deve ser apropriada por todos. O setor econômico e os setores urbanos, claro, eles estão no papel deles.
Só que nós não temos mecanismos… A Prefeitura quando estava com o PT ainda tinha um pouco de poder para segurar isso aí. Agora com o Fogaça parece que não tem mais. E aqui – é duro de dizer isso – deram o galinheiro para o gambá cuidar.
Traduzindo…
A tradução é complicada, não quero agredir ninguém. Entenda quem quiser… Quando nós elaboramos o Plano Diretor – elaboramos não, porque ele já veio pronto – quando relatamos e ajudamos a construir o Plano Diretor havia uma outra correlação de forças. Como foi isso na Câmara? Antes, conforme o secretário Burmeister… O Burmeister está mordido…
Ele falou que o Sinduscon estava presente em todos os debates e conseguiu aprovar o seu ponto de vista. E na Câmara como é que foi?
A Câmara refletia isso. A gente segurou o que deu lá. Agora, nesta primeira revisão do Plano Diretor, eu receio que o desequilíbrio seja tão grande, que a correlação tenha mudado tanto que não se consiga impedir mais as modificações estruturais que vão nos levar para o brete. Se olharmos a cidade do lado de fora, vamos ver que ela já está apresentando problemas, caracterizados pelo excesso no crescimento em determinadas regiões.
Que acha dos movimentos de bairro, como o do Petrópolis, que contesta a situação atual?
Isso preocupa a gente, que o interesse econômico sobrepuje o interesse da habitabilidade. Nós vivemos numa cidade que tem tudo para ser um lugar aprazível para se viver. Agora o que não pode é uma meia dúzia querer tomar conta e fazer disso um cavalo de batalha para ganhar dinheiro. Nós já cedemos bastante no Plano Diretor: os índices de construção foram aumentados… Isso é natural, não estou dizendo como crítica. Tínhamos que ter feito isso porque a cidade cresce, não é uma coisa estanque. Ela não tem para onde se mexer, então a mexida era para cima. Mas isso precisa ser feito com jeito para não deixar que a vida diária do homem seja transformada num inferno.
[quote style=”4″ author=”LH”]É duro dizer isso, mas aqui em Porto Alegre deram o galinheiro para o gambá cuidar[/quote]
A sua participação como relator do projeto do Plano Diretor…
Aquela relatoria foi um negócio engraçado. Tinha três relatores setoriais e depois o relatório geral, que era eu quem fazia, mas era muito técnico aquilo. Foi feito pelos arquitetos e urbanistas, a Secretaria do Planejamento teve papel importante. Tínhamos uma equipe de urbanistas ligados ao velho Partidão.
Os comunistas sempre foram os ponteiros nessa história da urbanização, porque para nós, esse tema é muito importante, significa uma questão prática do assentamento do homem sobre a face da terra, a repartição do solo urbano. Por que precisamos viver amontoados com tanta terra disponível?
Tem que planejar, dividir essa ocupação em áreas para cada coisa. Por isso que para nós a Secretaria do Planejamento é muito importante. E os nosso prefeitos, infelizmente, não todos, não dão muita importância a isso. Dão uma importância mais política, de composição momentânea.Não é de previsão a longo prazo. Temos que dar a possibilidade de prever o que vai acontecer daqui a 50, 100 anos!
Os prefeitos do PT não deram muita atenção a isso?

Não deram. Infelizmente a gente tem que dizer que eles se deixaram envolver. E por interesses menores. Havia muita exploração política nesse processo.
Os prefeitos do PT sempre tiveram interesse, mas era mais interesse político-partidário, de controlar um determinado setor da cidade. E embora a Prefeitura tenha técnicos notáveis, as vezes o controle fugia um pouco das mãos do prefeito.
[quote style=”4″ author=”LH”]A qualidade dessa Câmara não é das melhores, os interesses que predominam são muito miúdos[/quote]
E no caso do Fogaça?

Agora piorou. O Fogaça nunca teve afeição por essa questão urbana, pelo menos que se saiba. E ficou completamente nas mãos de certos setores da cidade que têm outros interesses.

Que acha da nomeação de Isaac Ainhorn para a Secretaria do Planejamento?

É sintomática. Conheço bem o Isaac, nós trabalhamos juntos na Câmara. O Isaac não é por ele não, é que ele representa um segmento da cidade que tem interesses um pouco diferentes. E isso não é bom para a cidade. A cidade deve ser vista com equilíbrio, e não favorecendo este, aquele, ou aquele outro.
Ele diz que vai ouvir todos os segmentos.
Ouvir é uma coisa… Eu sei porque estive 18 anos na Câmara e eu ouvi todo mundo também.
Mas agora há discordâncias, grupos que divergem sobre o Plano Diretor…
Está havendo uma disputa. Tem um grupo de urbanistas, oriundos ainda do tempo do PCBão, que enxerga a cidade de outro modo. Não sob o aspecto meramente econômico. Vêem a cidade como um organismo vivo, em favor do homem, da sociedade que habita isso aqui. Não como uma fonte de exploração.
E como favorecer toda a população?
Há uma porção de instrumentos urbanísticos que foram introduzidos na urbanização, o Solo Criado… O Estatuto da Cidade veio buscar aqui essas concepções! E muitas cidades de porte grande, capitais e do interior, vieram buscar o exemplo em Porto Alegre. Não fui eu quem produzi, eu fui o agente político de uma concepção. Isso chamou a atenção. A primeira legislação urbana que eu introduzi, a primeira modificação foi a Concessão Real de Uso, copiada de um município do interior de São Paulo, que era dirigido por um comunista.
O que é a Concessão Real de Uso?
O cara não expulsa o cidadão. A Vila Planetário foi construída na Concessão Real de Uso.

Uma espécie de uso capião urbano?

Isso, mas o terreno pertence ao Poder Público, não se transfere. Nós tínhamos dentro do PT a Líres Marques que queria vender os terrenos. Ela foi diretora do Demhab no tempo do Olívio Dutra. Sustentamos uma dura luta com ela, que queria vender os terrenos da Prefeitura, e nós não queríamos vender.
Queríamos cedê-los e acabou acontecendo isso. Por 30 anos, mediante um documento, o cidadão que habitava aquele terreno, provando certas condiçãos, ficava por 30 anos garantido ali, pela Concessão Real de Uso. É um instrumento urbano antigo, isso vem lá dos romanos, não é coisa nova.
Nós apenas recondicionamos. Esse é um dos instrumentos. Tem as áreas especiais de interesse (as AEIs), o IPTU progressivo, são instrumentos legislativos urbanísticos que visam a levar tudo isso para um determinado fim.
[quote style=”4″ author=”LH”]Plano Diretor é um assunto tão complicado que a maioria da população não quer nem tomar conhecimento[/quote]
Mas isso tudo ainda está no papel. As áreas de interesse cultural, por exemplo, não foram implementadas.
Aí é com o Executivo. O instrumento está ali. A sociedade tem que brigar para aplicar isso, obrigar o Poder Público. A venda de índices, por exemplo, dá recursos para ajeitar certas áreas da cidade. Tem possibilidade imensa de fazer isso. Mas não sei, vendem índices e a gente não fica sabendo. É aquela história, isso é um assunto tão complicado que a maioria da população não quer nem tomar conhecimento. É aquele velho aforismo latino: “O que não se conhece não se quer”.
Mas há grupos que conhecem a lei e não querem, por exemplo, as áreas de interesse cultural, porque podem frear o desenvolvimento da cidade.
Eles querem desenfrear! Mas isso é natural, tem que haver no meio disso um poder que equilibre tudo. Que faça concessões para os interesses imobiliários, mas que esses interesses imobiliários revertam alguma coisa em favor das massa populacional. Quando eu estava na Câmara, negociava muito com o Sinduscon. E o Sinduscon sempre respeitou muito a posição da gente.
Mas a gente dizia o seguinte: “Vocês vão levar o pedaço que cabe a vocês. Mas o pedaço que cabe a população vocês têm que respeitar”. E muitas concessões foram feitas, em termos de números, volumetria, essas coisas. Isso tudo era negociável. “Vocês levam isso aqui, mas em compensação dão isso aqui”.
E era um negócio bom para os dois lados. O que me preocupa agora é a possibilidade de esse equilíbrio ter se rompido em favor dos setores que só que têm interesse pessoal, particular e não o interesse da coletividade.
Plano Diretor é um negócio complicado, não é para qualquer um. Tem muito engenheiro e arquiteto que não entende nada de Plano Diretor. E muito menos. Esse é o meu temor, que eles sejam levados por interesses momentâneos. Isso é que não podia acontecer.
Houve lobby durante a feitura desse Plano Diretor na Câmara?
Isso sempre existiu, não é coisa nova. E esse campo é muito propício a isso, cada centímetro quadrado de terreno nessa cidade vale uma fortuna, imagina os interesses que movem essa divisão. O problema é a gente conseguir se manter mais ou menos eqüidistante disso.
Para estabelecer esse equilíbrio, não deixar que essa coisa corra solta em favor de um lado só. A cidade é de todos, não é de alguns. Onde ela se transformar cidade de uns, desequilibra o processo e aí ela perde seu sentido de cidade, vira um amontoado de gente que não tem o sentido de cidade, agregação de pessoas vivendo numa mesma área.
E a morosidade nesse processo. A Comissão do Plano Diretor na Câmara, por exemplo, não foi instalada ainda.
Isso é mais velho que o mundo. Pode parecer que a gente está mordido – cachorro mordido de cobra tem medo de lingüiça –, mas a qualidade dessa Câmara que está aí não é das melhores.
Os interesses que predominam aí são muito miúdos. E Plano Diretor é um negócio muito profundo para ser mexido por gente que não tem um mínimo de compreensão global. Não dá para planejar uma rua, um segmento da cidade, sem ter uma visão do todo. Porque uma distorção aqui vai causar problema lá adiante.
[quote style=”4″ LH=”Author”]Não pode deixar uma meia dúzia fazer da cidade um cavalo de batalha para ganhar dinheiro[/quote]
A cidade já sente isso?
Essa cidade está cheia de problemas, até na configuração física dela. O problema das enchentes, das enxurradas… O Olívio é quem começou a enterrar cano, mas não foi o suficiente. Aquela zona ali perto do aeroporto, no São João, o 4º Distrito, aquilo é uma lagoa. A Vila Farrapos está não sei quantos centímetros abaixo do nível do rio. Toda a Vila Farrapos! Isso é um perigo permanente.
O debate fica nessa área central, com maior poder aquisitivo, há problemas de ocupação irregular na Zona Sul e Zona Norte, áreas carentes…
Aí é que veio a sugestão e a confecção da lei do Solo Criado, que é justamente tirar recurso de áreas já adensadas para desenvolver áreas que podem ser adensadas, com recursos da comunidade. O Estado não tem como fazer isso. Com esse recrutamento da venda de índice, vai fazendo aos poucos.
Agora, infelizmente a política brasileira vive de resultados imediatos. O cara quer saber se no fim do mandato ele consegue se reeleger com o que fez. Não é por aí que a gente istra uma cidade. Porto Alegre tem 200 e não sei quantos anos e foi crescendo. Tem que dar um jeito, melhorar, ordenar. Mas ninguém tem paciência para fazer isso.
O Solo Criado é criticado por aumentar ainda mais os prédios numa área que já é densa.
Pois é o que está causando o paliteiro. Mas aí é uma distorção. Falta controle. O Solo Criado não foi criado para isso. Foi criado para outra coisa. Só que os aproveitadores viram no Solo Criado uma maneira de aumentar a área construída.
E não foi criado para isso…
Claro, foi para desenvolver outras áreas da cidade, que tenham capacidade de desenvolvimento. O 4º Distrito, por exemplo. A transferência da capacidade construtiva de uma área para outra foi permitida. Só que precisa pulso para colocar isso em execução.
Porto Alegre é vítima da falta de pulso?
É. O Poder Público não consegue segurar o desenvolvimento da cidade. E a cidade procura se desenvolver nos lugares em que tem condições melhores. O investidor urbano procura isso.
A grande reclamação da construção civil era o alto custo da terra. Com o Solo Criado, este alto custo da terra foi aplacado. Aumentaram os índices de construção. Com isso puderam fazer edifícios que antes eram de três pavimentos e agora são de seis, cinco.
E o caso de edifícios altos ao lado de casas. É outra distorção?
Nisso aí não se pôde mexer, porque a estrutura da cidade é muito antiga. Para legislar sobre essas coisas, tem que arrasar a cidade e começar de novo. Isso é uma situação que nós não temos.
Os técnicos procuraram manter um equilíbrio das alturas com essa questão da insolação e da aeração. Mas isso não é fácil aplicar sobre uma cidade já construída. Tem coisas pelo caminho aí que não consegue superar.

Acredita numa retomada de pulso do poder público, pressionado pela população.
Eu acho que é muito difícil. Nós temos que obedecer o processo democrático normal. Aí, só na próxima eleição.
Então, até o final dessa istração…
Eu acho que eles estão aproveitando e correndo contra o tempo. Isso é próprio da espécie humana. Quando encontra uma brecha, se mete, e se mete ligeiro e alarga o quanto pode. O que vier depois veio. Isso está feito. É a política do Hitler, a política da coisa feita.
Não é perigoso que quando a revisão do Plano Diretor acontecer de fato o dano já esteja feito, que haja uma situação sem volta?
Pode, o meu temor é esse! Que haja um desequilíbrio tão grande na cidade que depois não se consiga mais reverter isso. A cidade pode ficar liquidada por ação da pressa ou da inépcia. Já temos um processo de conhecimento técnico e social para fazer o que queremos dessa cidade, aonde ela pode ser ampliada.
O ex-prefeito Alceu Collares tinha um projeto de crescimento na Orla.

A reforma no Plano Diretor do Collares teve um resultado meio complicado, que não foi muito boa. Deixou seqüelas. Mas aí os interesses partidários e particulares predominaram mais do que qualquer outra época.
E o crescimento das áreas pobres?
Claro, a gente tem que cuidar de toda a cidade. Todos os bairros cresceram. A minha preocupação sempre foi com a periferia, porque a periferia afeta a cidade como um todo. De lá para cá vem as mazelas. Deixar criar confusão lá repercute no resto da cidade.
E a expulsão das vilas da área central da cidade. Moradores vizinhos queriam transformar a Vila dos Papeleiros em parque.
Isso é uma questão que se deve discutir muito. Claro, tem que preservar áreas verdes. Mas também é importante a outra destinação para a cidade, de abrir a capacidade de assentamento desse pessoal que está solto. E depois é uma luta. Na Vila Planetário, gente que nunca teve condições ganhou uma habitação.
É perigoso para um cara que não tem condições de ter aquilo ali. O sujeito nunca teve uma torneira d’água e de repente tem banheiro. É comum o cara vender logo a chave. Não foi para isso que se criou essa legislação toda, a Concessõa Real de Uso. Mas não é só com escola que se resolve. É com a vida, com exemplos. É um processo educacional.
[quote style=”4″ author=”LH”]Me preocupa que o interesse econômico sobrepuje o interesse da habitabilidade, do coletivo[/quote]
E a informação no Plano Diretor?
A população está a parte. É um tema árido! Árido! Todo cheio de pontas e muito técnico. Até porque parte da nossa elite prefere manter a população nesse grau de ignorância para mais facilmente dominar.
Já imaginou se cada cidadão de Porto Alegre soubesse exatamente o que é o Plano Diretor? Estes grandes construtores não iriam a lugar nenhum. Eles precisam desta ignorância. E compram.
Compram com o quê?

Com tudo… Dinheiro vivo. Fazem qualquer negócio. O valor maior sempre foi a terra. Agora, o valor da terra está sendo transferido para informação. O metro quadrado na cidade de Porto Alegre vale uma fortuna. E os caras brigam e matam por esse metro quadrado. Isso a gente vê a toda hora.
No decorrer da história esses valores vão se alterando. O valor da terra, o valor do ouro, já não é mais o mesmo. Então, hoje, o grande valor quem tem é a informação. A informação se transformou no valor mais estável e concreto que o homem dispõe para fazer troca. E nesta questão do Plano Diretor, a informação tem um papel saliente. Quem não estiver bem informado…

RBS investe contra jornais de bairro 2x6x5y

Uma mensagem do Departamento Comercial da Zero Hora está chegando às agências de propaganda de Porto Alegre anunciando o lançamento de quatro jornais de bairro, dia 5 de agosto. Bom Fim, Moinhos de Vento, Bela Vista e Zona Sul são as áreas visadas.
Os jornais de bairro serão encartados nos exemplares de s de Zero Hora nestas regiões, mas estarão também a venda nas bancas e terão distribuição gratuita em “pontos estratégicos”. A cada semana circula um dos jornais, sempre às sextas-feiras.
Esta é a segunda tentativa que Zero Hora faz, seguindo o modelo de O Globo no Rio de Janeiro, para ocupar também o espaço do jornalismo comunitário.
Na primeira, em 1992, lançou também quatro cadernos regionais. A experiência durou menos de três anos e foi um fracasso. Os cadernos foram suspensos em 1995, pelo então diretor de redação Augusto Nunes.
O cronograma do relançamento é o seguinte:
– 5 de agosto: Bom Fim (+ Santana e parte de Rio Branco) ;
– 12 de agosto: Moinhos de Vento (+ Auxiliadora, Independencia, Floresta e parte de Rio Branco);
– 19 de agosto: Bela Vista (+ Mont Serrat, Tres Figueiras e Boa Vista);
– 26 de agosto: Zona Sul (Ipanema, Tristeza, Setimo Ceu, Assunção, Vila Conceição).
A Associação dos Jornais de Bairro de Porto Alegre planeja lançar nos próximos dias um manifesto denunciando a “ação predatória de uma grande empresa, contra os pequenos empreendimentos de jornalismo comunitário”.

Relho e Palmatória 69409

O idioma nacional, que herdamos de Portugal compulsoriamente, sem direito de escolha, é um milagre de sobrevivência em razão dos assassinatos diários de que é vítima. E a origem dos assassinos não está apenas nas camadas populares, que mal tiveram tempo para adentrar as salas de aula. Muita gente boa, que freqüentou a universidade e ostenta o diploma no lugar mais visível do escritório, deve ser processada e julgada por ass diariamente o idioma nacional. Incluem-se no grupo de celerados até mesmo jornalistas de razoável prestígio, que escrevem mal, numa incompatibilidade visceral com a grafia e a gramática. Nem perco meu tempo referindo um grande número de políticos, eleitos com expressiva votação, que jamais se arriscaram na travessia das páginas de um livro, com medo de cair de quatro e não levantar mais. A verdade é que o idioma pátrio vive numa situação da mais absoluta orfandade, sem que se note qualquer mobilização da sociedade para defendê-lo. A anarquia tomou conta do pedaço. Só para que os amigos tenham uma idéia. Há poucos dias, faixa colocada na frente de uma loja na Azenha anunciava uma “enchurrada de bons preços”, assim mesmo como o amigo está lendo. E, ao que consta, ninguém foi preso. Nem o celerado que pintou a faixa, nem o proprietário da loja que consentiu na exposição daquela barbaridade. Uma enxurrada de injúrias é o que esses caras merecem. Explico porque o assunto está me cutucando com vara curta. É que a Associação dos Magistrados Brasileiros acaba de organizar um comitê, objetivando desencadear uma cruzada simplificadora da linguagem usada no cotidiano por juízes, promotores e advogados. Nada contra. A linguagem rebuscada e o latinório que alguns profissionais da área do direito usam no trato com pessoas simples resulta da mais antipática ostentação erudita, com a finalidade de humilhar nossos semelhantes iletrados. Mas eu gostaria de ver em ação grupos que se dispusessem a defender o idioma nacional da sanha dos seus agressores. E que esses grupos não ficassem confinados aos salões das academias e universidades. Que saíssem às ruas, com relhos e palmatórias, para castigar severamente a enxurrada de inimigos declarados do idioma nacional que, na fala cotidiana ou na escrita, praticam horrores pérfidos, com o objetivo consciente ou inconsciente de fazer com que o finado Camões se revolva na tumba. Só não me candidato para integrar ao menos um desses grupos porque minhas mãos não têm experiência no uso do relho e da palmatória.

Exclusivo: a verdade sobre o Plano Diretor 6i3z2k

Guilherme Kolling
O Plano Diretor de Porto Alegre completou cinco anos em 27 de março. Quem poderia comemorar preferiu ficar quieto, porque o clima não está para festa.
“O princípio que orientou o Plano foi deturpado”, diz o arquiteto argentino Rubén Pesci, que foi consultor especial da equipe que formulou o Plano Diretor, que ou a ser a constituição da cidade a partir do ano 2000.
O Plano que era avançado e previa um desenvolvimento harmônico da cidade não saiu do papel. Apenas a parte que se referia à construção foi posta em prática.
A principal consequência dessa distorção os porto-alegrenses já “sentem na pele”: a proliferação de novos edifícios em bairros consolidados como Moinhos de Vento, Petrópolis, Bela Vista, Rio Branco e Menino Deus.
Há dois anos os moradores se deram conta da acelerada substituição de casas por espigões e reagiram. A mobilização começou no Moinhos de Vento, onde os antigos casarões que dão identidade ao bairro começaram a ser derrubados. Hoje, sob a sigla “Porto Alegre Vive”, o movimento envolve quase vinte associações comunitárias que querem corrigir o que consideram “distorções do Plano”.
O alvo principal da campanha dos moradores é a questão das alturas. Eles querem retroagir, diminuir o tamanho, baixar os índices construtivos (o que é previsto no Plano) e colocar em prática a proteção do patrimônio histórico e do ambiente natural.
Os empresários, por outro lado, trabalham para manter a conquista que obtiveram depois de oito anos (1993-2000) de trabalho. O que a discussão de hoje evidencia é a forma como foi feito o Plano Diretor de Porto Alegre. Não houve equilíbrio de forças. A população não foi informada e, portanto, não estava lá.
Por outro lado, o setor da construção civil esteve presente. “O Sinduscon participou de todas as reuniões ao longo desses anos. Até nos locais mais longínquos eles estavam. E para fazer o seu papel: construir mais e mais alto”, revela Newton Burmeister, secretário do Planejamento que conduziu a avaliação da Plano de 1979 e a criação da nova lei.
Além de Burmeister, o JÁ ouviu outro protagonista da elaboração do Plano Diretor: Rubén Pesci, o arquiteto argentino que deu consultoria à Prefeitura da Capital. Eles se pronunciaram depois de cinco anos de silêncio. A seguir, duas entrevistas exclusivas, que revelam como foi feito o Plano Diretor e por que não está saindo como planejado.
As sete estratégias para a cidade
O Plano Diretor de Desenvolviemento Urbano Ambiental é composto por sete estratégias, que têm os seguintes objetivos:

Estruturação Urbana
Promover a estruturação do espaço na cidade e a integração metropolitana;

Mobilidade Urbana
Qualificar a circulação e o transporte urbano, proporcionando os deslocamentos na cidade e atendendo às distintas necessidades da população;
Uso do Solo Privado
Disciplinar e ordenar a ocupação do solo privado, através dos instrumentos de regulação que definem a distribuição espacial das atividades, a densificação e a configuração da paisagem urbana no que se refere à edificação e ao parcelamento do solo;

Qualificação Ambiental
Qualificar o território municipal, através da valorização do Patrimônio Ambiental, promovendo suas potencialidades e garantindo sua perpetuação e a superação dos conflitos referentes à poluição e degradação do meio ambiente, saneamento e desperdício energético;
Promoção Econômica
Estabelecer políticas que busquem a dinamização da economia da cidade, a melhoria da qualidade de vida e a qualificação da cidadania, através de ações diretas com a comunidade e com os setores produtivos, assim como a articulação com outras esferas de poder;
Produção da Cidade
Capacitar o Município para a promoção do seu desenvolvimento através de um conjunto de ações políticas e instrumentos de gerenciamento do solo urbano que envolvem a diversidade dos agentes produtores da cidade e incorporam as oportunidades empresariais aos interesses do desenvolvimento urbano como um todo.
Sistema de Planejamento
Garantir um planejamento dinâmico e contínuo, que articule as políticas da istração municipal com os diversos interesses da sociedade, promovendo instrumentos para o monitoramento do desenvolvimento urbano.
O que mudou nas alturas dos prédios
As mudanças nas alturas máximas das edificações ocorreram em dois momentos distintos. Em 1987, o prefeito Alceu Collares promoveu alterações nas áreas próximas a grandes avenidas. O atual Plano, por sua vez, aumentou o limite da estatura das edificações no interior dos bairros, em 1999, quando a igualou a das áreas de entorno das grandes avenidas.

“O Plano mudou na Câmara”

Desde que se afastou da Secretaria do Planejamento, ao final da gestão de Raul Pont, o arquiteto e urbanista Newton Burmeister, 67, não se pronunciou mais sobre Plano Diretor.
Ele não participou, por exemplo, de nenhuma das reuniões de avaliação da lei, que ocorreram a partir de 2003 e que seguem até hoje. Relutou para falar no assunto.
“Mas eu nem estou mais envolvido com isso, porque vocês querem me ouvir?”, questionou, ao ser sondado pelo JÁ. Depois de certa insistência, aceitou romper o silêncio, que já durava cinco anos.
“Não estou participando porque quero um distanciamento para poder dar uma contribuição melhor. Se entrasse no debate agora, iria defender o meu trabalho”, justificou.
Ele itiu que continua acompanhando o assunto – reuniu em uma peça de sua casa centenas de anotações e documentos –, pretende escrever sobre o tema.
Autoridade para isso ele tem. Burmeister foi secretário de Obras na gestão de Olívio Dutra (1989-1992) e do Planejamento, com Tarso Genro (1993-1996) e Pont (1997-2000), o que significa dizer que acompanhou todo o processo de elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA).
Ele recebeu o JÁ, em 28 de março, na sua residência, na Três Figueiras, para uma conversa de pouco mais de uma hora. Ao final, confessou: “Fazia tempo que eu não falava desses assuntos”.
Como começou a discussão do novo Plano Diretor?
Era a reavaliação do Plano Diretor de 1979, que depois ou a ser a proposta de um novo Plano. Eu istrei essa discussão, que começou na gestão do Tarso (Genro). O grande ime foi estabelecer uma metodologia. Tivemos contatos com diversos grupos locais, faculdades de arquitetura. Depois com a FLACAN (Fórum Latino-Americano de Ciências Ambientais), através do (arquiteto argentino Rubén) Pesci e seu grupo. Isso ocorreu pela quantidade de profissionais da própria Secretaria do Planejamento que tinham feito cursos de metodologia, de pós-graduação lá na Argentina. O grupo do Rubén Pesci tinha experiência em método para avaliação, discussão e proposição de Planos Diretores. Eles têm nome internacional, por trabalhos na Argentina, América Latina, Espanha e Itália.
O resultado foi um Plano elogiado no papel. Mas se diz que só a parte construtiva foi posta em prática.
É uma característica geral da aplicação de Planos Diretores. Eles devem trazer uma visão propositiva para uma estratégia de desenvolvimento da cidade. Todavia, a nossa estrutura do poder público sempre deu muito mais ênfase para a questão da ocupação do lote urbano. O novo Plano Diretor tentou assegurar que além de as secretarias desenvolverem seus aspectos cotidianos, de manutenção, conservação, elas tivessem representação dentro do Conselho do Plano Diretor, para acompanhar, corrigir, reavaliar as questões que envolvem o desenvolvimento estratégico da cidade. Mas essas estruturas tecno-burocráticas têm uma cultura muito forte de só cuidar de como se edifica na cidade: taxa de ocupação do terreno, afastamento, altura, etc. Elas desdobram pouca coisa além disso. Nas secretarias de Obras e de Planejamento existe uma grande quantidade de técnicos muito bons, capacitados, aptos, mas que ficaram dentro das camisas-de-força do “construir”. É a cultura de cuidar só de como se constrói na cidade, que não é a coisa mais importante. Perde-se muita massa crítica fazendo coisas menores, quando poderia se usar ela na questão do pensamento estratégico da cidade.
E a participação da população no Plano?
Houve muita falta de informação. Hoje, lendo o noticiário, vejo manifestações até de pessoas que estão no atual governo e que nunca apareceram nas centenas de debates sobre o Plano Diretor. Nunca! E, de repente, aparece o cara e acha que o negócio está mal. Algumas estruturas estão sendo acionadas hoje, na continuidade da discussão do desenvolvimento urbano: as 16 regiões do Orçamento Participativo e as 8 dos Fóruns de Planejamento. Isso criou uma base que está sendo utilizada, não existia antes. Então, há os que criticam essas situações mas que utilizam as estruturas que o novo Plano propôs. Agora, um Plano Diretor não é impositivo, mas sim um plano de diretrizes, de ação permanente, de avaliação periódica. E se as pessoas acham que as coisas que foram propostas não são boas, é preciso ver isso sob a ótica do que a sociedade está dizendo, os moradores, as estruturas organizadas, etc. Tem que dizer não está bom.

Mas o Plano não a a ser impositivo, na medida em que dezenas de associações, organizadas, representativas, dizem, desde 2003, que não estão de acordo, por exemplo, com a verticalização e densificação da área central, e não conseguem mudar isso?
O Plano define alguns parâmetros, a partir de informações, características da cidade, pela qual ela foi construída, dividida, e joga isso para dentro do espacial. São situações baseadas na experiência dessa própria cultura interna do Município, na experiência de pessoas bastante vivenciadas. Claro que nessas coisas tem disputas. O Sinduscon esteve permanentemente dentro de todos os grupos de trabalho, de todas as comissões, nunca se omitiu das reuniões, nem das que eram lá nos confins da cidade. Estiveram lá e tinham sua estratégia, seus objetivos, legítimos. Qual é a posição do Sinduscon? Eu quero construir mais, mais alto, etc. O que alguns setores faziam? Não, não pode ser tanto assim, tem que manter situações, etc. Mas acontece é que o Plano Diretor é montado, depois é feito um projeto de lei que é mandado para a Câmara. E a Câmara tem outra sensibilidade.
O Plano mudou na Câmara?
Mudou na Câmara.
O quê?
Mudou a altura, afastamentos. E veja: continua na discussão do “construir”. As visões estratégicas da cidade sequer transitaram lá, não teve discussão. Agora, quando chegou na questão da altura, da taxa de ocupação, do índice de aproveitamento… A Câmara tem outras sensibilidades, outros canais de comunicações, que não são os que a estrutura que concebeu o Plano tinha. Ali as partes interessadas falam direto com os vereadores. E havia ainda, felizmente, a equipe técnica da Câmara, mas que não estava lá com a visão dos grupos que estavam discutindo fora. As informações foram gestionadas no âmbito da Câmara. E o processo legal, democrático, é esse. É feito um projeto de lei, que se acredita, é o melhor que o Executivo pode propor para a cidade, ouvindo os grupos envolvidos. Agora, quando entra para a Câmara, entra para a Câmara. E essas situações foram muito fortemente contestadas, especialmente a questão de alturas. Na proposta original, eram praticamente mantidos os mesmos padrões de alturas existentes no Plano Diretor. Houve uma pequena mudança de taxa de ocupação e de afastamento – ou de 1/20 para uma outra fraçãozinha que aumentava mais 50cm, algo assim… As partes interessadas nesse processo disputavam o centavo.

E antes da Câmara, a população estava alheia ou houve embate?
Essa situação apareceu na Três Figueiras, por causa do Projeto Hermes, que foi aprovado na legislação anterior. Houve algumas mobilizações, até com contrariedades pessoais ao projeto, alegando que aquelas edificações no terreno no Projeto Hermes iriam comprometer o bairro Três Figueiras como um todo.

Foi um caso isolado? Houve outras queixas sobre alturas?
Isso não apareceu nos debates feitos nas diversas regiões. Essa situação que tem a ver com a altura das edificações, e nada mais, não apareceu. Apareceu em algumas disputas. O Sinduscon reivindicou mais altura, trazendo técnicos e provando argumentos sobre esse aspecto. E os dois pólos se conformaram com o acordo que foi feito.
Mas as lideranças comunitárias só se deram conta quando sentiram na pele o efeito. O Moinhos Vive, por exemplo, só surgiu no final de 2002.
Mas aí é outra coisa, trata-se de manter a identidade do bairro. O que é o Moinhos de Vento? É um bairro que foi estruturado nos anos 1940, 50, 60, com casas unifamiliares de muito bom nível, como havia também na Carlos Gomes. Residências que desfrutavam das melhores condições de localização na cidade. É o caso do Petrópolis, Rio Branco, Bela Vista, todos com essas características. O que aconteceu? As famílias que se estabeleceram nos anos 50, 60, faziam casas com 4 quartos. Aí a família cresce, um se casa, outro se casa… e a residência fica de herança. Ela deixa de ser a casa unifamiliar e a ser uma herança, cujo regime urbanístico anterior previa a possibilidade de se construir um edifício. Chega um cara e propõe: “Eu compro essa casa, construo um edifício e te dou apartamentos”. Essa situação não apareceu agora, ela vem da cultura do desenvolvimento da cidade.
Mas esse exemplo foi a regra?
A cidade disponibiliza infra-estrutura, que é cara. Então, tem-se que jogar com o potencial de densidade que ela assimila. Numa quadra que permitia fazer 50, 60 unidades, ou a existir um potencial de aproveitamento da infra-estrutura existente, do sistema viário, da iluminação, energia, água, esgoto, que possibilitava uma densificação maior.
Isso já era possível, não foi mudado pelo Plano Diretor?
Já era, sim. O que aconteceu nesses períodos, na sucessão dos diversos planos existentes, e nas suas readequações, foi o aproveitamento das infra-estruturas que possibilitavam aumentar as densidades, o que significa construir em altura. Isso foi apresentado por um professor da UFRGS nos debates do Plano, fazendo com que as pessoas entendessem o porquê da densificação. Agora, não dá para congelar um bairro pura e simplesmente para manter a sua paisagem, porque é uma deseconomia para a cidade. E Porto Alegre teve aumentos consideráveis de população a partir dos anos 60. Nós dobramos a população de 1960 para 2005. Isso significa que temos que organizar o espaço urbano para que ele assimile esse crescimento da população.
O conflito entre essa idéia de aproveitar a infra-estrutura e o desejo de manter as características do bairro não seria atenuado se as outras estratégias fossem implementadas, como a qualificação ambiental, a proteção do patrimônio histórico… Mas todas essas questões foram abordadas no conjunto.
Mas não saíram do papel.
São diretrizes para o desenvolvimento urbano.
Não implantadas. A Zona Sul, por exemplo, está sendo preservada?
A Zona Sul tem uma característica extremamente peculiar. Tanto que surgiu nesse novo Plano o chamado espaço Rururbano, que é uma característica de desenvolvimento sustentado que se busca para esse região, identificando nele a questão de paisagem. Isso está muito bem explicitado no Atlas Ambiental de Porto Alegre, foi muito bem caracterizado.
Bem caracterizado no mapa. Mas está protegido por lei?
O mapa é uma espacialização de intenções. Agora para isso acontecer, providências devem ser tomadas pelo Poder Executivo, pelas associações comunitárias. Porque a gestão desse Plano não é exclusiva do Executivo, é uma gestão dos Fóruns das Regiões de Planejamento, que tem essa capilaridade, permite que o morador informe que há ocupação em áreas de valor ambiental, situações como esses novos tipos de condomínios que vem sendo construídos…

Há queixa que esses condomínios estão mudando a chamada Cidade Jardim.
São situações sobre as quais se tem determinado controle, mas não controle absoluto. Define-se a densidade, o tamanho de área… Eu me criei na Vila Assunção. Quando me mudei eu dizia: “meu Deus!, mas isso é lá no fim do mundo”. O bairro onde eu moro hoje, o Três Figueiras, em 1960 era um lugar em que se vinha fazer piquenique, era a Chácara do seu Müller. Então a cidade tem essa característica dinâmica. Temos que entender isso. Não se pode avaliar a cidade de 2002 para 2003, ela tem que ser medida em décadas.
E nessa meia década de Plano. Já dá para sentir algum efeito?
Ele aparece preliminarmente nas edificações. Primeiro porque o plano estratégico da descentralização é mais demorado. O Plano anterior tinha duas décadas de implementação e subsidiou essa nova proposta com aquilo que ele previa, tanto o que ocorreu como o que ele previa e não ocorreu. Aí dá para fazer uma avaliação crítica, sólida. Agora, quando se aprova um Plano em 2000, e em 2003 se diz que ele não está bom, analisando só a questão da edificação, é um equivoco. É um desenfoque do caráter estratégico que tem um Plano Diretor.
Mas se analisa só a construção porque o resto não saiu do papel.
Bom, mas isso são ações estratégicas que devem ser implementadas, o que requer ações de implantação e consolidação paulatinas. Tem que haver insistência em manter aquela diretriz, porque caso o contrário, o Plano corre o risco de se esvair. As pessoas esquecem, fica a letra morta da lei. Os corredores de centralidade tem que ser insistentemente buscados.

E o plano viário do cidade?
As diretrizes são boas, mas tem que existir uma ação articulada das secretarias. Não pode só a Secretaria do Planejamento ser a responsável por isso. Ela tem que se articular com Smam, EPTC, Smic. E também os serviços de infra-estrutura, Smov, DEP, Dmae, eles devem estar presentes porque têm as medidas do que existe e das necessidades. A questão do sistema viário é importante, também porque é um fator indutor de novas centralidades. Por exemplo, o corredor Anita-Nilo alcança as bordas da cidade, para o lado do Parque Chico Mendes.
Mas isso é para muitos anos…
Tem que começar assim. Porque se essa perspectiva for analisada a curto prazo, não se realiza. Tem que ser ações estratégicas, porque senão am a ser ações momentosas, de uma ansiedade precipitada. O planejador tem que relativizar o tempo. Existem coisas que acontecem em longo prazo. A Terceira Perimetral, por exemplo, foi concebida em 1959 e consolidada em 1963. E se realizou 40 anos depois. Esse percurso de 12km, seria impossível se não fossem tomadas providências de afastamento, deixar disponíveis terrenos para fazer a via. Seria impossível pelos valores de desapropriação, que a cidade não seria capaz de pagar. São situações que podem vir a ocorrer daqui 30, 40 anos. São gerações que precisam ser articuladas, mobilizadas, convencidas, e que devem estar informadas. Essa ação que vocês (Jornal JÁ) estão fazendo agora, de informar, publicar, antecipar o debate, fazer as pessoas pensarem no assunto, é de grande valia, é extremamente útil para a cidade, porque só através desses meios as pessoas podem se mobilizar, se interessar e participar dessas estruturas de planejamento.
Rubén Pesci: “O princípio do projeto foi deturpado”

A experiência internacional do arquiteto argentino Rubén Pesci, 62, chamou a atenção da Prefeitura de Porto Alegre, que o convidou para dar consultoria aos técnicos que fariam o novo Plano Diretor da cidade. Foram seis meses de trabalho, de março a outubro de 1996. Vários profissionais da Secretaria de Planejamento tinham feito cursos de pós-graduação na FLACAM (Fórum Latino-americano de Ciências Ambientais), dirigido por Pesci.

Autor de Planos Diretores e de Gestão Ambiental de várias cidades do mundo, o trabalho do argentino tem uma preocupação com a área ambiental – ele criou em 1974 a Fundação CEPA (Centro de Estudos e Projetos Ambientais).
Pesci está apavorado com a destruição do ambiente em Porto Alegre, especialmente na Zona Sul. Ele diagnostica: “O Plano só foi implantado na parte que trata das edificações. E teve alterações na Câmara, que o tornaram mais conservador, com índices de aproveitamento máximos”.
Mas para o arquiteto, o principal problema foi a falta de informação, tanto dentro do governo quanto na população. A idéia de adequar o Plano ao interesse da comunidade foi esquecida.
Rubén Pesci esteve em Porto Alegre em janeiro, para participar do Fórum Social Mundial. Foi quando deu essa entrevista exclusiva para o Jornal JÁ.

Que tipo de assessoria vocês prestaram ao Plano Diretor de Porto Alegre?
Foi um trabalho feito pela Fundação CEPA da Argentina, solicitado pela Prefeitura de Porto Alegre, porque já conhecíamos muitos dos funcionários e o Secretário de Planejamento da época. Já havia todo um relacionamento. Então fomos chamados para fazer a Coordenação Metodológica e o Enfoque Conceitual.
E quanto tempo durou este trabalho?
Seis meses, de março à outubro de 1996. Depois nos chamaram novamente para capacitar o pessoal técnico e desenvolver alguns projetos integrados.
E o que aconteceu entre a concepção e a prática?
A Câmara de Vereadores fez algumas modificações que no princípio não nos pareceram muito preocupantes, o problema foi que só discutiam um aspecto do Plano, a questão das edificações, deixando de lado os outros seis: os corredores de centralidade, os espaços abertos (para lazer e convívio social), a questão ambiental, o saneamento, a modificação do sistema de transporte e trânsito, o desenvolvimento econômico e social (moradias). Quando o Plano finalmente foi aprovado em 2000, imaginei que tudo fosse possível e que as modificações na estratégia de aproveitamento do solo não fossem tão graves. O problema começou depois.
O que aconteceu?
Aí começamos a ter solicitações da população, chegamos a fazer um ciclo de conferências de dois dias na Sociedade de Engenharia com a participação de arquitetos, do Sinduscon, vereadores e moradores. Então começamos a ver que as estratégias de Desenvolvimento Sustentável não estavam sendo aplicadas, pequenas coisas como alargamento de vias e altura de prédios, não vinham sendo respeitadas, o que causava enormes brigas.
E que tipo de interesse travou isso?
Quanto a isso tenho que ser muito prudente, porque na verdade, não sei. O que acho à princípio, é que não foi bem divulgada a essência do Plano, coisa que advertimos desde o início. O principal problema foi a falta de informação sobre o Plano tanto dentro do governo quanto para a comunidade.

Foi na Câmara de Vereadores que ele sofreu modificações?
Eu não segui o processo na Câmara. Sei que uma quantidade enorme de assessores foram consultados, não sei se houve algum interesse político-partidário. Sei que aquilo que era um Plano moderno e desenvolvido para qualquer lugar do mundo, acabou sendo um Plano conservador. Os índices de aproveitamento eram máximos, mas a comunidade podia reunir-se e baixar estes índices, porém o Governo não divulgou isso. O Plano era maleável e poderia adequar-se ao interesse da comunidade, mas isso foi esquecido.
E o Plano que saiu da Câmara estava muito diferente?
Sim. Me parece que só na Estratégia 5, porque as outras não haviam sido discutidas e, ingenuamente, achei que não fosse por falta de interesse e sim porque estava tudo certo.

O Executivo também teve responsabilidade pela não aplicação do Plano Diretor?
Sim. Na compreensão, divulgação e mudança de interesses. Aquele Executivo do início, o secretário (Newton) Burmeister e o prefeito Tarso Genro compreendiam perfeitamente. Depois quando o governo foi mudando, mudou também o entendimento sobre o assunto. Cada setor da sociedade tem interesses específicos na sua área e só quer debater sobre esse assunto. O setor de moradia só se interessava em falar sobre a política de habitação social, o setor de construção só sobre o aproveitamento do solo, etc.

No Plano está prevista uma revisão, ainda se pode recuperar a concepção inicial?
Não posso falar como um expert em Porto Alegre, mas me parece que poderia perfeitamente ser feita uma retomada daquele Plano.

No Moinhos de Vento se criou um movimento de moradores para preservar a identidade do bairro…
O plano continha essa idéia de fazer uma consulta aos moradores para que limitassem a altura das futuras construções, mas os moradores não foram informados. O problema central foi uma total falta de comunicação. A população não ficou sabendo.
Outro caso preocupante parecer ser a Zona Sul da cidade…
Ali o crescimento tinha que ser muito bem regulado por isso que os corredores centrais fluíram para a Zona Oeste e não para a Zona Sul. Na Zona Sul deveríamos preservar grandes áreas ambientais que seriam uma reserva de natureza, mas isso não está ocorrendo…
O que está ocorrendo?
Eu andei por lá agora, me assustei. É muito grave. Se nada for feito, em cinco anos a Zona Sul estará numa situação muito ruim, estará ambientalmente destruída, com enormes problemas de circulação, etc.
O que está sendo feito nesta região?
Bom, havia um projeto de desenvolvimento para esta região, com construções de condomínios e transporte, mas dentro de certos limites de grande respeito ambiental e produtivo, tinha que manter as qualidades turísticas e de produção ruralS, como a de pêssegos e pesca. Todos os morros e a orla tinham que ser imediatamente protegidos, evitando invasores e loteamentos clandestinos que crescem muito a cada dia. A proliferação de condomínios de luxo também é problema sério… O problema essencial é a desinformação que tira o direito que o Plano dá e leva a brigas imensas em que só ganham os que têm os interesses mais perigosos.
Você disse que ou de um Plano propositivo para um Plano impositivo?
Perfeitamente. O Plano dava grandes incentivos a investidores que fariam crescer a cidade. Existem muitos corredores. O ideal seria fazer projetos integrados com os moradores vizinhos, investidores e Prefeitura, mas…

“Em 5 anos a Zona Sul será destruída”

Marília e Luiz Antônio Azevedo não são especialistas em planejamento urbano, mas têm o mesmo prognóstico que o experiente arquiteto argentino Rubén Pesci para o efeito da primeira década do novo Plano Diretor: “Se continuar assim, em cinco anos vão destruir a Zona Sul”.
Casados há 46 anos, eles decidiram se mudar de um apartamento do Bom Fim para a região mais arborizada e menos povoada da cidade, no início da década de 70.
“Queríamos sossego e espaço para nossos filhos brincarem. O contato com o verde é importante”, justificam. E assim cresceram as quatro crianças. A família se instalou no Jardim Isabel, bairro entre Ipanema e o Morro do Osso. É um loteamento com apenas 24 ruas, 700 casas e 3 mil moradores.
A comunidade é unida, organizada, com direito a entidade representativa: a Associação Comunitária do Jardim Isabel (Ascomjip). O engenheiro agrônomo Luiz Antônio, 69, e a advogada Marília – casal recém mencionado – se tornaram lideranças depois que se aposentaram.
“Desde então, me dedico 24 horas por dia à Associação”, garante Luiz Antônio, que já foi presidente da Ascomjip duas vezes. Ele se orgulha de ter inaugurado a sede da Associação, em 1996. É sempre solicitado quando há um problema na vizinhança, seja o entupimento de uma boca-de-lobo, seja para acionar a polícia em caso de roubo.
Apesar de todo esse engajamento no bairro, o casal não esteve presente em nenhum debate da discussão do Plano Diretor, na década de 90. Deram-se conta do que foi aprovado só quando sentiram o efeito: 39 novos condomínios em cinco anos. Cerca de 2 mil novos moradores, ou seja, a população quase duplicou.
O problema é que os novos imóveis têm uma característica diferente dos originais: ao invés de pátios arborizados, aproveitam todo o terreno com área construída – pudera, onde antes havia uma casa, colocam quatro ou cinco sobradinhos, todos geminados.
A perda de área verde já causou pelo menos um efeito: alagamentos nas ruas mais baixas, fato inédito, até então. Luiz Antônio e Marília se mobilizaram. aram a representar a comunidade na avaliação do Plano Diretor. Desde 2003, marcam presença nos debates da Prefeitura e da Câmara.
Marília é mais discreta. Mas seu marido faz questão de exibir cartazes imensos, que sempre carrega com ele. São fotos dos novos condomínios e dos alagamentos que eles trouxeram. “Essas imagens mostram a barbaridade que está acontecendo na Zona Sul”, costuma dizer, sempre em manifestações fortes.
A esposa concorda. “No papel, o Plano Diretor diz que a Cidade Jardim (Ipanema, Tristeza, Assunção e arredores) deve ter baixa densidade, com predominância de casas circundadas por áreas verdes. Mas não é isso que está acontecendo”, protesta, enquanto lê o artigo da lei, grifado por ela com caneta hidrocor.
Polêmica é a ocupação
A discussão que pipoca na cidade é a mesma: densificação. Mas se na região central a grita é pelo tamanho dos prédios, na Zona Sul a questão é o tamanho dos terrenos. Moradores defendem uma área de 250m2 a 300 m2 por casa. Mas a prática tem sido quatro ou cinco residências nesse tamanho de gleba.
A mudança veio com o novo Plano Diretor, que ite uma economia (casa) a cada 75m2. Por outro lado, a mesma lei chama a região de Cidade Jardim, uma área especial de interesse do ambiente natural. E com isso, a ocupação voltaria a ser 300m2 por residência, garantindo amplas áreas de arborização, dentro dos imóveis.
No meio deste vazio jurídico – ou melhor –, como as áreas especiais do ambiente natural não foram regulamentadas, está se adotando a construção de quatro casas por lote. “O que eles querem é área. Mas isso vai contra a vocação desses bairros e destrói a arborização interna”, avalia Nestor Nadruz, arquiteto e coordenador do Movimento Porto Alegre Vive.
O ambientalista Guilherme Dornelles, da Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural) diz que a especulação imobiliária está igualando a Zona Sul à Zona Norte. “Ipanema está sofrendo a maior agressão. Em dois meses, derrubam a casa, as árvores, colocam um tapume e impermeabilizam todo o terreno”, descreve o ecologista.
Outro problema da Zona Sul destacado por Dornelles são os loteamentos clandestinos. “São pessoas de baixa renda que se instalam em áreas de preservação e degradam o ambiente. Depois, o dono pede reintegração de posse e pode construir no terreno”.
O ambientalista trabalha ainda pela preservação da orla, especialmente no trecho entre o Lami e a Ponta Grossa, que ainda não está construído. “Já tem projetos para esta faixa, mas ela é de preservação do ambiente natural e é área especial de interesse cultural”, ressalta Dornelles.
O caso Loteamento Ipanema
Além de condomínios horizontais, existe preocupação com os projetos especiais na Zona Sul. Um deles é o Loteamento Ipanema, da Maiojama, que prevê vários blocos de 10 pavimentos.
O projeto é antigo e foi travado na Justiça. A questão é a preservação da Mata Atlântica, existente no local, e a canalização do Arroio Espírito Santo. O Poder Judiciário deu parecer favorável ao empreendimento, em decisão apresentada em novembro de 2004, mas a promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Ana Maria Marchesan, vai recorrer, levando o caso até Brasília.
Moradores se queixam, ainda, da descaracterização que o empreendimento causaria na região. “É um local residencial, antigo, com tradição de casas de veraneio e querem colocar um monte de espigões”, explica o ambientalista Guilherme Dornelles, morador da Zona Sul.
“Projetos especiais como esse alteram bairros centenários, degradando a zona costeira”, diz Marçal Davi, da Tristeza. Ele cita outro empreendimento, na rua Mário Totta, que também é formado por prédios altos, ao invés de casas.
Procurada diversas vezes pelo JÁ, a Maiojama não concedeu entrevista, conforme havia prometido o departamento de marketing da empresa construtora.
“Quem se muda para cá quer contato com verde”
O advogado Astélio Santos é outro que está insatisfeito com as mudanças na Zona Sul. Ex-representante da comunidade no Fórum da Região de Planejamento, é uma das lideranças da Associação dos Moradores do Balneário Ipanema, a Ambi.
Foi para a Zona Sul em 1983, em busca de sossego. “Isso aqui era uma maravilha”. Antes, morou na avenida Venâncio Aires, na década de 70. Achou que o local estava ficando movimentado demais. Foi para o Menino Deus, onde viveu alguns anos, até perder o sol, quando construíram um prédio ao lado.
“Quem vem para cá (Ipanema) quer o verde. Isso é qualidade de vida. E estão acabando com a arborização, que está nas casas”, protesta. “Esse Plano Diretor foi feito para fomentar a construção civil! Não foi feito para o morador!”, diz, em tom exaltado.
Ele acredita que os moradores que participaram da discussão não tinham cultura urbanística para entender a pressão dos construtores. “Não houve contraponto. E a Prefeitura aceitou, para ganhar dinheiro com impostos sobre os imóveis”, acredita.
Entre as queixas, o pouco recuo dos novos condomínios. Exemplo, em sua região, é o que não falta. Quem chega na Zona Sul logo percebe que a região parece um canteiro de obras. Nas ruas internas, entre as principais avenidas, são dezenas, centenas de pequenos condomínios horizontais.
As preocupações, além do esgoto in natura, que vai para o Guaíba, e dos crescentes alagamentos, é com o adensamento e a falta de infra-estrutura: mesmo as vias principais são estreitas para a quantidade cada vez maior de automóveis.
“Não temos uma malha viária para ar mais veículos. E falta infra-estrutura: escolas, postos de saúde, saneamento. Isso aqui vai virar outra Goethe”, prevê o advogado Marçal Davi, uma das lideranças do bairro Tristeza.

Falta Imprensa na Democracia brasileira 342w5n

Tenho dito aqui: o processo de democratização do país está a exigir uma imprensa menos “paulo coelho”, com todo respeito ao Paulo Coelho. A cobertura que a mídia faz não está à altura das necessidades do processo de democratização, pela mesmice, pela superficialidade. Vejo que essa carência se torna cada vez mais evidente. Vejam o que diz Ricardo Noblat, editor e diretor de redação de importantes veículos da mídia brasileira, como Veja, O Globo, Jornal do Brasil e Correio Braziliense:
“A mídia está em crise – e as redações cada vez mais enxutas. Não se dão mais o luxo de ouvir um leque numeroso e variado de fontes. Porque a mídia sempre gostou, e agora mais ainda, de receber pratos feitos. Se lhe dão bons releases ou relatórios abrangentes, ela se vale do que se encontra ali”.
“As razões são as mesmas. Nos últimos três anos, mais de mil vagas de jornalistas foram cortadas nos jornais, revistas, emissoras de rádio e de televisão. As redações perderam – e continuam perdendo – seus quadros mais experientes. Elas se tornam bastante jovens – e, por tabela, inexperientes. De resto estão cada vez mais sobrecarregadas. Não têm muito tempo pra nada. De preferência, apuram a maioria das notícias por telefone. E tentam enriquecê-las pesquisando dados pela internet”.
Noblat menciona o caso dos Conselhos Tutelares: “Existem municípios em que o Conselho de Direitos da Criança, por exemplo, não é representativo da sociedade. Metade das cadeiras é ocupada por integrantes do governo, como manda o Estatuto. Entretanto na outra metade dos assentos, que deveria ser da sociedade civil, sentam-se vereadores”.
“A abordagem desta distorção pela imprensa seria fundamental para que esses conselhos resgatassem o caráter democrático – e para manter o daqueles que não apresentam distorções. Além disso, renderia uma denúncia política interessante para o veículo. Mas, é claro, isso também não tem visibilidade na imprensa. Em grande parte porque os jornalistas não conhecem nem o papel nem o funcionamento desses conselhos”.
“É um problema de formação – ou da falta dela. De crise da mídia. De escassez de repórteres. E de insensibilidade dos seus chefes. A solução do problema a por uma catequese permanente dos jornalistas sobre a importância dos conselhos, mas a principalmente pela reinvenção do conteúdo das diversas mídias. Tal inversão é mais urgente no caso dos jornais. Eles estão cada vez mais distantes do seu público. E se limitam a oferecer o que o leitor já sabe. É urgente privatizar o noticiário da mídia em geral – e dos jornais em particular. A mídia devia olhar mais para a sociedade e menos para os governos. Lugar de repórter é na rua – não nos ambientes acarpetados e refrigerados do poder. Creio nisso, mas não acho que ocorrerá a curto prazo”.
* * *
Sempre que ouço esse discurso em defesa da liberdade de imprensa, lembro da frase do general Geisel, reproduzida no livro do Elio Gaspari: “Recebi todos donos dos órgãos de comunicação. Nenhum me pediu o fim da censura”.

Osvaldo esquina Ramiro: seis assaltos em um mês 5z1c6s

Eduardo Lorea
Os cartazes colados na fachada da Ótica Bom Fim na segunda feira 4 de abril anunciavam mais uma vítima da violência, que, em 22 anos de funcionamento, nunca havia sido assaltada. Mas, no início do mês, o estabelecimento entrou na onda que atinge o comércio da região. Entre 9h e 10h da manhã, a loja sofreu uma “limpa”.
Ela não foi a única. As duas farmácias contíguas à loja – localizada na esquina da avenida Osvaldo Aranha com a rua Ramiro Barcelos –, Drogabel e Pharmaplus, também receberam a visita de ladrões armados. A 50 os dali, do outro lado da avenida, a loja Paquetá foi vítima de dois assaltos. E, para completar, a loja O Boticário, também na Ramiro, teve mercadorias e dinheiro do caixa levados.
Na Ótica, os criminosos eram dois homens armados – “e muito bem vestidos”, afirma a gerente Mirian Baladão. Eles entraram, renderam quatro funcionários e dois clientes.
Levaram celulares, semijóias, óculos solares, armações, o pouco dinheiro dos caixas e até uma sacola com sabonetes. Mirian não contabilizou as perdas, mas lembra que entre os objetos roubados estavam mercadorias com preço de custo acima de R$ 500. Revoltada com o ocorrido, a gerente voltou suas críticas ao Palácio Piratini e ao Paço Municipal. “Onde está a segurança que o Rigotto e o Fogaça prometeram? Como cidadã, tenho direito de saber o que eles estão fazendo, até porque votei nos dois.
Para ela, os meses de dezembro e janeiro ados haviam sido “perfeitos” no que diz respeito à segurança. Na época, foi instalada uma torre com policial na esquina da Ramiro com Protásio Alves.
O pedestal foi desativado e agora está na Osvaldo Aranha esquina Fernandes Vieira, em frente ao Posto Policial. “Falta efetivo, e eles não conseguem contratar mais policiais porque os salários são baixíssimos”, acredita Mirian.
A Brigada Militar convocou uma reunião com os lojistas no dia 7 de abril.
Ocorrências se tornaram banais
A freqüência das ocorrências policiais torna os casos banais. Na loja Paquetá da Protásio Alves próxima a Ramiro Barcelos, os funcionários fazem as contas para ver quem bate o recorde de assaltos. Só em março foram dois, com intervalo de dez dias entre um e outro. O vendedor Jonas Flores é novo na loja, mas já tem histórias para contar: sofreu seis assaltos em quatro meses.
Mas a campeã é Fernanda de Moura Borges, que atingiu a marca de 15 assaltos em três anos, todos eles realizados por homens armados. “Não temos segurança nenhuma para trabalhar”, reclama.
Seu colega André Teixeira – dez ocorrências em um ano – vem observando a ação dos criminosos. Ele conta que estão mudando o “estilo”. “Antes, vinham de moto, com rosto coberto pelo capacete. Agora aparecem aqui de carro, bem arrumados”, afirma. Ainda assim, tranqüiliza os colegas: essa não é a loja mais visada. “Na Assis Brasil é muito pior”, conforma-se.
Segundo ele, sempre que os assaltos acontecem a loja contrata um segurança privado, como o que vigiava a porta no dia da visita do repórter. Mas a proteção é temporária: quando “baixa a poeira”, sai o segurança e voltam os assaltos. Os funcionários, assim como os outros comerciantes entrevistados, garantem que no período em que a torre da Brigada Militar esteve instalada, entre dezembro e janeiro, não houve ocorrências. “Adiantou muito, estava mais tranqüilo”, afirma Flores.
Policiais sem condições de trabalho Dois policiais militares encontrados nas redondezas dos estabelecimentos assaltados confirmam: falta efetivo e material de trabalho para que a Brigada proteja adequadamente a população. “São duas motos e uma viatura para cobrir mais de seis bairros”, disse um deles, deslocado para a área depois das últimas ocorrências.
O outro brigadiano, que trabalha há dez anos no Bom Fim, diz que um dos problemas é a falta de meios de comunicação. “Às vezes acontece alguma coisa aqui perto e a gente nem fica sabendo, porque não tem celular nem rádio para nos avisarem”. Mas os dois concordam que a maior carência é a de pessoal. “O efetivo está muito pequeno e o equipamento sucateado. Hoje viemos para cá por causa desses assaltos, mas até quando ninguém sabe. Enquanto estamos aqui, outros lugares que também tem comércio muito visado estão desprotegidos”, alertam.