Athanásio Orth l4a2n

Nasceu em Tapera, RS, onde realizou seus estudos básicos. Na convivência do Seminário da Cidade de Viamão, conheceu e adotou a Teologia da Libertação, forte movimento religioso dos anos 1960. Por suas convicções democráticas, ou a integrar grupos secretos de resistência ao regime autoritário vigente no Brasil, sendo perseguido, sequestrado, torturado e condenado. Na prisão, este filósofo e professor escreveu e publicou seu livro de poemas “A companheira e Duas Três Coisas Vistas da Ilha das Pedras”, vindo a falecer em acidente rodoviário em 1978. Na região de origem, dá nome a escolas, praças e bibliotecas. Encantamento Nos olhos do teu olhar enxergo minhas feições impregnadas de você. Manso e suavemente triste – o olhar. Estes olhos ocupados na descoberta de você, ainda se multiplicarão em pesquisa e iração do ser e do acontecer. Depois nós dois miramos o longe: construções e chaminés, a urbe estrangulada vetada a meus pés. Expectativa: fundir ilha e cais da estiva dirigir o movimento… Lento, porém contramão, domingar uma barca carregada de rosas. Perdela jamas ternura, y cosas que vivan su muerte. Entonces está prohibido matar/matar a un hombre nuevo.   Domingo, se não chover verei a ave de olhos inesgotáveis pousar seu corpo no meu. Vezes incontáveis configurei as partes e o conjunto. A boca ávidos trançamos em beijos. Quando recordo, a noite se faz imensa com o rio me invadindo de nostalgia. Então ouço companheiros em sonhos de lamentação. Domingo, salvo imprevisto, enlaçarei em lábios vertentes meu recado mudo e concreto com os cinco sentidos sentirei a presença lasciva da primavera ao entrelaçarmos os braços no toque libente de pólos que se atraem. Tudo quieto por aqui só a melancolia da paciência ao contemplar os clarões que da fábrica se espalham na água e umedecem meus olhos de tristeza. Domingo se você quiser seremos dois e um e mais como somos muitos agora.   A balada pungente da ausente trinca e tranca o pranto no tristonho-risonho dos olhos. No sinistro da cela, ao pé da cama., Neruda sempre redito (puedo escribir los versos más tristes esa noche) me desespera em intenções de antes. Tenho pensado, careço dizer, um réquiem por Chael que dure exato o silêncio e um baião baiano, tributo a cantigar em novembro quatro de cada ano. Imaginei monumentos estilizados aos tombados no risco de esculpir a manhã plena de dia. Compus em madeira fragmentos à militante, mas Vera Lígia ainda não os leu e já se extraviaram e são outros e são desejos de talvez virem a ser inventos de mais encanto, porquanto o envolvimento em novas malhas da formosura cresce o labor.   De Longe e de Perto Chispas se levantam do levante de Ática e atiçam ódio contra a Amérika. Da contextura brutal do presídio brota uma alvorada de ternura e dureza. Sob os cassetetes se volatizam sonhos remotos, mas dos mortos sangram gritos de pantera. Sovados na teimosia de negar as grades os punhos deflagram a ousadia de ser. A coragem de carecer “o riso de um amigo e a voz macia de uma mulher” e de tombar sob escombros de gás madruga grávida de primavera. Corpo crivado à bala, Sam Melville se dissipa em fulgência de saber: “Há sutis surpresas à minha frente mas eu me sinto seguro e forte”.   Nas palavras suprimidas A alegria de debate com o ódio. Dos quadrantes da terra informam: requinto central do capital e camaradas torturados metralhados na nota oficial segundo voz de prisão. Sem mediação a condição inumana se mistura com fome e fama de bem-aventuranças e proteínas e de gingas e danças com meninas, luzes roxas sobre as coxas pó e cisco na tigela. Ninguém vela a criança achada morta na favela. A burguesia exporta cresce a renda bruta, cada vez mais enxuta a marmita do servente.   77 vezes 7 vezes Contra grandes estandartes setenta e sete vezes sete vezes se desejou enfarte dos patrões… benedictus pecata mundi Contra as chaves da opressão setenta e sete vezes sete vezes danados clamamos antes de trancados… miserere fructis ventri Contra os horizontes abertos setenta e sete vezes sete vezes usaram em vão ferrolhos e tramelas… ora amem hora morti nostri pérfidos e fétidos eles vão apodrecendo em feliz ilusão.   Do continente sul Una noche envejece El destino de la América: Huevos de arañas Pájaros muertos E insetos tontos Em la calle central. Las tripas llenas de hambre La toza llena de torpezas Aunque parezca mentira, Proezas de la misma hazaña, Contra las cuales se assoma La artimanha de fuziles Discursos y canciones miles. No panorama soturno O triste pindorama Que ficou para submundo, Com o auri-verde perdão Da pujança, que cansa os olhos Que sabem sobre as contradições. Esta é a véspera Pro proleta proletária   A fome fomenta a morte… A fome fomenta a morte mordendo mansamente a dor da vida desprovida. A dor dormida mais se rebela em cada nova ferida. nada será como antes: um dia a rebeldia eclodindo, aves de rapina alçando vôo derradeiro em mergulho fatal ao orgulho nas águas estagnadas de peixes podres emersos e escombros submersos carcomidos-fedidos idos, contra a granada arremessada o tiro repentino assassinando, contra a surpresa um quartel perdendo a defesa, ao estalido o sentinela esquecendo a ressaca babaca da própria sina… Mas a morte morde a fome fomenta a dorme até um dia a rebeldia.   A burguesia velejando A burguesia velejando à tarde mansa não se cansa de usufruirfluir líquido do lucro. Navios que entram lentos pelo canal já se agitaram contra outros ventos e as ondas que convulsionam contra as pedras voltam e se amainam no rio como os marinheiros se acostumam aos ares de muitos mares. Braços proletários cujo trabalho vai incorporado neste frete alaram-se aos que aqui sofrem algemas exercendo protesto noutras terras. Já aconteceu saudar-nos um navio de bandeira vermelha emitindo acentos sonoros. Já aconteceu em manhã de sol as gaivotas espantadas em bando lembrarem poetas de cantares cantados e sofridos em portos sem portas, em minas e cantinas.   Apesar de esbordoarem o rosto… Apesar de esbordoarem o rosto posto em algemas no pó da rua apesar de provar aos berros que o corpo é ótimo condutor de eletricidade apesar dos vergões no dorso e dos dentes que se esmigalham apesar da coronha na cabeça e a sanga de sangue entre os cabelos apesar de trancado entre paredes ferros e chaves ou cercado de águas e guardas apesar da dor que mais dói, o pior de tudo: pôr mudo a quem cabe pontear.   Braço erguido em punho… Braço erguido em punho como se rompesse grilhões a alegria nos contagia, ele deslancha rumo ao nascente. Pega a voga companheiro, Segue antes. Já viste que o cativeiro não resiste à chispa em riste madrugando Conosco no bojo da liberdade. Mais que nunca sorve agora a bebida amarga dos operários, prova a taça até o fundo e do gosto a suor faze o nosso momento. Pelo descampado adestra a mira e o dedo no gatilho, guarda a pólvora e o sarilho para a hora propícia. Lembra de empunhar malhos Para derrubar os deuses. Não coleciones cântaros cristalizados cultiva as promessas que vicejam e que se vejam no acontecer diário. Prevê as provisões de volta. E considera que o amor aviva a visão das coisas. (para o Calino)   Talhado para as coisas da vida Talhado para as coisas da vida zurziram tua carne barbaramente, mas teu corpo se esculpiu em bravo. Apodrecerá viva a boca que insultou de canalha a solidariedade e os algozes terão seu dilúvio misturados a excremento e lixo. Podemos ouvir George Jakson não entendendo tudo que Dylan diz, lixar o verniz de cada um, buscar dimensões não abraçadas, retomar as lições calhadas na lida. lançar a linha e aguardar o peixe, comer o pão dormido e não perder a firmeza, saber do acontecido conhecendo para onde indicam as luzes e percalços dos pioneiros da terra, não estamos num beco sem saída. Mas o reduto é de trevas E a prova palpável da luz Pode ser o ósculo dos camaradas Que compartilham a estrada. (num aniversário do Minhoca) 1s1e6d

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