Terreno da Fase: invasões e reservas ocupam 50% 133y6p

O presidente da FASE, Irani Bernardes de Souza forneceu ao jornal JÁ alguns números sobre a gleba que pertence à fundação e que o governo do Estado pretende permutar com empresas privadas para poder construir nove unidades pequenas para descentralizar os serviços com menores infratores. O terreno, que se estende por mais de um quilômetro ao longo da avenida Padre Cacique, sobe pela encosta e vai até o outro lado do morro, tem 73,5 hectares de área. Esse número exclui o lote de meio hectares que foi vendido para a TV Guaíba em 1976 (sem licitação!). As invasões, que também se intensificaram a partir dessa época, hoje ocupam 17,9% da área – são quatro núcleos principais e uma extensão da Vila Cruzeiro que avançou por uma borda do terreno. Em 2008, já com o intento de permutar ou vender a área, o governo fez o primeiro levantamento dos moradores das partes invadidas. Quatro comissões percorreram as vilas para cadastrar os moradores. Enfrentaram a resistência das associações de moradores, sem falar dos redutos dominados pela criminalidade. “Foram recebidas a tiro em alguns lugares”, conta o presidente. Por essas dificuldades, ele acredita que o levantamento subestimou o número de moradores nas áreas invadidas. Foram contados 760, mas Souza estima que devem ser mais de 1.500 famílias. “Multiplique por cinco/seis em cada família, dá oito nove mil pessoas”. Além das invasões, tem as áreas de preservação ambiental. Eles não estavam sequer identificadas ate 2007, quando a Fundação Zoobotânica fez o primeiro inventário das áreas, mas elas não estão medidas. Em todo o caso, para efeitos de estimativa foram considerados 35 hectares como sendo área livre e essa foi a dimensão considerada no cálculo que estimou o valor do terreno em R$ 76 milhões. (continua) 2j6a31

TERRENO DA FASE: DUAS SEMANAS PARA DECIDIR 2m662b

Dia seis de junho. É a data limite que a Assembléia Legislativa tem para decidir sobre o terreno da Fundação de Atendimento Sócio Educativo (Fase), na avenida Padre Cacique.
O projeto de lei 388, que trata do assunto, tramita no legislativo estadual desde dezembro do ano ado. Já teve parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça, mas não foi adiante.
Alvo de muitas críticas, foi retirado e retificado pelo executivo. Retornou à Assembléia no dia 5 de maio com alguns reparos secundários e com pedido de urgência, logo aprovado, o que significa 30 dias para ir à votação em plenário.
“As mudanças foram decididas em reuniões com todas as partes interessadas e as dúvidas sobre o projeto foram esclarecidas, vamos aprová-lo”, diz o deputado Adilson Troca, líder do PSDB.
A principal mudança, na verdade, é a inclusão de um “Comitê de Acompanhamento Externo”, para o qual “serão convidados” representantes do Tribunal de Justiça, Ministério Público Estadual, Assembléia Legislativa, Procuradoria-Geral do Estado, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente.
“As alterações são insuficientes, o projeto continua inexplicável. Não há como evitar a suspeita de há algo errado com esse negócio”, diz o vice-líder petista, Raul Pont, um dos mais severos críticos da proposta.
O projeto, em sua essência, é uma autorização ao governo do Estado para vender ou permutar uma área pública de aproximadamente 74 hectares ( o dobro do Parque da Redenção), num dos pontos mais valorizados de Porto Alegre – para viabilizar a implantação de nove unidades descentralizadas de atendimento a menores infratores.
Não há resistência, nem do mais ardente oposicionista, à proposta de descentralização dos serviços da FASE, até porque essa é a orientação do Sistema Nacional de Atendimento Sócio Educativo – unidades com no máximo 90 internos.
As críticas ao projeto se prendem à falta de clareza, tanto no que se refere ao terreno a ser alienado quanto das nove unidades a serem construídas em troca da área. “Não há sequer uma avaliação da área. Como é que vai se fazer uma licitação sem ter um preço mínimo?”, indaga Pont.
A avaliação existente (que não consta do projeto) foi feita pela Telear, uma empresa privada, que estimou em R$ 76 milhões o valor do terreno.
Raul Pont questiona essa avaliação: “Naquela mesma região, o antigo estádio do Inter, que tem pouco mais de 2 hectares, está avaliado em R$ 23 milhões. O terreno da Corlac, uma área pública, foi alienado por R$ 13 milhões e tem menos de um hectare. Por que o hectare nesse terreno da Fase, numa área mais nobre, vale tão menos?”
O deputado petista reconhece que, com a folgada maioria formada pelos partidos que o apoiam, o governo estadual tem condições de aprovar o projeto. “Nós vamos continuar denunciando e, em caso de aprovação, vamos recorrer à Justiça”.
Analise comparativa das duas versões do projeto
A primeira versão do projeto de lei 388 foi encaminhada a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul em 14 de dezembro de 2009.
Seu conteúdo só chegou ao público no início de março deste ano, quando começaram a circular nas redes da Internet artigos e comentários, levantando suspeitas sobre as verdadeiras intenções do projeto.
Esse movimento de opinião pública repercutiu na Assembléia, onde a Comissão de Constituição e Justiça estava para votar o parecer favorável do relator, Iradir Petroski, do PTB, hoje ministro do Tribunal de Contas do Estado. A votação na CCJ foi duas vezes adiada e, em seguida o governo retirou o projeto.
No dia 5 de maio encaminhou uma “mensagem retificativa” em que o essencial – a autorização para vender ou permutar o terreno da Fase- permanece, mas alguns pontos foram acrescentados, reconhecendo a pertinência das críticas.
A assessoria técnica do PT fez um estudo comparativo dos dois textos, para assessorar a bancada. Ele esclarece bem o que mudou no projeto:
Projeto de Lei nº 388/09 –
Primeira versão:
Art. 1º Fica a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo – FASE autorizada a alienar ou a permutar, por área construída, por meio de procedimento licitatório, o imóvel localizado no Município de Porto Alegre, …
Segunda versão
Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a permutar ou alienar, por meio de procedimento licitatório, o imóvel descrito abaixo:…
(Comentário: Projeto original autorizava a FASE, agora autoriza o Estado. A ementa ficou original, autorizando a Fase. Inverte a ordem das palavras “alienar” e “permutar”, mostrando que só a alienação é por licitação. Retira a possibilidade de permuta por área construída, então, seria por outro imóvel?
Primeira versão:
Art. 1º (descrição da área) (…); este imóvel é composto dos prédios de nº 1600 e 1554 e mais benfeitorias, e do respectivo terreno com a área total de 10.644mq50 e ….
Segunda Versão:
Art. 1º (descrição da área) (…) Existindo no imóvel os prédios de nº 1600, 1554 e mais benfeitorias, excluída a área pertencente à Televisão Guaíba Limitada a seguir descrita: “O terreno com a área total de 10.644mq50 e ….
( Comentário: A redação original incluía área já vendida para a TV Guaíba em 1976. Agora foi corrigida).
Primeira versão:
§ 1o. – Inexistente
Segunda versão
§ 1º – Deverá ser observada a área de servidão descrita na matrícula no 5.935, no 2o Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de Porto Alegre, Livro no 2 Registro Geral.
(Comentário: A servidão de agem da TV Guaíba pelo terreno da Fase (Febem) estava registrada na matrícula do imóvel, mas não era ressalvada no projeto).

Primeira versão:
§ 2o. Inexistente
Segunda versão:
§ 2º – Fica garantido às comunidades estabelecidas no local, o direito social à moradia, preservando-se as disposições da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001 – Estatuto da Cidade.
(Comentário: Apenas menciona o direito à moradia nos termos do Estatuto das Cidades, mas mantém a inclusão da área das Vilas Gaúcha, União Santa Tereza, Figueira e Ecológica na venda).
Primeira versão:
Art. 2o. – Inexistente
Segunda versão:
Art. 2º – Fica resguardado, por ocasião da permuta ou alienação a preservação dos espaços de preservação ambiental e histórica, se houver, respeitada a legislação pertinente.
(Comentário: Menciona as áreas de preservação ambiental e histórica, se houver, mas não coloca nenhuma obrigação do Poder Público.)

Primeira versão:
Art. 2º – Os recursos obtidos com a alienação ou permuta do imóvel descrito no artigo anterior se destinam à construção de unidades descentralizadas para a execução das medidas sócio-educativas de internação, conforme o disposto na Lei Federal no 8.069, de 13 de julho de 1.990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Segunda versão: (o artigo 2o. virou 3o.)
Art. 3º – Os recursos obtidos mediante a autorização prevista no artigo 1º desta Lei serão destinados exclusivamente à construção de unidades descentralizadas em Porto Alegre, Região Metropolitana, Osório e Santa Cruz do Sul, para a execução das medidas sócio-educativas de internação, num prazo de máximo de cinco anos, respeitadas as disposições da Lei Federal no 8.069, de 13 de julho de 1.990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
(Comentário: Acrescenta genericamente a construção das casas em Porto Alegre, região Metropolitana Osório e Santa Cruz do Sul e o prazo de cinco anos para as construções. Permanece sem especificar o número de casas e sem explicar as condições exigidas para construção.Coloca a aplicação exclusiva, mas não cria um fundo fora do Caixa Único.)
Primeira versão:
§ 1o. – Inexistente
Segunda versão:
§ 1º – Os recursos financeiros porventura excedentes resultantes do processo licitatório de que trata esta Lei, deverão ser aplicados na melhoria das condições de trabalho da FASE e no atendimento socioeducativo.
(Comentário: Reconhece que pode haver recursos excedentes, mas coloca em despesas correntes, o que é vedado pela LRF: “Art. 44. É vedada a aplicação da receita de capital derivada da alienação de bens e direitos que integram o patrimônio público para o financiamento de despesa corrente, salvo se destinada por lei aos regimes de previdência social, geral e próprio dos servidores públicos.”)

Primeira versão:
§ 2o. – Inexistente
Segunda versão:
§ 2º – A aplicação do disposto nesta Lei, inclusive a aplicação dos recursos, será acompanhada por Comitê de Acompanhamento Externo, para o qual serão convidados representantes dos seguintes órgãos:
a) Tribunal de Justiça;
b) Ministério Público Estadual;
c) Assembléia Legislativa;
d) Procuradoria-Geral do Estado;
e) Defensoria Pública;
f) Ordem dos Advogados do Brasil Seção Rio Grande do Sul;
g) Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente – CEDICA.
(Comentário: Acrescenta esse comitê de acompanhamento que não tem funções definidas. Não há representação dos trabalhadores.)
Tisiane Siqueira – Assessoria Técnica – em 06/05/2010