Stiglitz: é urgente repensar a dívida dos países em desenvolvimento 615g4u

Em seu artigo “A dívida está esmagando o mundo em desenvolvimento” (Debt is crushing the developing world), publicado esta semana no  Financial Times, Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia, escreve que há uma necessidade urgente de repensar as estruturas financeiras que estão atingindo bilhões de pessoas. Ex-economista-chefe do Banco Mundial, ele tem sido uma voz crítica e influente no debate sobre a dívida dos países em desenvolvimento 2z2g54

Stiglitz argumenta que muitos países em desenvolvimento estão presos a níveis de dívida pública tão elevados que comprometem a sua capacidade de investir em áreas fundamentais como saúde, educação, infraestrutura e combate à pobreza. Grande parte da receita desses países é usada apenas para pagar juros e amortizações, o que bloqueia o crescimento econômico de longo prazo.

Retrato preciso de um governo Lula de mãos atadas por pressão do sistema financeiro e uma base de apoio fisiológica no Congresso. O Tesouro Nacional projeta que, até o final de 2025, a dívida pública federal poderá alcançar entre R$ 8,1 trilhões e R$ 8,5 trilhões, conforme as diretrizes do Plano Anual de Financiamento (PAF).

Quanto ao pagamento de juros da dívida, as projeções indicam que, em 2025, o Brasil poderá desembolsar mais de R$ 1 trilhão. Esse valor representa aproximadamente 7,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, refletindo o impacto das altas taxas de juros e do aumento do estoque da dívida.

Credores favorecidos

O economista estadunidense critica o sistema financeiro internacional por estar desenhado de forma a favorecer os credores – sobretudo os países ricos e instituições como o FMI e o Banco Mundial – em detrimento dos devedores. Ele sublinha a ausência de mecanismos eficazes e justos de reestruturação da dívida, comparando com o que acontece, por exemplo, com empresas em falência (que têm o a processos formais e ordenados de reestruturação).

A crescente importância dos bancos, com o objetivo de maximizar os seus lucros, pode tornar-se uma ameaça global, com consequências negativas, conforme Stiglitz.  No Brasil tem um bom exemplo: as operações compromissadas, que significam remuneração da sobra de caixa dos bancos. Elas funcionam como títulos vendidos com recompra combinada, remunerados pela taxa básica de juros, a Selic.

O gasto com tais operações, que correspondem à remuneração de um depósito voluntário feito por bancos junto ao Banco Central, custou cerca de R$ 1 trilhão  em 10 anos (2009 a 2018), conforme números do Banco Central. E essa operação é incluída no cômputo da dívida pública. Quanto mais dessas operações o BC realiza, mais a dívida pública cresce.

Estimativas Anuais de Custo das Operações Compromissadas (2019–2024)

Ano Volume Médio Diário (R$ trilhões) Selic Média Anual (%) Custo Estimado Anual (R$ bilhões)
2019 1,1 6,0 66,0
2020 1,4 2,0 28,0
2021 1,5 4,0 60,0
2022 1,3 9,0 117,0
2023 3,0 13,75 412,5
2024 3,3 11,0 396,0

 

Segundo dados recentes do Relatório Mensal da Dívida Pública Federal (DPF) de março de 2025, os principais detentores da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi) foram:  Instituições Financeira, 30,47% do total; Fundos de Previdência: 24,12%; Fundos de Investimento: 21,5% e não-residentes (investidores estrangeiros): 9,62%. Esses percentuais refletem quem mais ganha com a compra dos títulos da dívida pública interna entre diferentes grupos de investidores. 

Enxerto misterioso

Assunto proibido pela mídia corporativa sobre a dívida pública é a denúncia que consta no livro “O Complô – como o sistema financeiro e seus agentes políticos sequestraram a economia brasileira” (2017), do deputado federal constituinte, eleito em 1986 pelo MDB do Rio Grande do Sul, Hermes Zaneti.

Ele fez uma aprofundada pesquisa unindo seu material como constituinte, matérias publicadas em jornais e outras investigações sobre as origens de determinados itens que teriam sido enxertados misteriosamente na Constituição de 1988. Um deles é a alínea “b” do inciso II do parágrafo 3 do artigo 166. O parágrafo 3º ressalva que as emendas ao projeto de lei do orçamento anual ou aos projetos que o modifiquem somente podem ser aprovadas caso:

II – Indiquem os recursos necessários, itidos apenas os provenientes de anulação de despesa, excluídas as que incidem sobre:

  1. a) Dotações para pessoal e seus encargos
  2. b) Serviço da dívida
  3. c) Transferências tributárias constitucionais para Estados, Municípios e Distrito Federal

A alínea b significa que tem que pagar os juros da dívida e não pode bufar. Não interessa se tem brasileiro ando fome, se nossas escolas públicas estão um lixo, não tem como dar um salário digno aos professores ou se falta dinheiro para infraestrutura. Nesse dinheiro não pode mexer.