GERALDO HASSE Os criadores de abelhas melíferas estão tentando criar normas para a convivência pacífica com os agricultores usuários de agrotóxicos, mas têm sido praticamente ignorados pelos empresários agrícolas e pelas autoridades, tanto que a Câmara Setorial de Abelhas, Produtos e Serviços da Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul não encaminhou ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) uma sugestão de regulamento discutida internamente em janeiro de 2018. A não normatização atende aos interesses da indústria química e seus parceiros — o comércio de máquinas e insumos rurais e a aviação agrícola, além dos próprios agricultores, que aceitam ivamente o receituário venenoso sem questionar os impactos negativos no meio ambiente. Aparentemente indiferentes, os ambientalistas não demonstram a capacidade de mobilização revelada em 2005, quando fizeram uma campanha contra a implantação de eucaliptais para abastecer três grandes projetos de fabricação de celulose. Em vez de 1 milhão de hectares, como se imaginou, a eucaliptocultura ocupa hoje 500 mil hectares no Rio Grande do Sul, e nem a metade disso serve como matéria-prima para fabricar celulose no único projeto que vingou em Guaíba. Com o barulho que fizeram, os ambientalistas contribuíram para o estabelecimento de limites colocados no Zoneamento Ecológico Econômico do Estado, plataforma que somente agora está sendo colocada em funcionamento. No entanto, não há qualquer mobilização contra os agroquímicos, que constituem uma ameaça real à biodiversidade, já que matam os insetos polinizadores. É consenso entre os apicultores que no contato com agrotóxicos, especialmente os modernos neonicotinóides, proibidos em outros países, as abelhas campeiras, que abastecem as colméias com néctar e pólen, perdem o senso de orientação. Como se estivessem drogadas, morrem no campo sem voltar a seus ninhos. Das que retornam, algumas contaminam as companheiras, contribuindo para liquidar suas famílias. Coluna publicada em dezembro de 1980 pelo professor de apicultura Hugo Muxfeldt, primeiro presidente da CBA, fundada em 1968 em Porto Alegre Detectado em 2007 nos Estados Unidos e na Europa, esse problema foi denominado ‘síndrome do colapso das colméias’ porque o desaparecimento de grande número de abelhas chega a paralisar a produção nos apiários. De início, a mortandade das abelhas foi atribuída aos pesticidas usados nas lavouras, mas algum tempo depois alguns pesquisadores aram a itir que poderia haver outras causas associadas ao problema, como um recrudescimento de pragas e doenças que tradicionalmente atacam as abelhas. Entre os mais graves, é citada a varroa, um ectoparasita que mina a saúde das abelhas. De qualquer forma, não há dúvida de que as abelhas não têm defesa senão afastar-se dos locais onde são aplicados agrotóxicos, como já recomendava o artigo publicado em dezembro de 1980 no Correio do Povo Rural pelo veterinário João Feeburg, dirigente da Associação Gaúcha de Apicultores. NOTAS DA AGA Controle no uso de pesticidas evita o sacrifício das abelhas “Estamos em uma nova safra de verão na agricultura gaúcha. Procurando evitar muitos acidentes e perdas de abelhas, apresentamos alguns itens que devem ser levados em conta por agricultores e apicultores. FATORES QUE INFLUENCIAM NA MORTALIDADE DAS ABELHAS 4z145r
- Aplicações na floração. Praticamente a única parte da planta visitada pelas abelhas é a flor. Evitando-se a aplicação de inseticidas nesse momento, estaremos beneficiando o apicultor, pois evitamos a morte das abelhas, e ao agricultor, pela preservação dos insetos polinizadores.
- Evitar a deriva dos produtos. O fato de um produto usado em uma lavoura que não esteja em floração atingir áreas vizinhas com outras plantas em floração pode causar muitas perdas de abelhas. A deriva também pode atingir diretamente o colmeal, com o que os danos podem ser maiores. Existem várias maneiras de evitar o problema. O agricultor deve solicitar a orientação do técnico para evitar a deriva.
- Hora de aplicação. O melhor momento para aplicar o inseticida é quando há pouco ou nenhum vento e as abelhas estão fora do local de aplicação. Os melhores momentos são à tardinha ou à noite. Infelizmente essa recomendação é difícil de ser seguida.
- Toxicidade do pesticida. Os inseticidas não apresentam todos os mesmos riscos para as abelhas. Alguns são muito tóxicos e matam as abelhas no momento do contato. Outros, de efeito lento, são levados para a colméia, matando as abelhas horas depois. Normalmente os herbicidas e os fungicidas são pouco tóxicos para as abelhas.
- Formulação do pesticida. Os pesticidas aplicados na forma líquida (pulverização) são menos perigosos que na forma de pó (polvilhamento). Algumas formulações de UBV (Ultra-Baixo Volume) são muito perigosas. Os inseticidas microencapsulados utilizados sem o cuidado de verificar a presença de colméias num radio de 3-5 km são extremamente perigosos.
SUGESTÕES PARA DIMINUIR OS RISCOS DOS PESTICIDAS
A única forma de diminuir sensivelmente os problemas causados pela utilização de defensivos é através da educação e da cooperação entre agricultores e apicultores. Deste ponto de partida comum os danos podem ser considerados mínimos, o que beneficiará a todos.
O AGRICULTOR DEVE:
- Realizar o tratamento no momento adequado, optando de preferência por um produto de baixa toxicidade para a abelhas e pela dose correta.
- Seguir a bula dos produtos, tanto para a aplicação como para as precauções escritas. Consultar um técnico sempre que houver dúvidas.
- Ter cuidados na aplicação, de maneira a diminuir a deriva.
- Evitar a aplicação na floração.
- Avisar com um mínimo de 48 horas ao apicultor vizinho, para que este tome as medidas adequadas.
O APICULTOR DEVE:
- Conhecer os cultivos na área de influência de suas abelhas, quais os produtos empregados e qual o momento do seu emprego.
- Avisar aos agricultores vizinhos da existência de colméias solicitando o aviso com 48 de antecedência de toda aplicação, para serem tomadas as medidas cabíveis.
- Proteger as colméias dos danos das pulverizações. De acordo com o produto, o apicultor optará por encerrar as abelhas por um dia dia ou dois, com ventilação, alimento e água suficientes.
Para evitar a deriva, as colméias podem ser cobertas com um material como lona, que impeça que o produto entre em contato com as abelhas e com a colméia. Deve haver o cuidado de molhar os materiais, mais ou menos de duas em duas horas.
Para produtos de baixo poder residual, o confinamento das abelhas é efetivo; para outros produtos, de alto poder residual, o ideal é transportar as colméias para locais distantes do local de aplicação, durante o tempo necessário para a perda do poder do inseticida.