Gravação inédita mundial de obra de Beethoven, no violão de Daniel Wolff 62311m
Ilustração de Rodrigo Rosa. Desig gráfico: Flávio Wild.
Higino Barros
A ilustração de gravação da obra de Ludwig van Beethoven pelo violinista gaúcho Daniel Wolff já dá uma pista da intimidade do músico com o compositor alemão. Daniel toca seu instrumento, Ludwig van anota e os dois trocam informações musicais, saboreando um vinho tinto. O cenário é uma sala despojada com tapetes no chão, piano com partitura aberta e parede pintada em tom azul com enfeites iguais brancos.
Pois agora o classificado de “magnífico” Romance op. 40, de Ludwig van Beethoven, tem sua primeira gravação mundial, com arranjo do solista Daniel Wolff, acompanhado pela Orquestra do Instituto de Artes da UFRGS, com regência de Carlos Völker-Fecher.
Ele será disponibilizado nas plataformas de streaming no dia do evento.
O projeto foi idealizado e gravado durante a pandemia de Covid-19, “demonstrando que a força colaborativa dos artistas pode render belos frutos mesmo em condições adversas”, como ressalta o material de divulgação do trabalho.
Abaixo Daniel Wolff fala de seu encontro com a obra de Beethoven:
Pergunta: Beethoven em violão. Como começou isso para você?
Daniel Wolff: Eu, desde meus primórdios com o violão, me interessei em adaptar obras originalmente escritas para outros instrumentos, para que eu também pudesse tocá-las. Comecei adaptando obras mais fáceis de Bach e fui, pouco a pouco, evoluindo, aprendendo mais sobre como fazer isso. Anos mais tarde, este seria o tema de minha tese de doutorado.
Eu tinha arranjado, no final da década de 90, uma sonata de Beethoven para dois violões, que gravei em um disco lançado na Alemanha, em duo com Daniel Göritz:
Esse arranjo foi publicado pela editora alemã Margaux (https://www.amazon.co.uk/Sonata-Op31-No-2-Margaux/dp/3733304470). Contente com a boa receptividade e críticas favoráveis que esse arranjo obteve, comecei a fazer outros, durante quase 20 anos, que foram os que gravei em 2020 no disco Beethoven for Guitar.
Foto: Manuel Pose Varela / CCK/ Divulgação
Pergunta: Quais são as dificuldades de execução e “facilidades”?
DW: Beethoven explorava muito bem as possibilidades idiomáticas de cada instrumento. A dificuldade é encontrar a melhor forma de reproduzir isto no violão, ou seja, adaptar para a técnica violonística uma escrita pensada para outro instrumento, sem descaracterizar o efeito sonoro original.
Pergunta: É comum, raro ou existe já Beethoven em violão?
DW: Há vários arranjos da música dele para violão, a maioria dos quais soa como uma caricatura da obra original. Mas há também alguns muito bem escritos, inclusive feitos por compositores violonistas do século XIX, que viveram em um período próximo ao de Beethoven.
Pergunta: Ele compôs para violão?
DW: Vou colar aqui um trecho de uma comunicação de pesquisa minha, publicada nos anais do congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Música (ANPPOM) de 2019, que responde a tua pergunta:
Beethoven nunca compôs para violão. Contudo, ele certamente estava familiarizado com o instrumento, pois conviveu com compositores violonistas, como Mauro Giuliani e Anton Diabelli. Um relato da soprano Antonie Adamberger (1790-1867), sobre fato ocorrido durante os ensaios de Egmont, em 1810, nos permite supor que o compositor chegou a fazer alusão à sonoridade do violão em ao menos uma de suas obras:
“Um dos senhores de mais idade expressou a opinião de que as canções que o mestre [Beethoven] escrevera para orquestra, buscando determinados efeitos, deveria ser acompanhada ao violão. Então ele [Beethoven] balançou a cabeça de maneira cômica e, com olhos flamejantes, disse, ‘Ele sabe!’” (FORBES, 1967, 485, tradução minha).Outra possível alusão ao violão ocorre na canção An die Geliebte, WoO 140, escrita em 1811-12 provavelmente para Antonie Brentano (cujo prenome, coincidentemente, é o mesmo da cantora de Egmont). Brentano era uma consumada violonista e, talvez por esta razão, a canção foi publicada “com acompanhamento de piano ou guitarra [i.e., violão]”, caso único na produção de canções de Beethoven (SOLOMON, 1987, 238).