Ministros militares vetaram a posse de Jango em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros. Mas o movimento da Legalidade frustrou o golpe. João Goulart ainda dormia quando o telefone tocou no quarto do Hotel Raffles, em Singapura, no amanhecer do dia 26 de agosto de 1961. Era um repórter da Associated Press, agência de notícias norte-americana. Ligava de Nova Iorque para ouví-lo sobre a renúncia do presidente Jânio Quadros, no dia anterior. Na condição de vice-presidente, Goulart presidia uma missão comercial que percorria o Extremo Oriente, em busca de negócios e investimentos para o Brasil. Estivera na República Popular da China, o maior país comunista do mundo e, na véspera, chegara a Singapura, “a esquina do mundo”. Jantara com parlamentares integrantes da missão num restaurante malaio, perto do hotel e se recolheu. Acordou com o telefone do repórter da AP. Disse que ia se informar para depois falar. Brinde com champanhe À hora do café, o senador Barros de Carvalho, pediu uma garrafa de champanhe para “brindar ao novo presidente do Brasil”. Jango atalhou: “Vamos brindar ao imprevisível”. Jango sabia que para assumir a presidência, como mandava a Constituição, teria que vencer “antigas e arraigadas resistências”. Os coronéis golpistas que o haviam derrubado do Ministério do Trabalho, em 1953, eram todos generais engajados no mesmo movimento que já levara Getúlio Vargas ao suicídio. Logo chegou a informação que de que os três ministros militares – Exército, Marinha e Aeronáutica – tinham divulgado uma nota conjunta dizendo que ele não poderia tomar posse. Em seguida chegou o telegrama com a íntegra da mensagem lida em sessão extraordinária do Congresso Nacional, pelo deputado Rainieri Mazzilli, presidente da Câmara: “Exmo. Sr. Presidente do Congresso Nacional Tenho a honra de comunicar a V.Exca. que na apreciação da atual situação política criada pela renúncia do Presidente Jânio Quadros, os Ministros Militares, na qualidade de Chefes das Forças Armadas, responsáveis pela ordem interna, me manifestaram a absoluta inconveniência, por motivos de segurança nacional, do regresso do vice-presidente João Goulart. Brasilia, 28 de agosto de 1961”. Acontecera o que era bem previsível. Desde que um manifesto de 300 coronéis o derrubara do Ministério do Trabalho, em 1953, Jango não era bem visto por certos setores militares. Aqueles coronéis, que estavam entre os que levaram Vargas ao suicídio em 1954, eram agora generais e não toleravam ver o “herdeiro de Vargas” no poder. Por algumas horas Jango ficou ao telefone tentando saber o que fazer. Até que chegou o chamado de Brizola. Estava analisando as possibilidades de resistir ao golpe. Combinaram que Jango se deslocaria para Montevidéu e aí aguardaria os acontecimentos. Aconteceu o que se sabe: com o apoio do comandante do III Exército (hoje Comando Militar do Sul) e da Brigada Militar, Brizola levantou o Rio Grande do Sul no movimento da Legalidade e garantiu a posse de Jango, ainda que com poderes limitados por uma emenda parlamentarista. Raul Riff, seu secretário de imprensa, registrou a frase de um entusiasmado parlamentar udenista: “Vamos fazer de Jango uma Rainha da Inglaterra. Sentará no trono mas não governará”. Um presidente sem forças querendo fazer reformas Jango tomou posse como presidente no dia 7 de setembro de 1961. Mas era um presidente sem força, pois o regime havia mudado para o parlamentarismo, onde quem governa é o primeiro-ministro e seu gabinete. Remendo para tirar os poderes de Goulart, o parlamentarismo foi uma sucessão de crises. Quatro primeiros-ministros foram nomeados em pouco mais de ano. Foi um período em que o país ficou praticamente paralisado pela crise política. Em janeiro de 1963, o Congresso aprovou a realização de um plebiscito, para o povo decidir se queria continuar no parlamentarismo ou preferia voltar ao presidencialismo. Sem aguentar mais aquela confusãoa, 80% dos eleitores votaram a favor do presidente. Jango se sentiu fortalecido e começou a trabalhar numa plataforma de reformas, que incluíam alguns temas explosivos, como o controle da remessa de lucros pelas empresas estrangeiras e a reforma agrária. Estes eram os principais pontos do programa de reformas: – controle dos investimentos estrangeiros e da remessa de seus lucros para o exterior -encampação das refinarias de petróleo pertencentes ao capital privado -monopólio da Petrobrás para importação de petróleo e seus derivados -novas normas para toda e qualquer concessão para exploração de riquezas minerais no país -desapropriação de latifúndios improdutivos -regras para o arrendamento, aforamento, parceria ou quaisquer outras formas de locação agrícola -incentivo à sindicalização rural -implantação da Eletrobrás -Lei de telecomunicações – Relações diplomáticas com a URSS e China -controle pelo Banco do Brasil dos preços das matérias primas importadas para a fabricação de medicamentos no país -reforma urbana -direito de voto ao analfabeto [related limit=”5″] 17427