Nova onda em Capão e adjacências 2hq32

Foto: Tao Hasse (Geraldo Hasse) A classe média alta fecha-se em condomínios murados no litoral norte. Quem trafega pela Estrada do Mar na região de Capão da Canoa e Xangri-La, encontra na paisagem notórios sinais de identificação ideológica com ricos balneários custeados por dólares (nos EUA) e petrodólares (Abu Dhabi). São condomínios murados com casas prontas ou em construção no estilo de Jurerê Internacional (norte de Florianópolis), que buscou inspiração em Beverly Hills (California) e Miami (Florida). São mansões sem muros nem grades nas quais é moda, quase regra, o paisagismo com palmáceas. Quem não encontra tamareira, planta butiazeiro nativo. Quem não tem para o butiá, vai de coqueiro gerivá. O culto à flora exótica é atestado pelo plantio sistemático do pinus norte-americano na restinga e até no meio das dunas. O pinus substituiu as casuarinas australianas, usadas antigamente na arborização urbana. Apenas em Capão da Canoa e Xangri-Lá, balneários que se situam no miolo mais concorrido do litoral norte do Rio Grande do Sul, existem 25 condomínios fechados. Alguns se situam na beira do mar, mas a maioria fica em áreas de restinga  ou junto a lagoas de pequeno ou médio porte. Em Tramandaí há um condomínio gigantesco junto à Lagoa da Custódia cujo diferencial é uma rica mata nativa. Foto: Tao Hasse Em nenhum desses empreendimentos os terrenos custam menos de R$ 80 mil. No Enseada de Xangri-Lá, dois lotes totalizando 1150 metros quadrados estão em oferta por R$ 750 mil. As casas, com um padrão médio de quatro quartos, são oferecidas por valores de R$ 800 mil a R$ 2,5 milhões. Em todos os condomínios há portões com guardas armados, piscinas, sauna, canchas de tênis e outras novidades, muitas delas anunciadas em jargão originário da Flórida. Yes, aqui churrasqueira também é conhecida por gourmeteira. E mais, os condôminos podem desfrutar de service pay per use, jogar paddle, dispor de lan house com garage band, além de contar com espaço-kid junto ao play ground. Claro que todos têm fitness center et le scambeau. Um dos condomínios oferece um bosque de seis hectares onde existe um caminhódromo de dois mil metros. Outro tem um campo de golfe. Dois ou três têm marinas. Há um clima de Abu Dhabi por ali. Em Capão da Canoa, junto a um dos principais condomínios construídos nos últimos anos, desenvolveu-se um ajuntamento de moradias populares no lado continental da Estrada do Mar. Essa rodovia, construída em 1989/90 sem licenciamento ambiental, foi o estopim da devastação da restinga do litoral norte do Rio Grande do Sul. Depois de andar por ali em maio de 2006 com alunos da Biologia da UFRGS, o professor Paulo Brack encaminhou uma carta-denúncia ao Ministério Público Estadual. Em quatro páginas ele relatou diversas infrações ambientais como o arrancamento de figueiras (árvore imune ao corte por lei estadual de 1992), a construção de aterros e o desmanche da paisagem. Brack não é o único biólogo preocupado com a destruição da biodiversidade nos raros ecossistemas da costa Sul. Há anos o biólogo Marcelo Duarte Freire, especialista em anfíbios, procura vestígios do sapo flamenguinho (Melanophryniscus dorsalis), cujo apelido vem de suas listras rubro-negras. O pequeno sapo tem apenas dois centímetros de comprimento e é considerado ameaçado de extinção desde 1933, quando foi descrito por Mertens, que o encontrou no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. Atualmente só se vê o flamenguinho em fotos de compêndios de biologia. Junto com outras espécies animais e vegetais, o sapinho rubro-negro é vítima da ocupação indiscriminada do litoral sulino. Outro alvo da preocupação dos biólogos é o tuco-tuco, que vive nas dunas, mas não há um levantamento sistemático dos danos ambientais praticados pela população humana no litoral. Lenta nas primeiras décadas do século XX, a corrida imobiliária para as praias intensificou-se com a abertura de estradas, especialmente a BR-101, depois da II Guerra Mundial. Se antes o maior sonho era ter uma casa de frente para o mar – em consequência disso,  praias como Capão da Canoa estão pontilhadas de edifícios –, agora o processo de ocupação se desloca para áreas interiores de campos, banhados, dunas e lagoas, até há pouco tempo desprezadas até por seus proprietários originais, herdeiros de sesmarias coloniais. Num olhar de fora, é difícil compreender por que tanta gente investe na mudança da paisagem e na construção de novas formas de habitação, mas é evidente a preocupação dos construtores em oferecer conforto, segurança e privacidade aos novos proprietários dessas áreas emergentes e praticamente inabitadas. Aparentemente, a maioria não foi construída para morar, mas como investimento. 6r5317

Terreno da Fase: invasões e reservas ocupam 50% 133y6p

O presidente da FASE, Irani Bernardes de Souza forneceu ao jornal JÁ alguns números sobre a gleba que pertence à fundação e que o governo do Estado pretende permutar com empresas privadas para poder construir nove unidades pequenas para descentralizar os serviços com menores infratores.
O terreno, que se estende por mais de um quilômetro ao longo da avenida Padre Cacique, sobe pela encosta e vai até o outro lado do morro, tem 73,5 hectares de área.
Esse número exclui o lote de meio hectares que foi vendido para a TV Guaíba em 1976 (sem licitação!).
As invasões, que também se intensificaram a partir dessa época, hoje ocupam 17,9% da área – são quatro núcleos principais e uma extensão da Vila Cruzeiro que avançou por uma borda do terreno.
Em 2008, já com o intento de permutar ou vender a área, o governo fez o primeiro levantamento dos moradores das partes invadidas.
Quatro comissões percorreram as vilas para cadastrar os moradores. Enfrentaram a resistência das associações de moradores, sem falar dos redutos dominados pela criminalidade. “Foram recebidas a tiro em alguns lugares”, conta o presidente.
Por essas dificuldades, ele acredita que o levantamento subestimou o número de moradores nas áreas invadidas. Foram contados 760, mas Souza estima que devem ser mais de 1.500 famílias. “Multiplique por cinco/seis em cada família, dá oito nove mil pessoas”.
Além das invasões, tem as áreas de preservação ambiental. Eles não estavam sequer identificadas ate 2007, quando a Fundação Zoobotânica fez o primeiro inventário das áreas, mas elas não estão medidas.
Em todo o caso, para efeitos de estimativa foram considerados 35 hectares como sendo área livre e essa foi a dimensão considerada no cálculo que estimou o valor do terreno em R$ 76 milhões. (continua)

TERRENO DA FASE: DUAS SEMANAS PARA DECIDIR 2m662b

Dia seis de junho. É a data limite que a Assembléia Legislativa tem para decidir sobre o terreno da Fundação de Atendimento Sócio Educativo (Fase), na avenida Padre Cacique.
O projeto de lei 388, que trata do assunto, tramita no legislativo estadual desde dezembro do ano ado. Já teve parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça, mas não foi adiante.
Alvo de muitas críticas, foi retirado e retificado pelo executivo. Retornou à Assembléia no dia 5 de maio com alguns reparos secundários e com pedido de urgência, logo aprovado, o que significa 30 dias para ir à votação em plenário.
“As mudanças foram decididas em reuniões com todas as partes interessadas e as dúvidas sobre o projeto foram esclarecidas, vamos aprová-lo”, diz o deputado Adilson Troca, líder do PSDB.
A principal mudança, na verdade, é a inclusão de um “Comitê de Acompanhamento Externo”, para o qual “serão convidados” representantes do Tribunal de Justiça, Ministério Público Estadual, Assembléia Legislativa, Procuradoria-Geral do Estado, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente.
“As alterações são insuficientes, o projeto continua inexplicável. Não há como evitar a suspeita de há algo errado com esse negócio”, diz o vice-líder petista, Raul Pont, um dos mais severos críticos da proposta.
O projeto, em sua essência, é uma autorização ao governo do Estado para vender ou permutar uma área pública de aproximadamente 74 hectares ( o dobro do Parque da Redenção), num dos pontos mais valorizados de Porto Alegre – para viabilizar a implantação de nove unidades descentralizadas de atendimento a menores infratores.
Não há resistência, nem do mais ardente oposicionista, à proposta de descentralização dos serviços da FASE, até porque essa é a orientação do Sistema Nacional de Atendimento Sócio Educativo – unidades com no máximo 90 internos.
As críticas ao projeto se prendem à falta de clareza, tanto no que se refere ao terreno a ser alienado quanto das nove unidades a serem construídas em troca da área. “Não há sequer uma avaliação da área. Como é que vai se fazer uma licitação sem ter um preço mínimo?”, indaga Pont.
A avaliação existente (que não consta do projeto) foi feita pela Telear, uma empresa privada, que estimou em R$ 76 milhões o valor do terreno.
Raul Pont questiona essa avaliação: “Naquela mesma região, o antigo estádio do Inter, que tem pouco mais de 2 hectares, está avaliado em R$ 23 milhões. O terreno da Corlac, uma área pública, foi alienado por R$ 13 milhões e tem menos de um hectare. Por que o hectare nesse terreno da Fase, numa área mais nobre, vale tão menos?”
O deputado petista reconhece que, com a folgada maioria formada pelos partidos que o apoiam, o governo estadual tem condições de aprovar o projeto. “Nós vamos continuar denunciando e, em caso de aprovação, vamos recorrer à Justiça”.
Analise comparativa das duas versões do projeto
A primeira versão do projeto de lei 388 foi encaminhada a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul em 14 de dezembro de 2009.
Seu conteúdo só chegou ao público no início de março deste ano, quando começaram a circular nas redes da Internet artigos e comentários, levantando suspeitas sobre as verdadeiras intenções do projeto.
Esse movimento de opinião pública repercutiu na Assembléia, onde a Comissão de Constituição e Justiça estava para votar o parecer favorável do relator, Iradir Petroski, do PTB, hoje ministro do Tribunal de Contas do Estado. A votação na CCJ foi duas vezes adiada e, em seguida o governo retirou o projeto.
No dia 5 de maio encaminhou uma “mensagem retificativa” em que o essencial – a autorização para vender ou permutar o terreno da Fase- permanece, mas alguns pontos foram acrescentados, reconhecendo a pertinência das críticas.
A assessoria técnica do PT fez um estudo comparativo dos dois textos, para assessorar a bancada. Ele esclarece bem o que mudou no projeto:
Projeto de Lei nº 388/09 –
Primeira versão:
Art. 1º Fica a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo – FASE autorizada a alienar ou a permutar, por área construída, por meio de procedimento licitatório, o imóvel localizado no Município de Porto Alegre, …
Segunda versão
Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a permutar ou alienar, por meio de procedimento licitatório, o imóvel descrito abaixo:…
(Comentário: Projeto original autorizava a FASE, agora autoriza o Estado. A ementa ficou original, autorizando a Fase. Inverte a ordem das palavras “alienar” e “permutar”, mostrando que só a alienação é por licitação. Retira a possibilidade de permuta por área construída, então, seria por outro imóvel?
Primeira versão:
Art. 1º (descrição da área) (…); este imóvel é composto dos prédios de nº 1600 e 1554 e mais benfeitorias, e do respectivo terreno com a área total de 10.644mq50 e ….
Segunda Versão:
Art. 1º (descrição da área) (…) Existindo no imóvel os prédios de nº 1600, 1554 e mais benfeitorias, excluída a área pertencente à Televisão Guaíba Limitada a seguir descrita: “O terreno com a área total de 10.644mq50 e ….
( Comentário: A redação original incluía área já vendida para a TV Guaíba em 1976. Agora foi corrigida).
Primeira versão:
§ 1o. – Inexistente
Segunda versão
§ 1º – Deverá ser observada a área de servidão descrita na matrícula no 5.935, no 2o Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de Porto Alegre, Livro no 2 Registro Geral.
(Comentário: A servidão de agem da TV Guaíba pelo terreno da Fase (Febem) estava registrada na matrícula do imóvel, mas não era ressalvada no projeto).

Primeira versão:
§ 2o. Inexistente
Segunda versão:
§ 2º – Fica garantido às comunidades estabelecidas no local, o direito social à moradia, preservando-se as disposições da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001 – Estatuto da Cidade.
(Comentário: Apenas menciona o direito à moradia nos termos do Estatuto das Cidades, mas mantém a inclusão da área das Vilas Gaúcha, União Santa Tereza, Figueira e Ecológica na venda).
Primeira versão:
Art. 2o. – Inexistente
Segunda versão:
Art. 2º – Fica resguardado, por ocasião da permuta ou alienação a preservação dos espaços de preservação ambiental e histórica, se houver, respeitada a legislação pertinente.
(Comentário: Menciona as áreas de preservação ambiental e histórica, se houver, mas não coloca nenhuma obrigação do Poder Público.)

Primeira versão:
Art. 2º – Os recursos obtidos com a alienação ou permuta do imóvel descrito no artigo anterior se destinam à construção de unidades descentralizadas para a execução das medidas sócio-educativas de internação, conforme o disposto na Lei Federal no 8.069, de 13 de julho de 1.990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Segunda versão: (o artigo 2o. virou 3o.)
Art. 3º – Os recursos obtidos mediante a autorização prevista no artigo 1º desta Lei serão destinados exclusivamente à construção de unidades descentralizadas em Porto Alegre, Região Metropolitana, Osório e Santa Cruz do Sul, para a execução das medidas sócio-educativas de internação, num prazo de máximo de cinco anos, respeitadas as disposições da Lei Federal no 8.069, de 13 de julho de 1.990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
(Comentário: Acrescenta genericamente a construção das casas em Porto Alegre, região Metropolitana Osório e Santa Cruz do Sul e o prazo de cinco anos para as construções. Permanece sem especificar o número de casas e sem explicar as condições exigidas para construção.Coloca a aplicação exclusiva, mas não cria um fundo fora do Caixa Único.)
Primeira versão:
§ 1o. – Inexistente
Segunda versão:
§ 1º – Os recursos financeiros porventura excedentes resultantes do processo licitatório de que trata esta Lei, deverão ser aplicados na melhoria das condições de trabalho da FASE e no atendimento socioeducativo.
(Comentário: Reconhece que pode haver recursos excedentes, mas coloca em despesas correntes, o que é vedado pela LRF: “Art. 44. É vedada a aplicação da receita de capital derivada da alienação de bens e direitos que integram o patrimônio público para o financiamento de despesa corrente, salvo se destinada por lei aos regimes de previdência social, geral e próprio dos servidores públicos.”)

Primeira versão:
§ 2o. – Inexistente
Segunda versão:
§ 2º – A aplicação do disposto nesta Lei, inclusive a aplicação dos recursos, será acompanhada por Comitê de Acompanhamento Externo, para o qual serão convidados representantes dos seguintes órgãos:
a) Tribunal de Justiça;
b) Ministério Público Estadual;
c) Assembléia Legislativa;
d) Procuradoria-Geral do Estado;
e) Defensoria Pública;
f) Ordem dos Advogados do Brasil Seção Rio Grande do Sul;
g) Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente – CEDICA.
(Comentário: Acrescenta esse comitê de acompanhamento que não tem funções definidas. Não há representação dos trabalhadores.)
Tisiane Siqueira – Assessoria Técnica – em 06/05/2010