Fórum de Mídia Livre levou 400 ao Rio de Janeiro 3s965

Naira Rofmeister, do Rio de Janeiro
A parca divulgação realizada principalmente através de sites e blogues na Internet foi o suficiente para lotar o auditório da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, entre os dias 15 e 16 de junho. Com direito à vista para o Pão de Açúcar, cerca de 400 participantes circularam no 1º Fórum de Mídia Livre em busca de alternativas que garantam a sustentabilidade e a independência de seus veículos.
Em comum, apenas a alcunha “midialivristas”, definida como mais abrangente nos pré-encontros realizados nos estados desde março. Através dos corredores do prédio histórico à beira-mar, circularam diplomados e autodidatas que mantém projetos fora dos padrões dos grandes grupos de comunicação brasileiros.
Morador de favela que faz televisão, rato de internet que criou um blog de baixa audiência, editores de jornais de bairro e representantes de meios nacionais já consagrados – à exemplo do suplemento Diplô, do Le Monde Diplomatique, jornal Brasil e Fato, Revista Fórum e Agência Carta Maior – estavam lá. “Buscamos aqui o consenso do dissenso”, avaliou a diretora da ECO, Ivana Bentes, garantindo a manutenção das singularidades.
As diferenças também se manifestaram nas concepções pessoais. “Nosso inimigo hoje é a Globo. Amanhã será a Record”, discursou o inflamado Mário Augusto Jakobskind, do Brasil de Fato, que teve metade da platéia a seu lado e a outra parte, contra seu posicionamento.
Radicalismos a parte, sobressaiu o bom senso e a compreensão de objetivos comuns à todos. Cinco pontos centrais foram determinados em votação no domingo e sua aplicação será avaliada no Fórum Social Mundial, que acontece em janeiro de 2009, no Pará.
O apoio à realização de uma Conferência Nacional da Comunicação – bandeira já levantada por diversas entidades que pregam a democratização da informação – foi decidido.
Autoridades dos três poderes nas esferas municipal, estadual e federam vão receber um documento com as reivindicações do movimento. Em Brasília, será realizada uma mobilização especial.
Dinheiro e felicidade
Em 2007, 19 bilhões de reais foram gastos em publicidade nos meios de comunicação. Quase 60% dessa verba foi destinada para a televisão e 42% ficou concentrada no estado de São Paulo. A TV Globo abocanhou 35% do total dos investimentos em propaganda.
Essa concentração ocorre especialmente por critérios adotados pelo mercado da propaganda que invariavelmente busca alcance massivo para seus clientes. Isso significa, por exemplo, excluir veículos que tenham circulação menor, ainda que qualificada de campanhas publicitárias.
“Temos que criar uma legislação que garanta a distribuição igualitária de verbas”, defendeu o editor de Carta Maior, Joaquim Palhares.
Causou confusão a proposta da criação de mecanismos de incentivo à publicidade privada como um selo de “empresa amiga da mídia livre”.
“Não há na história do Brasil uma iniciativa revolucionária que tenha sido apoiada pela burguesia” lembrou o professor Hamilton Otávio de Souza, coordenador do curso de jornalismo da PUC-SP.
Por isso, as definições nesse campo, estão, por enquanto, na esfera do poder público. O Governo Federal, por exemplo, investe cerca de um bilhão em propaganda anualmente.
“Isso sem contar as empresas estatais, como Caixa, Petrobrás e Banco do Brasil, que somam mais de R$ 500 milhões”, observou o editor da Revista Fórum, Renato Rovai, que coordenou o grupo de trabalho.
Mecanismos análogos ao que representam a Lei Rouanet e os Pontos de Cultura, do Minc, foram sugeridos como possíveis saídas ao bloqueio que os veículos alternativos enfrentam.
Outra importante questão levantada foi a centralização do sistema de distribuição, atualmente dividido entre duas empresas que detém o monopólio absoluto do setor.
Saída para qualquer parte
A partir da realização de encontro regionais, do Fórum Social Mundial em 2009 na Amazônia e da Conferência Nacional da Comunicação, os integrantes do Fórum de Mídia Livre sugeriram a criação de um novo veículo de alcance nacional. “Um jornal que concentrasse toda a nossa força”, imagina o repórter Darío Pignotti, dos jornais Página 12 (Argentina) e Manifesto.
O ítalo-argentino quer ir ainda mais longe. “Temos que buscar a integração com os demais países da América Latina, que também sofrem com a concentração dos meios de comunicação”, acredita.
Por ora, ficou a intenção de criar um portal de notícias que congregue todos os veículos participantes do 1º Fórum de Mídia Livre e que possibilite ao leitor conhecer as diversas inicviativas de comunicação produzidas no território nacional. Algumas informações também podem ser adas no blogue do evento, http://forumdemidialivre.blogspot.com.
– Essa reportagem é um dos destaques da edição 386 do jornal JÁ Bom Fim/Moinhos. A publicação é quinzenal e circula gratuitamente nos 10 bairros da área central de Porto Alegre.

Manifesto da Mídia Livre 44283c

O setor da comunicação no Brasil não reflete os avanços que ao longo dos últimos trinta anos a sociedade brasileira garantiu em outras áreas. Isso impede que o país cresça democraticamente e se torne socialmente mais justo.
A democracia brasileira precisa de maior diversidade informativa e de amplo direito à comunicação. Para que isso se torne realidade, é necessário modificar a lógica que impera no setor e que privilegia os interesses dos grandes grupos econômicos.
Não se pode mais aceitar que os movimentos sociais que conquistaram muitos dos nossos avanços democráticos sejam sistematicamente criminalizados, sem condições de defesa, pela quase totalidade dos grupos midiáticos comerciais. E que não tenham condições de informar suas posições com as mesmas possibilidades e com o mesmo alcance à disposição dos que os condenam.
Um Estado democrático precisa assegurar que os mais distintos pontos de vista tenham expressão pública. E isso não ocorre no Brasil.
Também precisa criar um amplo e diversificado sistema público de comunicação, no sentido de produzido pelo público, para o público, com o público. Tal sistema deve oferecer à sociedade notícias e programação cultural para além da lógica do mercado.
Por fim, um Estado democrático precisa defender a verdadeira liberdade de imprensa e de o à informação, em toda sua dimensão política e pública. E ela só se dá quando cidadãos e grupos sociais podem ter condições de expressar idéias e pensamentos de forma livre, e de alcançar de modo equânime toda a variedade de pontos de vista que compõe o universo ideológico de uma sociedade.
Para que essa luta democrática se fortaleça, os que assinam este manifesto convidam a todos que defendem a liberdade no o e na construção da informação a participarem do 1º Fórum da Mídia Livre, que se realizará na Universidade Federal do Rio de Janeiro, nos dias 17 e 18 de maio de 2008.
Os que assinam esse manifesto apresentam a seguir algumas propostas, preocupações e idéias, que, entre outras, serão debatidas no Fórum de Mídia Livre.
Nos declaramos a favor de que:
-O Estado atue no sentido de garantir a mais ampla diversidade de veículos informativos, da total liberdade de o à informação e do respeito aos princípios da ética no jornalismo e na mídia em geral;
– Realize-se com a maior urgência a Conferência Nacional de Comunicação que discutirá, entre outras coisas, um novo marco regulatório para o setor, com o objetivo de limitar a concentração do mercado e a formação de oligopólios;
– A inclusão digital seja tratada com a prioridade que merece e que o investimento nela possibilite o o a canais em banda larga a toda a população, para que isso favoreça redes comunitárias (WiFi) e faixas em espectro livre;
– As verbas de publicidade e propaganda sejam distribuídas levando em consideração toda a ampla gama de veículos de informação e a diversidade de sua natureza; que os critérios de distribuição sejam mais amplos, públicos e justos, para além da lógica do mercado; e que ao mesmo tempo o poder público garanta espaços para os veículos da mídia livre nas TVs e nas rádios públicas, nas suas sinopses e meios semelhantes;
– O Estado brasileiro atue no sentido de apoiar as iniciativas das rádios comunitárias e não o contrário, como vem acontecendo nos últimos anos;
– O Estado brasileiro considere a possibilidade de a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos atue na área de distribuição de periódicos, criando uma nova alternativa nesse setor;
– O Cade intervenha no atual processo de concentração de distribuição de periódicos impressos, evitando a formação de um oligopólio que possa atingir a liberdade de informação;
– A Universidade dê sua contribuição para a democracia nas comunicações, em seus cursos de graduação e pós-graduação em Comunicação Social, formando profissionais críticos que possam contribuir para a produção e distribuição de informação cidadã;
– A revisão do processo de renovação de concessões públicas de rádio e TVs, já que nos moldes atuais ele não a por nenhum controle democrático, o que possibilita pressões e negociações distantes dos idéias republicanos, levando à formação de verdadeiras capitanias hereditárias na área;
– A sistematização e divulgação de demonstrativos dos gastos com publicidade realizados pelo Judiciário, pelo Legislativo e pelo Executivo, nas diferentes esferas de governo;
– A definição de linhas de financiamento para o aporte tecnológico e também para a constituição de empreendimentos da mídia livre e sem fins lucrativos com critérios diferentes do que as concedidas à mídia corporativa e comercial; e que isso seja realizado com ampla transparência do montante de recursos, juros e critérios para a obtenção de recursos;
– Que há condições para que o movimento social democrático brasileiro e também os veículos da mídia livre mobilizem recursos e esforços para constituir um portal na internet, um portal capaz de abrigar a diversidade das expressões da cidadania e de garantir a máxima visibilidade às iniciativas já existentes no ciberespaço.