Consciência Negra: Lanceiros Negros na Biblioteca 2d2u3m

Os jornalistas Geraldo Hasse e Guilherme Kolling, autores do livro-reportagem Lanceiros Negros, fazem palestra na Biblioteca Pública Josué Guimarães na manhã desta quarta-feira (10 hs), como parte das atividades da Semana da Consciência Negra. Um massacre de escravos no final da Revolução Farroupilha (1835-1845), no Cerro dos Porongos, foi o ponto de partida para o livro, que resgata o papel e a importância do negro na historiografia regional. O livro mostra também como estes fatos de um ado já remoto estão atualmente mobilizando intelectuais e ativistas que a partir deles pretendem redescobrir a história do negro no Rio Grande do Sul. Lanceiros Negros mostra ainda uma cronologia dos eventos guerreiros no Cone Sul, e relata a tradição do uso de lanças no pampa, desde o século 18, chegando até a Revolução Farroupilha, quando se descreve como foi feita a organização e o recrutamento dos lanceiros, e sua importância estratégica para os Farrapos. Tudo ilustrado com documentos em que chefes dos dois lados dão seu depoimento sobre esses guerreiros. O livro traz ainda um panorama da escravidão na época dos Farrapos. A Biblioteca Josué Guimarães fica na Av. Erico Verissimo, 307, na Azenha Lanceiros Negros – 2ª edição, revisada e ampliada Autores: Geraldo Hasse e Guilherme Kolling Editor: Elmar Bones JÁ, 2006, 144 p. 3r487

Já na Feira do Livro 392v5q

Na 57ª. Feira do Livro, você encontra todos os títulos da JÁ Editores na banca da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), que este ano privilegia as obras das editores locais, principalmente os associados do Clube dos Editores de Porto Alegre.
A banca azul da ARI fica em frente ao Memorial, ao lado da banca amarela do Instituto stadual do Livro (IEL).
Entre os títulos de destaque do catálogo de JÁ Editores, estão com descontos especiais:
“Lanceiros Negros”, de Geraldo Hasse e Guilherme Kolling, que mostra a participação dos escravos nas revoluções gaúchas;
“O Editor Sem Rosto”, de Elmar Bones, ensaio biográfico sobre Luiz Rossetti, o italiano que foi editor do jornal “O Povo”, órgão oficial da Revolução Farroupilha.
“Patrulha de Sete João”, de Euclides Torres, baseado no diário de um alemão trucidado por questões políticas no interior do Rio Grande do Sul.

“Pioneiros da Ecologia”, de Elmar Bones e Geraldo Hasse, com depoimentos inéditos de José Luztenberger e os pioneiros que fundaram o movimento ecológico.
“Três No Divã”, de João Gomes Mariante, uma olhar de psicanalista sobre três líderes políticos: Oswaldo Aranha, Flores da Cunha e Getulio Vargas.

JÁ Editores na Bahia com Olodum 1s681h

Um auditório lotado e gente sentada até pelos corredores. Foi assim o seminário “Rebeliões da população escrava e da plebe livre no Brasil – aplicações da lei 10.639/03”, promovido pela Escola Olodum, em Salvador, de 25 a 27 de agosto.
O jornalista e escritor Euclides Torres, único conferencista gaúcho presente, representou JÁ Editores.
A Olodum quer fortalecer o debate nacional acerca da implementação da Lei 10.639/03, e dar subsídios a educadores sobre as rebeliões escravas e da plebe livre em sala de aula.
O seminário também celebrou os 211 anos da Revolta dos Búzios, e traçou paralelos com outras rebeliões, como Cabanagem, Balaiada, os Farrapos e os Lanceiros Negros, o Levante dos Malês e a Revolta da Chibata.
Euclides Torres publicou A Patrulha de Sete João, o relato de uma época cruel no Sul do Brasil, e colaborou como pesquisador de A Paz dos Farrapos e Lanceiros Negros, todos títulos de jornalismo literário concebidos, produzidos e publicados por JÁ Editores.
Torres foi repórter, editor e lecionou no curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Maria. Atualmente toca uma pequena propriedade em Caçapava do Sul e conclui a pesquisa para a finalização do seu próximo livro, Farrapos e Sabinos, sobre as conexões entre os rebeldes gaúchos e baianos.

Livramento vai resgatar o polêmico general farrapo j376m

Cleber Dioni *
Após 61 anos, Santana do Livramento voltará a abrigar os restos mortais de David Canabarro, o general que se tornou um dos grandes heróis riograndenses, mas que para alguns pesquisadores não ou de um traidor, responsável pelo massacre dos lanceiros negros farrapos, em Porongos.
Os despojos serão retirados na segunda-feira (25) de manhã e seguirão em uma urna rumo ao município da fronteira-oeste, onde o líder farroupilha escolheu para viver a partir dos 32 anos de idade. O túmulo do cemitério da Santa Casa de Porto Alegre foi aberto na quarta-feira ada para verificar as condições dos despojos, o que segundo o presidente da Comissão de Remoção e Translado de David Canabarro, o poeta Edilson Villagran Martins, está em boas condições de conservação.
O translado será escoltado inicialmente pela guarda de honra da Brigada Militar e depois por um grupo de tradicionalistas santanenses, ficando o revezamento dos cavalarianos a cargo dos CTGs das cidades por onde cruzar.
A chegada a Livramento está prevista para o dia 13 de setembro, véspera dos festejos da Semana Farroupilha. Será enterrado junto a um monumento com seu busto, que está sendo feito na vizinha Rivera, no Uruguai. O local escolhido para receber o mausoléu é um terreno ao lado da antiga residência do líder farroupilha, onde o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a istração municipal irão instalar o Museu do Pampa.
Cerca de 20 integrantes do Grupo Santanense de Cavalgada percorrerão mais de 500 quilômetros a cavalo escoltando a urna e a centelha da Chama Crioula, acesa este ano em São Leopoldo. A urna será levada em um carro.
Há uma forte ligação histórica entre os dois fatos: a chegada dos despojos de Canabarro à Capital, há 61 anos (05.09.1947), coincide com a criação da Chama Crioula, símbolo máximo das comemorações da Semana Farroupilha. Sendo que alguns dos jovens tradicionalistas que realizaram o cortejo fúnebre, a cavalo, no dia 5, participaram do piquete no acendimento da primeira Chama, no dia 7. Figuravam entre eles, Cyro Dutra Ferreira, João Carlos D’Ávila Paixão Côrtes e Orlando Degrazzia.
Um memorial para o mausoléu
A comissão responsável pelo translado elaborou um projeto para captação de recursos através das leis de incentivo à cultura a fim de construir um memorial na Praça General Osório, no centro de Livramento, para receber os restos mortais de Canabarro. O projeto, inicialmente orçado em R$ 90 mil, subiu para R$ 150 mil, depois que o busto de Canabarro, no monumento existente na praça desde 1935, e que seria transferido para o novo espaço, foi roubado em setembro do ano ado. Agora, uma equipe de Rivera, cidade uruguaia vizinha a Livramento, foi contratada para esculpir o busto do farrapo que ficará num terreno adquirido recentemente pelo município, ao lado da casa que pertenceu à Canabarro, onde está prevista a instalação do Museu do Pampa.
O memorial foi desenhado pela arquiteta Ana Zart Bonilha. Concebido como o “Espaço David Canabarro”, o monumento fica em posição de destaque sobre uma base em granito polido que abrigaria os despojos do general. Na pedra serão gravados os nomes das principais batalhas das quais o líder farrapo participou. O espaço terá ainda um jardim feito com terra de Taquari, cidade natal de Canabarro, um espelho d’água e bancos no entorno A área total, incluindo a pavimentação, tem cerca de 70m².
“A idéia central é resgatar a memória histórica dos santanenses e ao mesmo tempo criar um espaço de convívio e contemplação que se torne referência para o turismo da fronteira”, ressalta arquiteta.
Uma longa jornada
O presidente da comissão assegura que já está de posse de todas autorizações para realizar a viagem.
Ele cita contribuições importantes de familiares como João Fernandes, trineto de Canabarro, e Clóvis Fernandes, tataraneto do general, que estiveram envolvidos na comissão e ajudaram a recolher s de parentes.
Além dos familiares, foram necessárias autorizações do provedor da Irmandade da Santa Casa de Porto Alegre, José Sperb Sanseverino, de representantes da Liga de Defesa Nacional, do Governo do Estado, da Prefeitura de Santana do Livramento e do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul (IHGRS).
O presidente da comissão confessa que não foi fácil convencer a todos. “A idéia surgia de tempos em tempos mas esse último projeto teve início em 2003. Alguns não se deram conta da importância histórica disso tudo e se mantiveram neutros, mas muitos ajudaram. Para o poeta, o historiador Ivo Caggiani teve frustrada sua tentativa devido à falta de apoio.
Desta vez, o último obstáculo foi o parecer favorável do IHGRS. “Havia alguma resistência na entidade. Na assembléia que definiria o parecer, o professor Moacyr Flores não compareceu”, destaca o poeta.
O prefeito Renato Baptista dos Santos, de Taquari, cidade natal de Canabarro, em 2006 chegou a esboçar uma reação contra a idéia da transferência para Livramento, mas foi demovido pelo próprios descendentes de Canabarro que moram na fronteira-oeste. Hoje, evita em falar no assunto.
Villagrán pretende distribuir 100 medalhas com a fisionomia do general a todas instituições e pessoas que se engajaram nessa mobilização.
Piquete criou Chama Crioula
A chegada dos restos mortais de David Canabarro em Porto Alegre, em setembro de 1947, coincide com a criação da Chama Crioula, símbolo máximo das comemorações da Semana Farroupilha.
Há uma ligação histórica entre os dois fatos, além de terem completado 60 anos: é que a alguns dos jovens tradicionalistas que realizaram o cortejo fúnebre, a cavalo, no dia 5, participaram do piquete no acendimento da primeira Chama Crioula, no dia 7.
O gesto, batizado inicialmente como Ronda Gaúcha, foi o embrião do Movimento Tradicionalista Gaúcho. Teve como protagonistas oito estudantes do Colégio Julio de Castilhos, que ficaram conhecidos como o “Grupo dos 8”. Eram eles: Antônio João de Sá Siqueira, Cilço Campos, Ciro Dias da Costa, Cyro Dutra Ferreira, Fernando Machado Vieira, João Carlos D’Ávila Paixão Côrtes, João Machado Vieira e Orlando Degrazzia.
Paixão Côrtes liderava o grupo e foi quem organizou a formação da guarda de honra civil que acompanharia a cavalo os despojos do general farroupilha em troca da liberação do Exército para a retirada de uma centelha da pira da Pátria. Levado até o Julinho, o fogo acendeu um candeeiro, simbolizando o culto aos personagens da Revolução Farroupilha, iniciada naquele mês, em 1835.
Um Panteon para os heróis
A Liga de Defesa Nacional foi quem mandou remover os despojos do general porque pretendia construir no cemitério da Santa Casa de Porto Alegre o Panteon Riograndense, obra jamais realizada.
Uma nota de 10 linhas na página 2 do Correio do Povo, do dia 5 de setembro de 1947, uma sexta-feira, publica um telegrama do prefeito Flavio Mena Barreto Matos endereçado ao major Darci Vignoli, presidente da Liga de Defesa Nacional, em que anuncia a chegada dos restos mortais de Canabarro, às 10 horas da manhã, no aeroporto de São João, em Porto Alegre. A urna chegaria em avião da Força Aérea Brasileira pilotado pelo tenente-coronel aviador Remo Canabarro Lucas, bisneto do general farrapo.
Na edição de sábado, dia 6, o jornal publica uma foto do cortejo, com os militares, na frente, conduzindo a urna. E fala no Departamento de Tradições Gaúchas do Colégio Julio de Castilhos que, “associando-se à homenagem, escalou um grupo de cavalarianos para, em trajes gauchescos, acompanhar os seus despojos até a praça Senador Florêncio, onde os mesmos foram entregues oficialmente à Irmandade da Santa Casa”.
No dia seguinte, o informa que “pouco antes de ser extinto o fogo da pira da Pátria, no Parque Farroupilha, foi nele acendida uma tocha e conduzida por alunos do Colégio Julio de Castilhos, todos vestidos com roupas tipicamente gaúchas, e conduzindo as bandeiras Farroupilha e Nacional, até o saguão do colégio, onde a chama simbólica foi colocada numa pequena pira que permanecerá acesa até o dia 20 de setembro, data em que se comemora mais um aniversário da Revolução Farroupilha. Esse período é denominado “Ronda Gaúcha”. Nos desfiles do dia 20, apenas a Brigada Militar desfilou em frente ao Palácio Piratini, prestando continência ao governador Valter Jobim.
Dias inesquecíveis
A movimentação de jovens pilchados a cavalo pelas ruas de Porto Alegre tornou aqueles primeiros dias de setembro inesquecíveis para Paixão Côrtes. Ele lembra que o departamento de tradições do Julinho preparou várias festividades, entre elas, um baile gaúcho e um concurso de pilchas, no Teresópolis Tênis Club, do qual foi julgador o escritor Manoelito de Ornelas. ‘”Nós queríamos ar toda aquela semana, em especial, revivendo os costumes lá de fora”, afirma o folclorista.
Mas o fato inusitado naqueles dias foi a preparação dos jovens para o cortejo fúnebre. “Tivemos que sair por aí, conseguir cavalos, arreios, depois as pessoas nos olhavam como um bando de loucos andando a cavalo na cidade. Mas cumprimos com o combinado e no 7 de setembro, em plena João Pessoa, nos foi autorizados acender a Chama Crioula. Estávamos embandeirados com os símbolos do colégio e do Rio Grande do Sul. Levamos a Chama para o salão do Julinho, onde foi acender o Candeeiro Crioulo”.
Logo em seguida, várias pessoas foram se juntar aos jovens tradicionalistas, entre eles, Luiz Carlos Barbosa Lessa, também aluno do Julinho, um dos fundadores do primeiro Centro de Tradições Gaúchas do Estado, o CTG 35, e que viria se tornar mais tarde um dos maiores pesquisadores da cultura gaúcha.
Museu será pólo cultural
A propriedade que pertenceu a Canabarro vai virar o Museu do Pampa Gaúcho, projeto elaborado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em convênio com a prefeitura de Livramento.
A istração municipal comprou o imóvel para que o Iphan o reformasse e é o próprio instituto que vai supervisionar a instalação do museu.
A aquisição demorou mais do que o previsto porque o antigo morador, Luiz de Mello Arnes, ganhou o título de uso capião no início de 2007, o que dificultou a desapropriação. Arnes residiu com seus familiares na casa histórica por mais de três décadas. O município teve que desembolsar R$ 200 mil para receber as chaves.
A propriedade fica na avenida 24 de Maio, 1024, esquina com a rua Barão do Triunfo e ao lado de uma unidade do Exército. Está distante cerca de 500 metros da Praça General Osório, no Centro, e 900 metros da fronteira com Rivera.
Canabarro mandou construir a residência por volta de 1845 para servir de hospedagem a ele e a seus familiares enquanto estivessem de agem na cidade. Depois, doou a uma irmã. O general ava a maior parte do tempo na estância São Gregório, no distrito do Cati, em Livramento. Viveu na campanha até a morte, em 1867.
A casa é simples. Os registros do Iphan da época do tombamento, em maio de 1953, dão alguns detalhes: “possui paredes externas executadas em alvenaria de pedra, as internas em pau-a-pique e a cobertura em telhas cerâmicas, do tipo capa/canal, constituindo um exemplo da arquitetura singela característica da região da campanha do Rio Grande do Sul”.
A arquiteta Ana Lúcia Meira, superintendente do Iphan no Estado, diz que a propriedade tombada pelo patrimônio histórico está sendo pensada como um ode à vida, ao bioma Pampa, ao ambiente, à cultura.
A historiadora Beatriz Muniz Freire, do Iphan, é quem vai supervisionar a instalação do museu. “A proposta não se limita a contar através de peças e fotos a trajetória de Canabarro. É muito mais do que isso. A idéia é transformar o Museu do Pampa num referencial da cultura gaúcha na Região da Campanha”, afirma.
A casa será umas das peças do museu, que pode se transformar num projeto maior, que incluiria o prédio da Estação Ferroviária, hoje em desuso, distante cerca de 100 metros dali. “A cidade de Livramento possui muitos espaços, tem a Estação Ferroviária, tem a estrutura do antigo Frigorífico Armour, mais distante. Pensamos em transformar aquela área em torno da casa, e quem sabe a cidade, num pólo cultural, poderemos firmar um acordo binacional, onde o vizinho Uruguai poderia contribuir com sua história e recursos técnicos”, explica.
De acordo com o projeto, serão instaladas salas de espetáculo e de exposições permanentes e temporárias, uma biblioteca com acervo sobre a conquista da fronteira, coleções de interesse artístico e histórico, e estuda-se também até uma loja de artesanato.
A arquiteta Ana Meira não viu sentido em permitir a construção do memorial a Canabarro no terreno do futuro museu. “Colocar um enterramento lá significaria mudar totalmente esse sentido e o Museu do Pampa viraria um mausoléu, tudo o que não queremos”, salienta. Por isso, a prefeitura adquiriu um outro terreno, segundo Villagran.
Para a diretora do Departamento de Cultura de Livramento, Cecília Amaral, o museu deve se transformar num ponto turístico e num dos maiores referenciais da cultura sul-rio-grandense. “Queremos que o museu seja um centro cultural, uma referência sobre a história da conquista da fronteira”, diz Cecília.
Falta definir o que será transferido do Museu David Canabarro para o futuro Museu do Pampa, ainda que o órgão municipal possua pouquíssimos objetos do general farroupilha. Uma das peças é um quadro de autor desconhecido, pintado em Pelotas em 1887 e doado pelo Museu Julio de Castilhos em 1953. Há algumas peças expostas, como uma faixa e duas dragonas que estão identificadas como de David Martins, mas que se referem a um general santanense que, enquanto tenente, chegou a servir como secretário de Canabarro e, mais tarde, já no posto de general, comandou a divisão dos maragatos em Livramento durante a Revolução Federalista, em 1893.
Gil aconselhou patrocinadores
Quando esteve no Estado em novembro de 2005 para a reinauguração do Museu Dom Diogo, de Bagé, o ministro da Cultura Gilberto Gil lembrou que a implantação do Museu do Pampa, em Livramento, e do Museu do Doce, em Pelotas, foram aprovados no projeto de Modernização de Museus 2005/2006 do MinC/Iphan.
Sugeriu que, a exemplo do Museu Dom Diogo, os dois projetos deveriam ser viabilizados por meio da Lei de Incentivo à Cultura (LIC), com patrocínio de instituições federais como Petrobras ou Caixa Econômica Federal, que já financiaram várias instituições do Estado.
Caggiani foi pioneiro
A idéia de transformar a casa bicentenária em museu surgiu em 1954, um ano depois de ser tombada pelo Iphan. Foi proposta pelo historiador e jornalista Ivo Caggiani, um dos melhores biógrafos do general farrapo. Ele também foi o primeiro a pedir o retorno dos restos mortais do oficial para Livramento.
Caggiani, falecido em abril de 2000, queria que o imóvel virasse o museu David Canabarro, mas quem ficou com a denominação foi o museu municipal. A iniciativa tinha um alcance maior: incluía o tombamento da fazenda São Gregório e do quartel-general de Canabarro, não muito distante da sua estância. Mas não vingou.
Em 2003, a superintendência do Iphan no Rio Grande do Sul elaborou um projeto específico para aquela propriedade a fim de criar um pólo cultural na região. Devido ao péssimo estado de conservação da casa, e as sucessivas alterações ao longo dos anos, os técnicos do órgão federal sugeriram à Prefeitura que desapropriasse o imóvel para que fossem feitas as restaurações.
A questão foi parar na Justiça, e se arrastou por quatro anos. Nesse meio tempo, a casa foi restaurada. Até que, em julho de 2007, o antigo morador desocupou o imóvel.
A cidade que acolheu o general
Santana do Livramento, na fronteira-oeste do Estado, a 500 quilômetros da Capital, foi a cidade que David Canabarro escolheu para viver a partir dos 32 anos de idade, aproximadamente, depois de servir como tenente nas forças do coronel Bento Gonçalves, na Campanha de 1828, que culminou com a independência do Uruguai.
Foi morar com o tio Antônio Ferreira Canabarro na estância São Gregório, em Livramento. Ali começou a criar gado. E foi no interior desse município, na fazenda do capitão Antônio Mendes de Oliveira, que o general morreu, em 12 de abril de 1867, aos 70 anos, vítima de tétano, sendo sepultado ao lado dos irmãos João e Silvério. Foi o tio Antônio quem o inspirou a mudar o sobrenome para Canabarro.
A permanência do líder farrapo no município, somada ao fato de ali terem sido criados dezenas de parentes do general, explicam em parte o carinho especial que o povo santanense dedica a Canabarro. Acredita-se que todos os parentes que vivem hoje em Livramento descendam de Maria Angélica, a filha mais velha de Canabarro. Jurema Fernandes Caggiani, viúva do jornalista Ivo Caggiani, Maria Leda Fernandes Rodrigues e João Fernandes são alguns dos bisnetos de Maria Angélica, que casou com 14 anos e teve 14 filhos.
Militar aos 15 anos
Canabarro, um dos nomes mais expressivos da Revolução Farroupilha, nasceu David José Martins, no dia 22 de agosto de 1796, na localidade de Pinheiros, município de Taquari, distante 94 quilômetros da Capital. Era filho do porto-alegrense José Martins Coelho e da catarinense Mariana Inácia de Jesus, neto pelo lado paterno de José Martins Faleiros e Jacinta Rosa, naturais da Ilha Terceira, e pelo lado materno, de Manuel Teodósio Ferreira e Perpétua de Jesus.
Iniciou a carreira militar na campanha de Dom Diogo, em 1811, aos 15 anos. A partir daí, lutou em todas as guerras das quais participou o governo imperial brasileiro. Ingressou na Revolução Farroupilha em 1836. Comandou a fundação da República Juliana, em 1839, após a tomada de Laguna, em Santa Catarina. Teve apoio decisivo do revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi.
Em junho de 1843, assumiu o comando-em-chefe das forças farroupilhas, tendo recusado apreender a espada de Bento Gonçalves, afirmando que somente o próprio general poderia guardá-la. ou a negociar a anistia diretamente com o general Luis Alves de Lima e Silva, então Barão de Caxias, a serviço do Império.
Ficou na história sua resposta a um convite do general argentino Juan Manuel de Rosas para que reunissem as forças contra o Império do Brasil: “O primeiro de vossos soldados que transp a fronteira fornecerá o sangue com o qual emos a paz com os imperiais”. Após a anistia, participou das Campanhas contra Oribe e Rosas e da Guerra do Paraguai.
Houve traição?
O jornalista Ivo Caggiani sempre discordou da versão de que Canabarro tivesse traído os lanceiros negros para acertar a paz com Caxias. Em seu livro David Canabarro, de Tenente a General, diz que a grande preocupação de Caxias era justamente Canabarro, a quem nunca conseguira vencer. “Caxias se surpreendeu com a batalha de Porongos, quando escreveu ao ministro da Guerra, Jerônimo Coelho, afirmando que, sem dúvida, é a primeira vez que Canabarro é surpreendido, o que até agora parecia impossível por sua contínua vigilância”.
O historiador Sérgio da Costa Franco diz que o assunto não está resolvido: “Não existem provas definitivas da traição”, sustenta.
Já o professor Moacyr Flores não têm dúvidas da traição do general. Entre os vários indícios, ele destaca que horas antes do massacre, uma patrulha farroupilha liderada pelo major Polvadeira foi atacada por soldados do coronel Francisco Pedro de Abreu, mais conhecido por Chico Pedro ou por Moringue. Os sobreviventes retornaram e foram relatar a Canabarro sobre o ocorrido. Mas o general teria desdenhado: “Pra que lado sopra o vento? Esse Moringue só com o cheiro da minha catinga já vai fugir”. Diz-se que estava na companhia de sua amante, a “papagaia”, mulher do médico da tropa, José Duarte.
O combate de Porongos aconteceu na madrugada de 14 de novembro de 1844 no Cerro de Porongos, município de Pinheiro Machado, distante 370 quilômetros de Porto Alegre, na região Sul do Estado. Cerca de cem soldados negros a serviço dos Farrapos foram mortos por uma coluna imperial sob as ordens do coronel Chico Pedro.
Flores diz que estavam em Porongos em torno de 400 farrapos, divididos em três acampamentos: dos índios, dos brancos e dos negros, este sob as ordens do capitão Teixeira Nunes, o gavião.
Tempo de guerra, mentira como terra
A controvérsia : Canabarro mandou desarmar os negros porque temia uma revolta interna ou porque havia combinado com o Império o extermínio desses lanceiros? O certo é que foram massacrados. Os que sobreviveram foram enviados para trabalhar na fazenda Santa Cruz, do imperador, no Rio de Janeiro.
O problema : as tratativas de paz com o Barão de Caxias, comandante das forças imperiais, não envolvia a libertação dos escravos negros. Só que essa era uma promessa feita pela República Rio-grandense aos que lutassem ao lado dos farrapos. O que fazer então com esses soldados ? O clima certamente era tenso entre os negros. Os generais Netto e Bento Gonçalves teriam se retirado das negociações por não abrirem mão da liberdade dos escravos guerreiros. Daí teria surgido, então, a armação para liquidar com o problema. Estariam envolvidos na trama Canabarro, Manuel Lucas de Oliveira, Moringue e Caxias.
A prova: um ofício de Caxias endereçado a Moringue com instruções para atacar o acampamento. Um dos trechos dizia o seguinte: “Não receie da infantaria inimiga, pois ela há de receber ordem de um Ministro e do seu General-em-chefe para entregar o cartuchame sobre [sic] pretexto de desconfiança dela. Se Canabarro ou Lucas, que são os únicos que sabem de tudo, forem prisioneiros, deve dar-lhes escapula de maneira que ninguém possa nem levemente desconfiar, nem mesmo os outros que eles pedem que não sejam presos, pois V. Sá. bem deve conhecer a gravidade deste secreto negócio que nos levará em poucos dias ao fim da revolta desta Província…”.
A maioria dos historiadores, no entanto, considerou o documento uma falsificação de Moringue. O jornalista Alfredo Ferreira Rodrigues disse que a intenção do coronel era desmoralizar Canabarro diante de seus soldados. Tempo de guerra, mentira como terra.
(*) Com reportagem publicada originalmente no jornal Extra Classe, em março deste ano.

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livro-Lanceiros-NegrosAutores: Geraldo Hasse e Guilherme Kolling
Em segunda edição, revisada e ampliada, o livro-reportagem investiga o mito da participação dos escravos na Revolução Farroupilha (1835-1845) e descreve as atuais articulações do movimento negro para resgatar a importância do papel dos negros na História.
2a ed., 2006, 144 pág., 14 x 21 cm, 220 gr
ISBN: 85-87270-21-4
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