Jeferson Miola Integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea) Os eventos que precederam a decisão do juiz do STF Marco Aurélio Mello de afastar Renan Calheiros da presidência do Senado podem ser produto de mera e incrível coincidência. Mas podem, também, ser fruto do encadeamento de eventos sucessivos, ocorridos em meticulosa e nada ocasional sequência. O episódio surpreende porque o autor desta drástica decisão, o juiz Marco Aurélio Mello, é um dos dois únicos juízes da atual composição da suprema corte com postura e estatura compatível com o cargo de juiz do STF. Ele é um liberal-democrata que se destaca pelo zelo do Estado de Direito e pela defesa da Lei e da Constituição. Uma explicação para a inusitada decisão do Marco Aurélio pode ser a pressão midiática. No domingo de véspera da decisão, a Globo reforçou artificialmente as ridículas manifestações que foram às ruas não para pedir a cabeça do golpista Temer e seu governo corrupto e entreguista, mas sim para derrubar Renan, porque ele ousou conter o contrabando da agenda fascista no projeto disfarçado de medidas contra a corrupção. O caso do Renan tem diferenças substanciais com o do Eduardo Cunha. Em maio deste ano, o sócio do Temer e do PSDB no golpe foi afastado da presidência da Câmara dos Deputados e também impedido de continuar exercendo o mandato parlamentar. O afastamento do Cunha foi decidido pelo Plenário do STF em sessão extraordinária, e não por decisão liminar e monocrática do juiz Teori Zavascki, relator do caso. A recordação do calendário de eventos que precederam a ordem para afastar Renan ajuda a entender que este grave episódio que eleva a pressão e a temperatura da crise política pode ser parte do perigoso jogo de poder tramado pelo sistema jurídico contra o Estado de Direito: – a presidente do STF, juíza Carmem Lúcia, colocou em votação na sessão de 03/11/2016 a ação judicial da Rede, que proíbe que autoridades que são réus no Supremo ocupem cargos que estão na linha de substituição da Presidência da República [presidentes da Câmara, do Senado e do STF]. O julgamento está inconcluso devido ao juiz Dias Toffoli que, inspirado no colega-guru Gilmar Mendes, pediu vistas ao processo; – a Câmara dos Deputados, no gozo pleno das prerrogativas legislativas, na sessão de 29 de novembro modifica o projeto de lei de combate à corrupção proposto pelo ministério público [disfarçado de iniciativa popular], removendo os abusos, arbitrariedades e ilegalidades que fariam o Código Penal brasileiro retroagir ao período da Inquisição; – em entrevista coletiva no dia 30/11, procuradores da Lava Jato, esta quintessência da moralidade pública – que, porém, são adeptos da prática corrupta de receber salários e regalias bem acima do teto constitucional – exorbitam das suas prerrogativas legais e funcionais e ameaçam abandonar as investigações de corrupção caso seus ideais fascistas não sejam integralmente convertidos em lei; – no mesmo 30 de novembro, Renan é traído por Aécio, PSDB, Jucá [o grande sócio do Temer], PP, PTB, PSB, PP, PMDB e outros senadores que, amedrontados com a reação e ameaças dos justiceiros na mídia, romperam o compromisso com o requerimento de urgência para a votação do projeto das medidas contra a corrupção aprovadas na Câmara; – Carmem Lúcia tirou da tumba o processo aberto contra Renan ainda em 2007 [sobre pensão paga por empreiteira à mulher com quem ele teve uma filha numa relação extraconjugal], e submeteu-o à votação do Plenário do STF em 01/12/2016. Por 8 votos a 3, Renan ou a ser réu. Criou-se, dessa maneira, o requisito para sua remoção da presidência do Senado, posto de onde ele resistiu ao avanço fascista de promotores, procuradores, policiais e juízes; – no mesmo dia 01/12, Renan promoveu debate no Senado sobre o projeto de lei que coíbe o abuso de autoridade de juízes, policiais, promotores e procuradores. No debate, o justiceiro Sérgio Moro viu suas teses e práticas totalitárias serem fragorosamente ridicularizadas e denunciadas por vários senadores, em especial Lindbergh Farias; – no domingo 04/12, por convocação da força-tarefa da Lava Jato e da Rede Globo, cerca de 120 mil zumbis verde-amarelos em todo o país protestaram contra Renan, mas a favor do Temer e do Moro e seus colegas intocáveis; – na manhã de 05/12, Carmem Lúcia faz um discurso enigmático, que antecipa os eventos que viriam a se suceder no dia. Numa provável alusão à guerra aberta contra o Legislativo para manter os abusos do MP e do Judiciário, ela declarou: “ou a democracia ou a guerra”; – às 11:16 horas, a Rede protocola o pedido de afastamento do Renan Calheiros da presidência do Senado. Às 15 horas deste interminável dia 05/12, Marco Aurélio Mello profere sua decisão liminar, e instala-se o caos jurídico e político no país. O objetivo principal foi alcançado – ficou completamente comprometida a votação do projeto contra o abuso de autoridade, que estava na pauta de votação do Senado deste dia 6/12. Renan Calheiros, como qualquer cidadão brasileiro que comete ilícitos, deve ser julgado, porém em estrita observância ao devido processo legal e ao Estado de Direito. Mirar as armas de um poder de Estado contra o chefe de outro poder de Estado com o objetivo de fortalecer determinado poder corporativo é, todavia, uma vertente para o fascismo. É inaceitável o ativismo político de segmentos do judiciário, ministério público e polícia federal, que carecem da legitimidade do sufrágio popular para atuarem na arena política. A atuação irresponsável de tais segmentos, que se auto-atribuem funções bíblicas e se consideram intocáveis, está convulsionando o país. Eles travam uma verdadeira guerra contra o Estado de Direito e contra a democracia para manter seus abusos e privilégios. Com o agravamento do colapso econômico provocado pelo governo golpista, a conflitividade social se somará à conturbação jurídica e política, e então o país será jogado no abismo. 4i5a6v
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EVU do Pontal do Estaleiro a no Conselho do Plano Diretor 696f2d
Naira Hofmeister
Foram necessários apenas quatro minutos da sessão dessa terça-feira, 8, para que o Conselho do Plano Diretor de Porto Alegre aprovasse o EVU do Parque do Pontal (antigo Pontal do Estaleiro), um dos mais polêmicos projetos da construção civil na Capital.
“Sanadas as minhas dúvidas, depois da apresentação dos empreendedores e da leitura do processo, avalio que o EVU tem condições de ser aprovado”, sentenciou o conselheiro André Seixas, da Região 8 de Planejamento (RP8), relator da matéria.
A maioria dos colegas de Seixas acompanhou seu voto: foram apenas uma abstenção e um voto contrário, da conselheira Lívia Piccinini, urbanista da Ufrgs e representante da entidade no colegiado. “É a mesma coisa que o Cais, esse espaço deveria ser um parque público. É um erro abrir uma via para automóveis nas margens do Guaíba. Além disso, aquela conexão viária entre a Diário de Notícias, Padre Cacique e Chuí deveria ser solucionada pelo empreendedor”, lamentou.
O conselheiro Paulo Jorge, da RP5, que havia anunciado na semana ada que pediria vistas ao processo, desistiu da iniciativa. “Meus delegados estão de acordo com o processo, então eu só posso abrir mão das vistas e aprovar o parecer”, explicou aos colegas.
A RP5 abrange os bairros Glória, Cruzeiro e Cristal, vizinhos ao empreendimento. Desde que o processo do Pontal chegou ao Conselho do Plano Diretor, foram organizadas duas reuniões públicas onde os empreendedores se apresentaram à comunidade e escutaram as demandas locais. “O projeto é muito grande, um pouco assusta os bairros, vai ter um impacto grande, mas os presentes foram favoráveis”, esclareceu.
O Pontal do Estaleiro já está na sua 14ª versão, segundo a arquiteta Clarice Debiagi. No formato recentemente apresentado, terá uma torre com hotel, escritórios e um complexo médico, shopping center e uma praça pública.
Conselheiro quer mudar voto favorável ao Cais
Ao JÁ, Paulo Jorge itiu que se pudesse votar considerando exclusivamente seu ponto de vista, teria rejeitado o projeto. “É errado colocar aqueles edifícios ali. Nem tem tanta gente para usar esses e os do Barrashopping”, justificou.
Jorge lastima o fato de que diversos recentes projetos tenham sido aprovados para a Orla do Guaíba sem considerar a ampliação do espaço público. Ele menciona as construções que serão feitas no terreno do Internacional e o próprio Cais Mauá, que foi votado na semana ada: “Aquilo ali devia ser um espaço para a comunidade, mas não vamos mais ter a visão do rio”, critica.
Questionado sobre as razões de ter votado favoravelmente ao projeto, apesar de discordar do conceito, Paulo Jorge se surpreendeu: “Eu votei contra”, afirmou.
Na folha de registro dos votos, entretanto, seu nome aparece como favorável à aprovação do EVU do Cais Mauá. Os únicos conselheiros que se manifestaram contrariamente foram Lívia Piccinini e Daniel Nichele, da RP1. Darci Campani, representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária Ambiental (ABES), se absteve na votação.
“Se é assim, então vou pedir para rever o voto e corrigir”, assegurou Paulo Jorge.
Curiosamente, outro conselheiro pediu revisão de voto emitido em um projeto aprovado na semana ada: foi Diaran Camargo, da RP7, que havia se manifestado favoravelmente a uma proposta de alteração de gravame de uma área verde no bairro Jardim do Salso.
“Mas eu sou contra, a comunidade está indignada! É um absurdo que queiram tirar uma praça de uma comunidade para fazer um abrigo de ônibus! A empresa que compre um terreno para fazer o terminal”, protestou.
O conselheiro itiu que foi falta de atenção sua que o levou a aprovar a proposta. Segundo outros conselheiros, o terminal de ônibus já está no local, mas de forma irregular.
Cais Mauá: pressão não terminou com aprovação
No dia em que o prefeito José Fortunati homologou o EVU do Cais Mauá, aprovado na semana ada pelo Conselho do Plano Diretor, apenas dois conselheiros mencionaram o projeto.
Rogério Dal Molin, representante do Sindimóveis, elogiou o trabalho da representante da Secretaria de Urbanismo, a arquiteta Patrícia Tschoepke, que assessorou seus colegas. “Ela foi fundamental para construirmos um consenso sobre o projeto, tinha muitas informações que clarearam nossa mente. Fizemos quatro reuniões e, sem ela, certamente precisaríamos fazer uma quinta para entender tudo o que queríamos”, agradeceu.
Já Antonio Gomes, da RP6, pediu a palavra para elogiar a decisão do grupo, mas também para desabafar: “A pressão não parou depois da votação. Recebi muitas ameaças como aquelas feitas pelo IAB-RS, pelo Caio Lustosa, da Agapan, e pela conselheira da Ufrgs: que seríamos responsabilizados por qualquer acidente no local. Quem estudou a matéria sabe que isso é coisa do ado, já batida”, afirmou, em referência aos questionamentos da conselheira Lívia Piccinini – que reverberou discursos de entidades nas reuniões anteriores – de que por ser área inundável, o município deveria abster-se de aprovar projetos para a área, sob pena de responsabilização, inclusive do Conselho do Plano Diretor.
Nota de repúdio à intolerância e violência nas eleições de Porto Alegre 721z38
O Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito vem a público manifestar seu veemente repúdio ao clima de intolerância e violência verificado neste período de eleições para a Prefeitura de Porto Alegre.
No dia 17 de outubro, Plínio Zalewski, coordenador do programa da campanha do candidato Sebastião Melo, do PMDB, foi encontrado morto. Sem que tenha sido elucidada até o momento a causa de sua morte, manifestações públicas de pessoas que com ele conviveram registram o alto grau de tensão em que se encontrava o coordenador.
Segundo estas manifestações, Plínio Zalewski viveu um clima de perseguição, com a invasão de seu Facebook, difamações feitas por integrantes do Movimento Brasil Livre/MBL e ameaças que foram, inclusive, denunciadas em ocorrência policial, além dos três processos judiciais movidos contra ele pelo candidato Nelson Marchezan Jr, do PSDB.
Hoje, dia 25 de outubro, a deputada Juliana Brizola, do PDT, candidata a vice-prefeita na chapa de Sebastião Melo, registrou boletim de ocorrência, em função dos agressivos ataques verbais sofridos na Esquina Democrática, por parte de ativistas que a candidata afirma pertencerem ao mesmo grupo que difamou Plínio Zalewski.
Além das agressões a pessoas, foram denunciados, durante a campanha eleitoral, um ataque com tiros ao comitê do candidato Nelson Marchezan Jr e uma invasão de integrantes da equipe de Marchezan Jr. à sede do PMDB.
A escalada de agressões e violência vivida na campanha à Prefeitura de Porto Alegre expressa o clima de truculência de tipo fascista que vem crescendo no Brasil e do qual têm sido vítimas lideranças políticas, intelectuais, artistas, estudantes e outros cidadãos participantes de movimentos reivindicatórios no país.
A memória histórica não permite que nos calemos frente à possibilidade de crescimento de forças e regimes fascistas em nosso estado e no Brasil. Por isto conclamamos todos os democratas a expressarem seu repúdio às atitudes e movimentos com características de cunho fascista e a se unirem em torno da defesa da democracia e dos valores da convivência pacífica e civilizada.
Porto Alegre, 25 de outubro de 2016
Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito
Por que tanta dor? 4p5z5e
Jorge Barcellos – Doutor em Educação/UFRGS
O suicídio de Plínio Zalewski Vargas aponta para a urgência de rever o modo como Porto Alegre faz política.
Conhecia Plínio Zalewski Vargas há mais de 30 anos. Sua trajetória política e intelectual impecável e seu humor caracterizavam um cidadão que amava a vida, sua família e a cidade. Seu suicídio precisa ter sentido, pensei imediatamente quando soube da tragédia. Fui pesquisar o assunto: na base Scielo encontramos 235 artigos a respeito do tema e não encontrei nenhum estudo que trate de motivações políticas do suicídio. Nenhum. Alguns apontam pessoas viúvas e aquelas ocupadas na agropecuária com um índice maior; outros apontam o aumento dos suicídios na população masculina para homens com menos de 40 anos mas as idades variam conforme os estudos; outros defendem como fatores determinantes o desemprego, o estresse econômico e a instabilidade familiar. Plínio não se enquadrava em nenhuma delas “O suicídio enquanto objeto de reflexão teórica apresenta-se como um universo avesso a classificações excessivamente constritivas” afirma Meneguel (2004).
Mesmo os estudos que associam o suicídio com depressão não encaixam no caso de Plínio ou os que optam por linhas de investigação menos formal, ditos “pós-modernos”. Moraes (2006) tentou identificar as características da mente suicida a partir da narrativa do filme “As horas” de Stephen Daldry que trata de pessoas com quadros depressivos em diferentes épocas. Mesmo a personagem Laura Brown, interpretada por Juliane Moore, opta por um suicídio por ingestão de comprimidos como forma de não sentir dor ou ferimentos, ao contrário de Plínio. No entanto, estudos apontam que pelo menos 10% da pessoas que cometem suicídio são aparentemente normais e os psiquiatras denominam de “autópsia psicológica” o diagnóstico a partir de depoimentos de fontes próximas.Os depoimentos de amigos nos jornais tem dificuldade de acreditar no que aconteceu.
Então como isso foi possível? A melhor hipótese que encontrei para mim foi a dada por Flavia Pinhal de Carlos e Marta Regina de Leão D’Agord em seu estudo “O lugar obsceno do suicídio”. Se o obsceno é o que não pode ser mostrado, a ideia é que o suicídio pode ter um lugar obsceno. Como na sexualidade, o obsceno é o “momento mítico, onde uma narrativa é criada para dar conta desse real inapreensível”. Fora de cena, o que não pode ser mostrado, o que não pode ser falado, a cena fantasmática é o que “distingue os registros do mundo e da cena”. Toda a vida de Plínio foi marcada pelo significante político, era o mundo da urbe e da civitas que davam os marcos de seu mundo: sua dedicação à cidade era sua forma de não sucumbir na vida e a defesa da civilidade era o anteparo que funcionava como um fantasma que não deixava seu mundo cair. Mas o mundo político que Plinio vislumbrou nas eleições era totalmente diverso, estava além da cena a qual estava acostumado, era, numa palavra, obsceno.
O obsceno é caracterizado por uma perda de distância e o excesso de proximidade de Plínio com os ataques políticos, a perseguição de que foi vítima, a suposta invasão a seu celular e seu computador e as ameaças a sua família lhe mostraram que algo estava fora do lugar, do jogo político “O obsceno é duplo, se encontra entre dois”, e no caso, entre Plínio e seus perseguidores. Como o obsceno, o que mais o afligia era que estes conflitos escaem, que escorregassem para sua vida privada, exatamente como veio a acontecer nos movimentos das redes sociais “O obsceno é aquilo ao qual se dá uma olhada e depois se rechaça”: não foi exatamente assim que reagiu Plínio ao vídeo que circulou nas redes e apontado como motivo de depressão e que provocou, para surpresa de seu criador, que se demitisse da assembleia, pois “exibiu o que o espectador não consegue ver, se nega a ver”?
Mas há diferenças. Enquanto as autoras tecem considerações sobre as relações entre suicídio, obsceno e o campo das artes, é preciso ver as semelhanças do obsceno com a política. Isso é fácil. Enquanto o obsceno mostra e força o olhar, a política seduz, busca convencer. Trata-se portanto, de um encontro possível, já que a política quer dar ao olhar uma direção. Ao vislumbrar a dimensão perversa da política, conflito no campo pessoal que seu olhar não pode apreender, que estava fora “do campo visível [que] trazem consigo o horror” como o olhar a morte e o sol e que “implica o desaparecimento do sujeito, na cegueira”. O que isto significa: que Plínio vislumbrou o lado obsceno da política, em maior ou menor grau, de um lado e de outro, algo foi colocado na cena da política que não poderia ali estar “como Édipo ao ver seus próprios olhos no chão”. Ao contrário do que defende seu diretor, o vídeo foi sim o disruptor de sua depressão: enquanto que para o cinegrafista o vídeo era gozo, o schaulust de que falam os autores, o gozo do espetacular, para Plínio era o horror, esse ultraamento de todos os limites, foi a visão obscena em que se transformou a política da capital que o matou, ela se transformou naquilo que ele não podia ver “O signo que conduz a vida, à existência, é o mesmo que conduz a morte (…) o evento fatal não é aquele que se pode explicar por suas causas, e sim aquele que, em um dado momento, contradiz todas as causalidades, aquele que vem de algum outro lugar (..) mas apelar para as causas a fim de justificar os meios é sempre um álibi: não esgotaremos dessa maneira o sentido, ou a falta de sentido, de um acontecimento” diz o filósofo Jean Baudrillard em Senhas (Difel, 2001).
A campanha política jogou com a vida de Plínio colocando-o numa “experiência silenciosa” (p.47) e ainda que a autora remeta a figuras da psicanálise, o que está em jogo é a “experiência limite” vivida pelo escritor, onde lhe faltaram imagens em que pudesse se reconhecer. Culpa do partido e do candidato que apoiava por não perceber a fragilidade de seu mais devotado apoiador; culpa do partido e do candidato opositor que permitiu que grupos radicais de extrema direita o apoiassem. Assim como o obsceno tem relação com o que ataca o pudor, Plínio viu uma política sem pudores, sem regras, uma dimensão que nunca havia visto e que não imaginava pudesse existir em tamanha intensidade. Como a obscenidade que exige uma vontade de mostrar, Plínio viu-se diante do horror de imagens e palavras que se dirigiam a ele e sua família “o obsceno seria o que permite jogar com a morte mediante imagens” dizem as autoras, quer dizer, estava tudo ali, a política colocada para ele mostrava tudo, expunha suas entranhas ao inesperado, as agressões à família “o que há de obsceno na política não é a pornografia de seus gestos, mas a relação com a sua morte que anuncia”.
Como pensar o encontro voluntário com a própria morte? Essa contingência que levou Plínio, essa confusão dos signos do mundo, do amor à política a recusa ao gozo do Outro repete estruturas apontadas por Ferreira (2012) ”quando algo falha, que o desejo não pode ser o desejo do Outro, quando alguém não pode fazer o seu desejo como o desejo do Outro, quanto isto falha, isto é fatal com respeito ao suicídio” (p.22). O suicídio de Plínio é o alerta a sociedade que, do jeito que a política está não pode ficar, o que está em jogo no campo simbólico de seu gesto é o grito de que nossas práticas políticas precisam mudar. Urgentemente. Seu ato é um significante para toda uma capital, estamos todos de alguma forma vinculados a sua trágica morte por nossas ações ou omissões. Seu ato é contra esta forma de fazer política caracterizada por disputa sem limites, ética e valores “Esse signo, contudo, não é para quem comete o ato, mas sim para os que ficam. Trata-se do signo da existência de alguém” (p.51). Nossos ódios via internet, nossa falta de debate de ideias, nossa falta de respeito, a tudo isto Plínio respondeu com seu silêncio, uma lição de amor à política como ela deve ser e que fez da única forma que encontrou “a ruptura absoluta, uma não mediação do outro, no silêncio”. Para Plínio, a política se tornou um horror que só dando esse o a mais, ando um horror mais fundamental – a morte – ele poderia se tranquilizar. Essa é a mensagem: precisamos urgentemente reformar a vida política na cidade, lição de um pai amoroso que queria um mundo melhor para seus filhos.
Para as autoras “o suicídio é um ato no qual por mais que se pretenda decifrar os motivos que levam a um sujeito a realizá-lo, este não está ali para ser interpelado”. Se para Plínio, como revela seu bilhete, sua inquietação é que ele não podia lidar com as consequências de sua ação – a tristeza da família e dos amigos – cabe aos sobreviventes lidar de alguma forma com os significados dela. Para mim, sua mensagem eterniza na nossa memória que vivemos tempos de uma política absurda e que isso tem de parar. Seu gesto molesta a todos nós e isso é bom, convoca nosso olhar, convoca o olhar dos candidatos e suas equipes e os obrigam a perguntar “porquê”: como afirmou Sebastião Melo, o candidato a que dedicou seu trabalho e amizade, sua morte não pode ser em vão. Mas em que sentido: ela precisa desvelar a tela que encobre o vazio e a agressividade de nossa política, ela precisa ser um apelo à paz nas campanhas políticas, um apelo à paz na vida nas cidades e em nosso modo de vida, que ele tentou tantas vezes cultivar com suas reflexões sobre convivialidade.
Contra o Retrocesso – Por uma Frente Popular e Democrática em Porto Alegre 3q5v11
Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo e outros
O Brasil vive um momento político extremamente grave. O Golpe parlamentar contra a Presidenta eleita foi realizado por uma potente articulação de forças contrárias aos direitos sociais, civis e democráticos. A entrega dos recursos do pré-sal para o grande capital internacional, o afastamento do Brasil de seus parceiros latino-americanos e africanos, a perda de protagonismo do país no contexto mundial, o corte de gastos nas áreas da saúde e da educação, a flexibilização das regras trabalhistas e o abuso da violência estatal e do encarceramento como políticas de Estado mostram que o golpe segue em curso, colocando para o campo democrático e popular o desafio de barrar o seu avanço.
Há um clima de ódio e de violência instalado no país. O processo de criminalização seletiva e de espetacularização das denúncias contra os integrantes de apenas um partido político, promovido por setores importantes do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal, em aliança com as grandes mídias corporativas, tem como objetivo claro transformar as esquerdas e principalmente o PT e suas lideranças nos “grandes inimigos do povo”.
A discricionariedade na aplicação da Justiça, que desconsidera as graves denúncias envolvendo figuras destacadas do PSDB, do PMDB e do PP, bem como o engajamento do próprio STF na retirada progressiva das garantias processuais e dos direitos individuais revelam o perigo iminente da fascistização das relações sociais e das instituições públicas em curso no Brasil. É nesse contexto que ocorrerá o 2º turno da eleição para a Prefeitura de Porto Alegre, quando deveremos nos posicionar frente aos dois projetos políticos para a cidade mais votados no 1º turno.
Temos, de um lado, a candidatura de Marchezan Jr., do PSDB, aliado ao PP, que representa um programa de retrocesso em relação não só às conquistas sociais, políticas e econômicas da última década, mas também em relação aos direitos e garantias assegurados pela Constituição de 1988. Essa candidatura tenta angariar votos e conquistar o eleitorado para propostas de submissão das políticas públicas aos princípios da iniciativa privada: privatização do patrimônio público, enxugamento da máquina pública, arrocho do funcionalismo e rebaixamento dos direitos de cidadania a uma pura e simples relação de clientela entre os cidadãos e o Estado, numa postura assistencialista. A vitória dessa candidatura, que conta com forças políticas oriundas da antiga ARENA, significaria a obtenção de uma base sólida na capital do estado para o aprofundamento do golpe e a consolidação do campo neoliberal no Rio Grande do Sul, com todo o retrocesso social, político e econômico que ele representa.
A coligação Melo e Juliana, por outro lado, em que pesem problemas da cidade não enfrentados pela gestão municipal nos últimos 12 anos e, ainda, a vinculação do partido do candidato a Prefeito ao golpe perpetrado contra a democracia por meio do impeachment, é mais plural, na medida em que conta com a presença de uma liderança do PDT no cargo de vice-prefeita. O PDT posicionou-se nacionalmente contra o golpe e reconhece a importância da participação popular na gestão pública. A origem pessoal e o vínculo de Melo com setores populares, a trajetória do Prefeito José Fortunatti, afiançador da chapa e historicamente vinculado ao campo democrático e popular, assim como a presença de Juliana Brizola como vice-prefeita, herdeira das propostas avançadas do Brizolismo para a emancipação da cidadania e a afirmação da democracia e da legalidade, não deixam dúvida sobre as diferenças entre as duas candidaturas em disputa. Frente ao retrocesso em curso no país após o golpe e o risco da fascistização crescente de nossas instituições, é fundamental que sejamos capazes, do espaço municipal ao nacional, de somar forças para a defesa da democracia e do Estado de Direito no país.
Para que Porto Alegre tenha uma perspectiva efetivamente popular e democrática, propomos a constituição de uma frente ampla para barrar o avanço do neoliberalismo mais retrógrado e elitista representado pela candidatura Marchezan, que reúne as forças mais à direita do espectro de posições políticas do Rio Grande do Sul.
Uma frente popular e democrática em Porto Alegre precisa ter como perspectiva enfrentar com mais determinação os problemas da cidade.
Porto Alegre precisa enfrentar com firmeza a gestão ambiental do Guaíba e da qualidade da água, dos resíduos sólidos e da qualidade do ar. Nas últimas istrações, a cidade tem sofrido uma espécie de falência da gestão ambiental, que precisa ser revertida diante dos desafios do aquecimento global e do desenvolvimento sustentável.
A educação municipal, que já foi motivo de orgulho, precisa avançar na qualificação dos professores e na educação de tempo integral. Os projetos de Educação de jovens e adultos (EJA) também merecem investimento e revitalização. As escolas precisam ser capacitadas para se tornarem centros de saberes locais e promotoras da identidade das comunidades.
A política urbana de Porto Alegre deve retomar o combate à retenção especulativa de imóveis urbanos, a fim de garantir o cumprimento da função social da propriedade e das funções sociais da cidade. Na política habitacional, os projetos de Regularização Fundiária de assentamentos irregulares precisam ser retomados, já que o direito à cidade depende, em boa medida, da segurança da posse na terra conquistada para fins de moradia. As áreas ocupadas por comunidades tradicionais, como os quilombos urbanos, as terras indígenas e os povos de terreiro, são ainda mais vulneráveis ao assédio do mercado imobiliário e necessitam de urgente atenção na dotação de infraestrutura e serviços, bem como na titulação e proteção contra despejos forçados.
Da mesma forma, é importante ampliar as possibilidades de o regular ao solo urbano para as famílias de baixa renda por meio da oferta de lotes urbanizados em áreas já dotadas de infraestrutura. Porto Alegre precisa ampliar o debate acerca da utilização dos espaços públicos, particularmente em áreas de especial interesse ambiental e cultural, como, por exemplo, o Cais Mauá, devolvendo aos cidadãos o processo de tomada de decisão.
No plano das políticas para as mulheres, a desqualificação do transporte coletivo e as ameaças de redução de recursos para o SUS e para o ensino público afetam de forma particular as mulheres trabalhadoras da cidade, exigindo a retomada de programas da rede de assistência social e a ampliação das políticas de enfrentamento à violência doméstica e familiar.
A violência urbana reduz direitos de cidadania de homens, mulheres e jovens que têm o espaço público reduzido pelo medo e pela criminalidade organizada. É cada dia mais urgente a rediscussão do papel do município nas políticas de prevenção à violência, com a ampliação da guarda municipal, integrada com a Brigada Militar na realização do policiamento ostensivo, com características de policiamento comunitário e de proximidade, capaz de istrar conflitos e garantir a ação efetiva do Estado na prevenção ao crime. O mesmo desafio se coloca em relação aos moradores de rua, aos imigrantes e refugiados, pela vulnerabilidade de sua condição de cidadania.
Algumas políticas específicas precisam ser ampliadas e reforçadas, como o investimento em ciclovias para a criação de alternativas para a mobilidade urbana e a política de proteção animal, voltada para o controle populacional, o tratamento de doenças e o resgate e a adoção de animais em situação de rua, incorporando de forma definitiva novas demandas sociais às políticas públicas do município.
A retomada da política cultural, com o desenvolvimento de projetos avançados de ocupação do espaço urbano, com a descentralização da produção artística direcionada para os bairros da cidade, é fundamental para estimular o convívio social. Com isso, Porto Alegre poderá retomar suas cores e não sucumbir ao cinza de uma cidade desumanizada, triste e amedrontada.
Estes são alguns dos principais desafios colocados para a gestão da cidade. Para enfrentá-los, é preciso que seja construída uma frente democrática e popular, contra o retrocesso. Acreditamos que, para construí-la, o único caminho possível no 2º turno das eleições municipais é o voto em Melo e Juliana, para que Porto Alegre possa resistir ao retrocesso jurídico, político e social e se mantenha na defesa da legalidade democrática e das conquistas populares.
Assinam:
Ana Costa – Auditora fiscal do trabalho
Ângela Tavares – Programadora de computador aposentada e militante em movimentos sociais
Benedito Tadeu César – Cientista Político
Bernardo Lewgoy – Antropólogo e professor da UFRGS
Betânia de Moraes Alfonsin – Advogada e professora da PUCRS e da FMP
Carmen S. de Oliveira – Psicóloga e militante de direitos humanos
Cátia Simon – Professora da RME/PMPA
Diego Pautasso – Professor Universitário
Eny R. Dalmaso – Profa. de História e Filosofia, militante do ers Sindicato e movimentos sociais
Fábio Dal Molin – Psicólogo e professor da FURG
Gentil Corazza – Economista, professor da UFRGS
Ivaldo Gehlen – Sociólogo e professor da UFRGS
Jorge Garcia – Advogado
Jucemara Beltrame – Advogada
Júlio Bernardes – Professor de Filosofia, coordenador do Curso de Filosofia do Departamento de Ciências Humanas da UNISC
Luis Stephanou – Sociólogo
Maria da Glória Lopes Kopp – Historiadora, doutoranda em Ciências Sociais PUCRS
Maria Regina Jacob Pilla – Tradutora e escritora
Marília Veríssimo Veronese – Psicóloga Social e professora da Unisinos
Mário Madureira – Advogado
Milena Dugacsek – Etnomusicóloga
Patrícia Reuillard – Tradutora e professora da UFRGS
Paulo de Tarso Carneiro – Bancário aposentado, fundador do PT
Paulo Timm – Economista
Rafael Machado Madeira – Cientista Político e professor da PUCRS
Reginete Souza Bispo – Cientista Social e militante do Movimento de Mulheres Negras
Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo – Sociólogo e professor da PUCRS
Rualdo Menegat – Geólogo e professor da UFRGS
Soraya Vargas Cortes – Socióloga e professora da UFRGS
Tagore Vieira Rodrigues – Historiador
Tamara Hauck – Jornalista
Vinicius Galleazzi – Engenheiro Civil
Walter Morales Aragão – Professor universitário
Zoravia Bettiol – Artista plástica
Escola sem partido e o sistema de museus j4o1u
JORGE BARCELLOS
A educação brasileira recebeu a colaboração de diversas instituições que em seu interior criaram ações educativas. Fundações assistenciais, órgãos públicos descentralizados, sociedades de economia mista e principalmente museus, desde a década de 80, tomaram consciência da importância da educação e começaram a ofertar inúmeros programas e serviços, inclusive com traduções para turistas e atividades próprias para portadores de necessidades especiais.
Fundações de Assistência Social e Comunitária, seja em seus centros comunitários ou mesmo em instituições de recuperação de menores, incorporaram educadores em suas equipes; diversos órgãos públicos desenvolveram atividades de formação escolar, seja para criar vivências de aprendizagem sobre a correta destinação do lixo urbano (DMLU) ou os cuidados necessários com a água e o meio ambiente (SMAM) e museus públicos e privados ampliaram iniciativas educacionais com suas exposições. É o que se chama de Educação em instituições não escolares, realizada por centenas de educadores que acompanharam em seu meio o esforço legal que a democratização do pais promoveu com a Constituição Federal, de 1988, e foram capazes de incluir em seus programas e ações objetivos do Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996.
Nesse contexto, educadores de museus colaboraram com a fixação do aluno no sistema de ensino pela produção de ações educativas fora do ambiente escolar incorporadas pelas escolas. E fizeram isso na maior parte das vezes sem qualquer investimento direto do poder público, sem fundo algum governamental a não ser os próprios recursos de suas instituições. Esse trabalho era muito importante para as escolas para aprimorar conteúdos de ensino, mas não era incomum que, frente a inexistência de quadros, muitos diretores tomassem a iniciativa de incluírem em seus programas atividades extra classe, incluindo visita à museus ou apelando para a prestação de serviços de profissionais de instituições públicas para suprir carências de carga horária de professores que não eram contratados pelo Estado.
Em meados de 2016, a ocupação de escolas públicas estaduais promovidas por estudantes que reividicavam melhorias na educação e nomeação de professores terminou por interromper o afluxo de estudantes em muitas instituições públicas. Parte destas reivindicações, como lembra a pesquisadora Russel Dutra da Rosa, pedia o arquivamento do PL 44/2016 que pretende transferir recursos públicos para Organizações Sociais privadas realizarem a gestão escolar, incluindo a contratação de diretores e professores sem concurso público e o PL 190/2015 do programa Escola sem Partido (ESP).
Boa parte dos professores não se deram conta nesta luta que os profissionais da educação que desenvolviam projetos longe do ambiente escolar também eram afetados pelo PL 190/2015. O projeto ESP ataca diretamente o trabalho não apenas de professores das escolas mas educadores de diversas instituições públicas, principalmente de museus, porque visam limitar a liberdade de expressão de qualquer professor. É o caso de muitos museus da cidade, que tem entre sua programação cultural a promoção de exposições de caráter “politico”, versando sobre Direitos Humanos, questões de gênero, etc. Segundo a proposta da lei, estes profissionais de ensino também podem ser afetados: é um erro conceber o projeto “escola sem partido” como um projeto voltado unicamente para escolas, ele quer atingir um tipo de educação critica desenvolvida em diversos espaços. A escola é apenas um deles. Não se trata apenas de afetar o trabalho de professores: ora, nossos museus contam com “monitores” cumprindo papel similar a de um professor pelo qual recebem treinamento, ou mesmo professores formados, geralmente em história, responsáveis pelas visitas. Por ser um espaço educativo, todo o trabalho de museus coloca-se sob o horizonte e alvo do projeto ESP. Diz Rosa: “O movimento atua em todas as esferas do governo, já tendo protocolado quatro projetos na Câmara dos Deputados e um no Senado, no âmbito federal. Na esfera estadual, são 12 projetos protocolados até o momento com um aprovado no estado do Alagoas. E na esfera municipal 2 projetos foram aprovados em Santa Cruz do Monte Carmelo-PR e Picuí-PB.”(Jornal Já, 2/08/2016).
O universo dos museus está em expansão no Brasil. Segundo dados do Ministério da Cultura, compreende 3.025 museus onde cerca de 48,2% possui área educativa própria encarregada de fazer exposições. Isso significa setores e equipes que produzem materiais educativos que podem se tornar alvo do programa ESP: textos de exposição, catálogos, informativos e material didático oferecido por professores e pesquisadores a outros professores. Se o projeto ESP veda conteúdos que estejam em conflito com as convicções religiosas e morais da família, uma exposição como “Os segredos da anatomia”, promovida pelo Museu de História da Medicina em 2015, pode ser considerada ofensiva às convicções morais da família por mostrar o corpo humano; o mesmo poderia se dizer da exposição “22 anos de Nuances”, realizada no Memorial do Rio Grande do Sul em 2013, que jamais poderia ter sido realizada porque tratar da luta pelos direitos LGBT em Porto Alegre, e, segundo os defensores da ESP, ofenderia (sic) as convicções de saúde sexual da família. O que ocorreria com as direções desses museus e seus professores? Seriam notificados extrajudicialmanete e coagidos através de penas e ameaças para a retirada de suas exposições como propõem o site do ESP? Seriam objeto de delação anônima de professores e monitores de museus visando cercear a livre iniciativa de programação de museus? Está claro o caráter fascista de tal iniciativa: eles violam o principio de autonomia tanto do pesquisador como do professor.
A própria forma de interpretar conteúdos de exposição seria posto em questão. O movimento ESP já demonstrou que, em qualquer situação, seu pressuposto é de que o capitalismo não se fundamenta em uma lógica que produz exclusão já que gera empregos. Como então explicar os processos de história dos mais diferentes níveis, seja história politica, econômica ou cultural sem tomar uma perspectiva de análise critica? Nesse sentido, toda a linha do tempo da exposição História do Rio Grande do Sul, do Memorial do Rio Grande do Sul precisaria ser revista. Nenhum pesquisador sério de nossas instituições de memória faz uma exposição sem uma pesquisa detalhada, aproximando perspectivas sociológicas, econômicas e políticas. Na concepção dos defensores da ESP, uma exposição que mencionasse o genocídio de populações indígenas seria considerada doutrinadora, assim como uma exposição sobre Direitos Humanos. Qualquer atividade que promovesse um debate na semana do negro que apontasse as diferenças quanto a taxas de desemprego também seria considerado ideológico.
O Movimento ESP está construindo o caminho para afetar não apenas o trabalho do professor em sala de aula, mas a programação e a pesquisa de exposições de diversos museus porque já retirou do Plano Nacional de Educação as metas e estratégias de promoção de equidade étnico- racial e de gênero. Se o ESP já chegou a processar o INEP, órgão responsável pelo ENEM por incluir o tema da violência contra a mulher na redação e considerar o critério de avaliação a respeito aos direitos humanos como doutrinação de esquerda, o que resta as instituições museológicas e aos profissionais dedicados em instituições como o Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo ou as atividades de recuperação de menores promovidas pelo CASE POA 1 da da FASE?
A questão é que os educadores que trabalham fora da escola também são protegidos pelo Art. 5 da Constituição Federal: tem direito a livre manifestação do pensamento (inciso IV); tem direito à livre expressão intelectual (inciso IX) e tem direito ao exercício de sua profissão se atendidas as exigências legais (inciso XIII). A ESP critica conteúdos que são necessários a formação cidadã promovidas por várias outras instituições que não apenas as escolas: aspectos de cultura afro-brasileira e indígena são temas frequentes de exposições em museus. Os defensores da ESP estão contra as metas do PNE que buscam a superação das desigualdades educacionais pelo fim da discriinação e defesa da diversidade e dos direitos humanos, justamente temas retratados em diversas atividades dos museus que integram o Sistema Estadual dos Museus do Rio Grande do Sul.
Tanto como nos professores da rede pública, o projeto ESP produz insegurança e desconfiança entre profissionais de educação. Por isso precisamos incorporar na Frente Nacional Escola Sem Mordaça, criada na última quarta-feira na UFRGS, os profissionais de Educação de instituições não escolares, pois num pais onde professores não são livres, nenhum educador o será.
Os marajás do Judiciário, protagonistas do impeachment 683360
André Barrocal – Jornalista
Confira a íntegra do discurso de Dilma em julgamento do impeachment no Senado 3m3z3n
Da Agência Brasil
A presidenta afastada Dilma Rousseff discursou na manhã desta segunda-feira (29) por cerca de 45 minutos no plenário do Senado, durante a última fase do julgamento do processo de impeachment. Em sua fala, Dilma , ressaltou que foi ao Senado “olhar diretamente nos olhos dos que a julgarão e negou ter cometido crimes dos quais é acusada, segundo ela, “injusta e arbitrariamente”. “Hoje, o Brasil, o mundo e a história nos observam. E aguardam o desfecho desse processo de impeachment”, disse.
Ouça a íntegra do discurso
Confira a íntegra do discurso de Dilma do Senado:
Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski
Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal Renan Calheiros,
Excelentíssimas Senhoras Senadoras e Excelentíssimos Senhores Senadores,
Cidadãs e Cidadãos de meu amado Brasil,
No dia 1o de janeiro de 2015 assumi meu segundo mandato à Presidência da República Federativa do Brasil. Fui eleita por mais 54 milhões de votos.
Na minha posse, assumi o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, bem como o de observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.
Ao exercer a Presidência da República respeitei fielmente o compromisso que assumi perante a nação e aos que me elegeram. E me orgulho disso. Sempre acreditei na democracia e no Estado de direito, e sempre vi na Constituição de 1988 uma das grandes conquistas do nosso povo.
Jamais atentaria contra o que acredito ou praticaria atos contrários aos interesses daqueles que me elegeram.
Nesta jornada para me defender do impeachment me aproximei mais do povo, tive oportunidade de ouvir seu reconhecimento, de receber seu carinho. Ouvi também críticas duras ao meu governo, a erros que foram cometidos e a medidas e políticas que não foram adotadas. Acolho essas críticas com humildade.
Até porque, como todos, tenho defeitos e cometo erros.
Entre os meus defeitos não está a deslealdade e a covardia. Não traio os compromissos que assumo, os princípios que defendo ou os que lutam ao meu lado. Na luta contra a ditadura, recebi no meu corpo as marcas da tortura. Amarguei por anos o sofrimento da prisão. Vi companheiros e companheiras sendo violentados, e até assassinados.
Na época, eu era muito jovem. Tinha muito a esperar da vida. Tinha medo da morte, das sequelas da tortura no meu corpo e na minha alma. Mas não cedi. Resisti. Resisti à tempestade de terror que começava a me engolir, na escuridão dos tempos amargos em que o país vivia. Não mudei de lado. Apesar de receber o peso da injustiça nos meus ombros, continuei lutando pela democracia.
Dediquei todos esses anos da minha vida à luta por uma sociedade sem ódios e intolerância. Lutei por uma sociedade livre de preconceitos e de discriminações. Lutei por uma sociedade onde não houvesse miséria ou excluídos. Lutei por um Brasil soberano, mais igual e onde houvesse justiça.
Disso tenho orgulho. Quem acredita, luta.
Aos quase setenta anos de idade, não seria agora, após ser mãe e avó, que abdicaria dos princípios que sempre me guiaram.
Exercendo a Presidência da República tenho honrado o compromisso com o meu país, com a Democracia, com o Estado de Direito. Tenho sido intransigente na defesa da honestidade na gestão da coisa pública.
Por isso, diante das acusações que contra mim são dirigidas neste processo, não posso deixar de sentir, na boca, novamente, o gosto áspero e amargo da injustiça e do arbítrio. E por isso, como no ado, resisto.
Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes. No ado, com as armas, e hoje, com a retórica jurídica, pretendem novamente atentar contra a democracia e contra o Estado do Direito.
Se alguns rasgam o seu ado e negociam as benesses do presente, que respondam perante a sua consciência e perante a história pelos atos que praticam. A mim cabe lamentar pelo que foram e pelo que se tornaram.
E resistir. Resistir sempre. Resistir para acordar as consciências ainda adormecidas para que, juntos, finquemos o pé no terreno que está do lado certo da história, mesmo que o chão trema e ameace de novo nos engolir.
Não luto pelo meu mandato por vaidade ou por apego ao poder, como é próprio dos que não tem caráter, princípios ou utopias a conquistar. Luto pela democracia, pela verdade e pela justiça. Luto pelo povo do meu País, pelo seu bem-estar.
Muitos hoje me perguntam de onde vem a minha energia para prosseguir. Vem do que acredito. Posso olhar para trás e ver tudo o que fizemos. Olhar para a frente e ver tudo o que ainda precisamos e podemos fazer. O mais importante é que posso olhar para mim mesma e ver a face de alguém que, mesmo marcada pelo tempo, tem forças para defender suas ideias e seus direitos.
Sei que, em breve, e mais uma vez na vida, serei julgada. E é por ter a minha consciência absolutamente tranquila em relação ao que fiz, no exercício da Presidência da República que venho pessoalmente à presença dos que me julgarão. Venho para olhar diretamente nos olhos de Vossas Excelências, e dizer, com a serenidade dos que nada tem a esconder que não cometi nenhum crime de responsabilidade.
Não cometi os crimes dos quais sou acusada injusta e arbitrariamente.
Hoje o Brasil, o mundo e a história nos observam e aguardam o desfecho deste processo de impeachment.
No ado da América Latina e do Brasil, sempre que interesses de setores da elite econômica e política foram feridos pelas urnas, e não existiam razões jurídicas para uma destituição legítima, conspirações eram tramadas resultando em golpes de estado.
O Presidente Getúlio Vargas, que nos legou a CLT e a defesa do patrimônio nacional, sofreu uma implacável perseguição; a hedionda trama orquestrada pela chamada “República do Galeão, que o levou ao suicídio.
O Presidente Juscelino Kubitscheck, que contruiu essa cidade, foi vítima de constantes e fracassadas tentativas de golpe, como ocorreu no episódio de Aragarças.
O presidente João Goulart, defensor da democracia, dos direitos dos trabalhadores e das Reformas de Base, superou o golpe do parlamentarismo mas foi deposto e instaurou-se a ditadura militar, em 1964.
Durante 20 anos, vivemos o silêncio imposto pelo arbítrio e a democracia foi varrida de nosso País. Milhões de brasileiros lutaram e reconquistaram o direito a eleições diretas.
Hoje, mais uma vez, ao serem contrariados e feridos nas urnas os interesses de setores da elite econômica e política nos vemos diante do risco de uma ruptura democrática. Os padrões políticos dominantes no mundo repelem a violência explícita. Agora, a ruptura democrática se dá por meio da violência moral e de pretextos constitucionais para que se empreste aparência de legitimidade ao governo que assume sem o amparo das urnas. Invoca-se a Constituição para que o mundo das aparências encubra hipocritamente o mundo dos fatos.
As provas produzidas deixam claro e inconteste que as acusações contra mim dirigidas são meros pretextos, embasados por uma frágil retórica jurídica.
Nos últimos dias, novos fatos evidenciaram outro aspecto da trama que caracteriza este processo de impeachment. O autor da representação junto ao Tribunal de Contas da União que motivou as acusações discutidas nesse processo, foi reconhecido como suspeito pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Soube-se ainda, pelo depoimento do auditor responsável pelo parecer técnico, que ele havia ajudado a elaborar a própria representação que auditou. Fica claro o vício da parcialidade, a trama, na construção das teses por eles defendidas.
São pretextos, apenas pretextos, para derrubar, por meio de um processo de impeachment sem crime de responsabilidade, um governo legítimo, escolhido em eleição direta com a participação de 110 milhões de brasileiros e brasileiras. O governo de uma mulher que ousou ganhar duas eleições presidenciais consecutivas.
São pretextos para viabilizar um golpe na Constituição. Um golpe que, se consumado, resultará na eleição indireta de um governo usurpador.
A eleição indireta de um governo que, já na sua interinidade, não tem mulheres comandando seus ministérios, quando o povo, nas urnas, escolheu uma mulher para comandar o país. Um governo que dispensa os negros na sua composição ministerial e já revelou um profundo desprezo pelo programa escolhido pelo povo em 2014.
Fui eleita presidenta por 54 milhões e meio de votos para cumprir um programa cuja síntese está gravada nas palavras “nenhum direito a menos”.
O que está em jogo no processo de impeachment não é apenas o meu mandato. O que está em jogo é o respeito às urnas, à vontade soberana do povo brasileiro e à Constituição.
O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos: os ganhos da população, das pessoas mais pobres e da classe média; a proteção às crianças; os jovens chegando às universidades e às escolas técnicas; a valorização do salário mínimo; os médicos atendendo a população; a realização do sonho da casa própria.
O que está em jogo é o investimento em obras para garantir a convivência com a seca no semiárido, é a conclusão do sonhado e esperado projeto de integração do São Francisco. O que está em jogo é, também, a grande descoberta do Brasil, o pré-sal. O que está em jogo é a inserção soberana de nosso País no cenário internacional, pautada pela ética e pela busca de interesses comuns.
O que está em jogo é a auto-estima dos brasileiros e brasileiras, que resistiram aos ataques dos pessimistas de plantão à capacidade do País de realizar, com sucesso, a Copa do Mundo e as Olimpíadas e Paraolimpíadas.
O que está em jogo é a conquista da estabilidade, que busca o equilíbrio fiscal mas não abre mão de programas sociais para a nossa população.
O que está em jogo é o futuro do País, a oportunidade e a esperança de avançar sempre mais.
Senhoras e senhores senadores,
No presidencialismo previsto em nossa Constituição, não basta a eventual perda de maioria parlamentar para afastar um Presidente. Há que se configurar crime de responsabilidade. E está claro que não houve tal crime.
Não é legítimo, como querem os meus acusadores, afastar o chefe de Estado e de governo pelo “conjunto da obra”. Quem afasta o Presidente pelo “conjunto da obra” é o povo e, só o povo, nas eleições. E nas eleições o programa de governo vencedor não foi este agora ensaiado e desenhado pelo Governo interino e defendido pelos meus acusadores.
O que pretende o governo interino, se transmudado em efetivo, é um verdadeiro ataque às conquistas dos últimos anos.
Desvincular o piso das aposentadorias e pensões do salário mínimo será a destruição do maior instrumento de distribuição de renda do país, que é a Previdência Social. O resultado será mais pobreza, mais mortalidade infantil e a decadência dos pequenos municípios.
A revisão dos direitos e garantias sociais previstos na CLT e a proibição do saque do FGTS na demissão do trabalhador são ameaças que pairam sobre a população brasileira caso prospere o impeachment sem crime de responsabilidade.
Conquistas importantes para as mulheres, os negros e as populações LGBT estarão comprometidas pela submissão a princípios ultraconservadores.
O nosso patrimônio estará em questão, com os recursos do pré-sal, as riquezas naturais e minerárias sendo privatizadas.
A ameaça mais assustadora desse processo de impeachment sem crime de responsabilidade é congelar por inacreditáveis 20 anos todas as despesas com saúde, educação, saneamento, habitação. É impedir que, por 20 anos, mais crianças e jovens tenham o às escolas; que, por 20 anos, as pessoas possam ter melhor atendimento à saúde; que, por 20 anos, as famílias possam sonhar com casa própria.
Senhor Presidente Ricardo Lewandowski, Sras. e Srs. Senadores,
A verdade é que o resultado eleitoral de 2014 foi um rude golpe em setores da elite conservadora brasileira.
Desde a proclamação dos resultados eleitorais, os partidos que apoiavam o candidato derrotado nas eleições fizeram de tudo para impedir a minha posse e a estabilidade do meu governo. Disseram que as eleições haviam sido fraudadas, pediram auditoria nas urnas, impugnaram minhas contas eleitorais, e após a minha posse, buscaram de forma desmedida quaisquer fatos que pudessem justificar retoricamente um processo de impeachment.
Como é próprio das elites conservadoras e autoritárias, não viam na vontade do povo o elemento legitimador de um governo. Queriam o poder a qualquer preço.
Tudo fizeram para desestabilizar a mim e ao meu governo.
Só é possível compreender a gravidade da crise que assola o Brasil desde 2015, levando-se em consideração a instabilidade política aguda que, desde a minha reeleição, tem caracterizado o ambiente em que ocorrem o investimento e a produção de bens e serviços.
Não se procurou discutir e aprovar uma melhor proposta para o País. O que se pretendeu permanentemente foi a afirmação do “quanto pior melhor”, na busca obsessiva de se desgastar o governo, pouco importando os resultados danosos desta questionável ação política para toda a população.
A possibilidade de impeachment tornou-se assunto central da pauta política e jornalística apenas dois meses após minha reeleição, apesar da evidente improcedência dos motivos para justificar esse movimento radical.
Nesse ambiente de turbulências e incertezas, o risco político permanente provocado pelo ativismo de parcela considerável da oposição acabou sendo um elemento central para a retração do investimento e para o aprofundamento da crise econômica.
Deve ser também ressaltado que a busca do reequilíbrio fiscal, desde 2015, encontrou uma forte resistência na Câmara dos Deputados, à época presidida pelo Deputado Eduardo Cunha. Os projetos enviados pelo governo foram rejeitados, parcial ou integralmente. Pautas bombas foram apresentadas e algumas aprovadas.
As comissões permanentes da Câmara, em 2016, só funcionaram a partir do dia 5 de maio, ou seja, uma semana antes da aceitação do processo de impeachment pela Comissão do Senado Federal. Os Srs. e as Sras. Senadores sabem que o funcionamento dessas Comissões era e é absolutamente indispensável para a aprovação de matérias que interferem no cenário fiscal e encaminhar a saída da crise.
Foi criado assim o desejado ambiente de instabilidade política, propício a abertura do processo de impeachment sem crime de responsabilidade.
Sem essas ações, o Brasil certamente estaria hoje em outra situação política, econômica e fiscal.
Saiba Mais
Dilma: impeachment resultará na eleição indireta de um governo usurpador
Muitos articularam e votaram contra propostas que durante toda a vida defenderam, sem pensar nas consequências que seus gestos trariam para o país e para o povo brasileiro. Queriam aproveitar a crise econômica, porque sabiam que assim que o meu governo viesse a superá-la, sua aspiração de o ao poder haveria de ficar sepultada por mais um longo período.
Mas, a bem da verdade, as forças oposicionistas somente conseguiram levar adiante o seu intento quando outra poderosa força política a elas se agregou: a força política dos que queriam evitar a continuidade da “sangria” de setores da classe política brasileira, motivada pelas investigações sobre a corrupção e o desvio de dinheiro público.
É notório que durante o meu governo e o do Pr Lula foram dadas todas as condições para que estas investigações fossem realizadas. Propusemos importantes leis que dotaram os órgãos competentes de condições para investigar e punir os culpados.
Assegurei a autonomia do Ministério Público, nomeando como Procurador Geral da República o primeiro nome da lista indicado pelos próprios membros da instituição. Não permiti qualquer interferência política na atuação da Polícia Federal.
Contrariei, com essa minha postura, muitos interesses. Por isso, paguei e pago um elevado preço pessoal pela postura que tive.
Arquitetaram a minha destituição, independentemente da existência de quaisquer fatos que pudesse justificá-la perante a nossa Constituição.
Encontraram, na pessoa do ex-Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha o vértice da sua aliança golpista.
Articularam e viabilizaram a perda da maioria parlamentar do governo. Situações foram criadas, com apoio escancarado de setores da mídia, para construir o clima político necessário para a desconstituição do resultado eleitoral de 2014.
Todos sabem que este processo de impeachment foi aberto por uma “chantagem explícita” do ex-Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, como chegou a reconhecer em declarações à imprensa um dos próprios denunciantes. Exigia aquele parlamentar que eu intercedesse para que deputados do meu partido não votassem pela abertura do seu processo de cassação.
Nunca aceitei na minha vida ameaças ou chantagens. Se não o fiz antes, não o faria na condição de Presidenta da República. É fato, porém, que não ter me curvado a esta chantagem motivou o recebimento da denúncia por crime de responsabilidade e a abertura deste d processo, sob o aplauso dos derrotados em 2014 e dos temerosos pelas investigações.
Se eu tivesse me acumpliciado com a improbidade e com o que há de pior na política brasileira, como muitos até hoje parecem não ter o menor pudor em fazê-lo, eu não correria o risco de ser condenada injustamente.
Quem se acumplicia ao imoral e ao ilícito, não tem respeitabilidade para governar o Brasil. Quem age para poupar ou adiar o julgamento de uma pessoa que é acusada de enriquecer às custas do Estado brasileiro e do povo que paga impostos, cedo ou tarde, acabará pagando perante a sociedade e a história o preço do seu descompromisso com a ética.
Todos sabem que não enriqueci no exercício de cargos públicos, que não desviei dinheiro público em meu proveito próprio, nem de meus familiares, e que não possuo contas ou imóveis no exterior. Sempre agi com absoluta probidade nos cargos públicos que ocupei ao longo da minha vida.
Curiosamente, serei julgada, por crimes que não cometi, antes do julgamento do ex-presidente da Câmara, acusado de ter praticado gravíssimos atos ilícitos e que liderou as tramas e os ardis que alavancaram as ações voltadas à minha destituição.
Ironia da história? Não, de forma nenhuma. Trata-se de uma ação deliberada que conta com o silêncio cúmplice de setores da grande mídia brasileira.
Viola-se a democracia e pune-se uma inocente. Este é o pano de fundo que marca o julgamento que será realizado pela vontade dos que lançam contra mim pretextos acusatórios infundados.
Estamos a um o da consumação de uma grave ruptura institucional. Estamos a um o da concretização de um verdadeiro golpe de Estado.
Senhoras e Senhores Senadores,
Vamos aos autos deste processo. Do que sou acusada? Quais foram os atentados à Constituição que cometi? Quais foram os crimes hediondos que pratiquei?
A primeira acusação refere-se à edição de três decretos de crédito suplementar sem autorização legislativa. Ao longo de todo o processo, mostramos que a edição desses decretos seguiu todas as regras legais. Respeitamos a previsão contida na Constituição, a meta definida na LDO e as autorizações estabelecidas no artigo 4° da Lei Orçamentária de 2015, aprovadas pelo Congresso Nacional.
Todas essas previsões legais foram respeitadas em relação aos 3 decretos. Eles apenas ofereceram alternativas para alocação dos mesmos limites, de empenho e financeiro, estabelecidos pelo decreto de contingenciamento, que não foram alterados. Por isso, não afetaram em nada a meta fiscal.
Ademais, desde 2014, por iniciativa do Executivo, o Congresso aprovou a inclusão, na LDO, da obrigatoriedade que qualquer crédito aberto deve ter sua execução subordinada ao decreto de contingenciamento, editado segundo as normas estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. E isso foi precisamente respeitado.
Não sei se por incompreensão ou por estratégia, as acusações feitas neste processo buscam atribuir a esses decretos nossos problemas fiscais. Ignoram ou escondem que os resultados fiscais negativos são consequência da desaceleração econômica e não a sua causa.
Escondem que, em 2015, com o agravamento da crise, tivemos uma expressiva queda da receita ao longo do ano — foram R$ 180 bilhões a menos que o previsto na Lei Orçamentária.
Fazem questão de ignorar que realizamos, em 2015, o maior contingenciamento de nossa história. Cobram que, quando enviei ao Congresso Nacional, em julho de 2015, o pedido de autorização para reduzir a meta fiscal, deveria ter imediatamente realizado um novo contingenciamento. Não o fiz porque segui o procedimento que não foi questionado pelo Tribunal de Contas da União ou pelo Congresso Nacional na análise das contas de 2009.
Além disso, a responsabilidade com a população justifica também nossa decisão. Se aplicássemos, em julho, o contingenciamento proposto pelos nossos acusadores cortaríamos 96% do total de recursos disponíveis para as despesas da União. Isto representaria um corte radical em todas as dotações orçamentárias dos órgãos federais. Ministérios seriam paralisados, universidades fechariam suas portas, o Mais Médicos seria interrompido, a compra de medicamentos seria prejudicada, as agências reguladoras deixariam de funcionar. Na verdade, o ano de 2015 teria, orçamentariamente, acabado em julho.
Volto a dizer: ao editar estes decretos de crédito suplementar, agi em conformidade plena com a legislação vigente. Em nenhum desses atos, o Congresso Nacional foi desrespeitado. Aliás, este foi o comportamento que adotei em meus dois mandatos.
Somente depois que assinei estes decretos é que o Tribunal de Contas da União mudou a posição que sempre teve a respeito da matéria. É importante que a população brasileira seja esclarecida sobre este ponto: os decretos foram editados em julho e agosto de 2015 e somente em outubro de 2015 o TCU aprovou a nova interpretação.
O TCU recomendou a aprovação das contas de todos os presidentes que editaram decretos idênticos aos que editei. Nunca levantaram qualquer problema técnico ou apresentaram a interpretação que aram a ter depois que assinei estes atos.
Querem me condenar por ter assinado decretos que atendiam a demandas de diversos órgãos, inclusive do próprio Poder Judiciário, com base no mesmo procedimento adotado desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2001?
Por ter assinado decretos que somados, não implicaram, como provado nos autos, em nenhum centavo de gastos a mais para prejudicar a meta fiscal?
A segunda denúncia dirigida contra mim neste processo também é injusta e frágil. Afirma-se que o alegado atraso nos pagamentos das subvenções econômicas devidas ao Banco do Brasil, no âmbito da execução do programa de crédito rural Plano Safra, equivale a uma “operação de crédito”, o que estaria vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Como minha defesa e várias testemunhas já relataram, a execução do Plano Safra é regida por uma lei de 1992, que atribui ao Ministério da Fazenda a competência de sua normatização, inclusive em relação à atuação do Banco do Brasil. A Presidenta da República não pratica nenhum ato em relação à execução do Plano Safra. Parece óbvio, além de juridicamente justo, que eu não seja acusada por um ato inexistente.
A controvérsia quanto a existência de operação de crédito surgiu de uma mudança de interpretação do TCU, cuja decisão definitiva foi emitida em dezembro de 2015. Novamente, há uma tentativa de dizer que cometi um crime antes da definição da tese de que haveria um crime. Uma tese que nunca havia surgido antes e que, como todas as senhoras e senhores senadores souberam em dias recentes, foi urdida especialmente para esta ocasião.
Lembro ainda a decisão recente do Ministério Público Federal, que arquivou inquérito exatamente sobre esta questão. Afirmou não caber falar em ofensa à lei de responsabilidade fiscal porque eventuais atrasos de pagamento em contratos de prestação de serviços entre a União e instituições financeiras públicas não são operações de crédito.
Insisto, senhoras senadoras e senhores senadores: não sou eu nem tampouco minha defesa que fazemos estas alegações. É o Ministério Público Federal que se recusou a dar sequência ao processo, pela inexistência de crime.
Sobre a mudança de interpretação do TCU, lembro que, ainda antes da decisão final, agi de forma preventiva. Solicitei ao Congresso Nacional a autorização para pagamento dos ivos e defini em decreto prazos de pagamento para as subvenções devidas. Em dezembro de 2015, após a decisão definitiva do TCU e com a autorização do Congresso, saldamos todos os débitos existentes.
Não é possível que não se veja aqui também o arbítrio deste processo e a injustiça também desta acusação.
Este processo de impeachment não é legítimo. Eu não atentei, em nada, em absolutamente nada contra qualquer dos dispositivos da Constituição que, como Presidenta da República, jurei cumprir. Não pratiquei ato ilícito. Está provado que não agi dolosamente em nada. Os atos praticados estavam inteiramente voltados aos interesses da sociedade. Nenhuma lesão trouxeram ao erário ou ao patrimônio público.
Volto a afirmar, como o fez a minha defesa durante todo o tempo, que este processo está marcado, do início ao fim, por um clamoroso desvio de poder.
É isto que explica a absoluta fragilidade das acusações que contra mim são dirigidas.
Tem-se afirmado que este processo de impeachment seria legítimo porque os ritos e prazos teriam sido respeitados. No entanto, para que seja feita justiça e a democracia se imponha, a forma só não basta. É necessário que o conteúdo de uma sentença também seja justo. E no caso, jamais haverá justiça na minha condenação.
Ouso dizer que em vários momentos este processo se desviou, clamorosamente, daquilo que a Constituição e os juristas denominam de “devido processo legal”.
Não há respeito ao devido processo legal quando a opinião condenatória de grande parte dos julgadores é divulgada e registrada pela grande imprensa, antes do exercício final do direito de defesa.
Não há respeito ao devido processo legal quando julgadores afirmam que a condenação não a de uma questão de tempo, porque votarão contra mim de qualquer jeito.
Nesse caso, o direito de defesa será exercido apenas formalmente, mas não será apreciado substantivamente nos seus argumentos e nas suas provas. A forma existirá apenas para dar aparência de legitimidade ao que é ilegítimo na essência.
Senhoras e senhores senadores,
Nesses meses, me perguntaram inúmeras vezes porque eu não renunciava, para encurtar este capítulo tão difícil de minha vida.
Jamais o faria porque tenho compromisso inarredável com o Estado Democrático de Direito.
Jamais o faria porque nunca renuncio à luta.
Confesso a Vossas Excelências, no entanto, que a traição, as agressões verbais e a violência do preconceito me assombraram e, em alguns momentos, até me magoaram. Mas foram sempre superados, em muito, pela solidariedade, pelo apoio e pela disposição de luta de milhões de brasileiras e brasileiros pelo País afora. Por meio de manifestações de rua, reuniões, seminários, livros, shows, mobilizações na internet, nosso povo esbanjou criatividade e disposição para a luta contra o golpe.
As mulheres brasileiras têm sido, neste período, um esteio fundamental para minha resistência. Me cobriram de flores e me protegeram com sua solidariedade. Parceiras incansáveis de uma batalha em que a misoginia e o preconceito mostraram suas garras, as brasileiras expressaram, neste combate pela democracia e pelos direitos, sua força e resiliência. Bravas mulheres brasileiras, que tenho a honra e o dever de representar como primeira mulher Presidenta do Brasil.
Chego à última etapa desse processo comprometida com a realização de uma demanda da maioria dos brasileiros: convocá-los a decidir, nas urnas, sobre o futuro de nosso País. Diálogo, participação e voto direto e livre são as melhores armas que temos para a preservação da democracia.
Confio que as senhoras senadoras e os senhores senadores farão justiça. Tenho a consciência tranquila. Não pratiquei nenhum crime de responsabilidade. As acusações dirigidas contra mim são injustas e descabidas. Cassar em definitivo meu mandato é como me submeter a uma pena de morte política.
Este é o segundo julgamento a que sou submetida em que a democracia tem assento, junto comigo, no banco dos réus. Na primeira vez, fui condenada por um tribunal de exceção. Daquela época, além das marcas dolorosas da tortura, ficou o registro, em uma foto, da minha presença diante de meus algozes, num momento em que eu os olhava de cabeça erguida enquanto eles escondiam os rostos, com medo de serem reconhecidos e julgados pela história.
Hoje, quatro décadas depois, não há prisão ilegal, não há tortura, meus julgadores chegaram aqui pelo mesmo voto popular que me conduziu à Presidência. Tenho por todos o maior respeito, mas continuo de cabeça erguida, olhando nos olhos dos meus julgadores.
Apesar das diferenças, sofro de novo com o sentimento de injustiça e o receio de que, mais uma vez, a democracia seja condenada junto comigo. E não tenho dúvida que, também desta vez, todos nós seremos julgados pela história.
Por duas vezes vi de perto a face da morte: quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida; e quando uma doença grave e extremamente dolorosa poderia ter abreviado minha existência.
Hoje eu só temo a morte da democracia, pela qual muitos de nós, aqui neste plenário, lutamos com o melhor dos nossos esforços.
Reitero: respeito os meus julgadores.
Não nutro rancor por aqueles que votarão pela minha destituição.
Respeito e tenho especial apreço por aqueles que têm lutado bravamente pela minha absolvição, aos quais serei eternamente grata.
Neste momento, quero me dirigir aos senadores que, mesmo sendo de oposição a mim e ao meu governo, estão indecisos.
Lembrem-se que, no regime presidencialista e sob a égide da nossa Constituição, uma condenação política exige obrigatoriamente a ocorrência de um crime de responsabilidade, cometido dolosamente e comprovado de forma cabal.
Lembrem-se do terrível precedente que a decisão pode abrir para outros presidentes, governadores e prefeitos. Condenar sem provas substantivas. Condenar um inocente.
Faço um apelo final a todos os senadores: não aceitem um golpe que, em vez de solucionar, agravará a crise brasileira.
Peço que façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal, na vida pessoal ou nas funções públicas que exerceu. Votem sem ressentimento. O que cada senador sente por mim e o que nós sentimos uns pelos outros importa menos, neste momento, do que aquilo que todos sentimos pelo país e pelo povo brasileiro.
Peço: votem contra o impeachment. Votem pela democracia.
Muito obrigada.
Edição: Amanda Cieglinski
O império da sucata e a soberania nacional 3x563d
Fernando Rosa – jornalista
Em janeiro de 2009, o embaixador dos EUA no Brasil Clifford Sobel enviou telegramas ao governo Norte-Americano com duras críticas ao Plano Nacional de Defesa do Brasil, anunciado em dezembro de 2008 pelo presidente Lula, segundo noticiou o jornal Estadão, na época. A informação tinha como fonte um conjunto de telegramas vazados pelo site Wikileaks, também responsável por vazar trocas de informações entre o atual presidente Michel Temer e autoridades dos EUA. Segundo a matéria, o relato destacava a preocupação com “o interesse do Brasil em controlar tecnologia nos setores espacial, cibernético e nuclear”.
Os telegramas também evidenciavam a preocupação – e uma certa ironia – de Sobel com a palavra “independência” que, segundo ele, demonstravam a vontade do Brasil em controlar a produção de armamentos, e com prioridade para alianças com países que transferissem tecnologia. Sobel também destacava a preocupação dos brasileiros com as descobertas de petróleo no mar e a sua utilização como razão urgente para melhorar a segurança marítima. “Essa preocupação se fundiu à busca de duas décadas do Brasil por desenvolver um submarino nuclear, dando um novo ímpeto à pesquisa sobre um pequeno reator para propulsão naval”.
O embaixador norte-americano também manifestava contrariedade ao Plano pelo seu caráter mais amplo de visão e concepção de segurança nacional. Para ele, “algumas das propostas do plano têm menos a ver em melhorar a estrutura militar e mais com a integração da Segurança Nacional com o desenvolvimento do País”. Em sua “análise”, o plano batizado com o nome de “Paz e Segurança para o Brasil”, dava ênfase em benefícios sociais “em detrimento ao profissionalismo no serviço militar” com o objetivo de minimizar “a capacidade dos militares de se envolverem na área”.
Ao contrário das especulações do embaixador americano, e do tom de intriga perseguido, o Plano afirmava que “a disposição para mudar é o que a Nação está a exigir agora de seus marinheiros, soldados e aviadores. Não se trata apenas de financiar e de equipar as Forças Armadas. Trata-se de transformá-las, para melhor defenderem o Brasil”. Nesse sentido, o Plano definia que “projeto forte de defesa favorece projeto forte de desenvolvimento. Forte é o projeto de desenvolvimento que, sejam quais forem suas demais orientações, se guie pelos seguintes princípios:
a) Independência nacional, efetivada pela mobilização de recursos físicos, econômicos e humanos, para o investimento no potencial produtivo do País. Aproveitar a poupança estrangeira, sem dela depender;
b) Independência nacional, alcançada pela capacitação tecnológica autônoma, inclusive nos estratégicos setores espacial, cibernético e nuclear. Não é independente quem não tem o domínio das tecnologias sensíveis, tanto para a defesa como para o desenvolvimento;
e ) Independência nacional, assegurada pela democratização de oportunidades educativas e econômicas e pelas oportunidades para ampliar a participação popular nos processos decisórios da vida política e econômica do País. O Brasil não será independente enquanto faltar para parcela do seu povo condições para aprender, trabalhar e produzir.
A cada dia que a, mais claras se tornam as evidências do envolvimento externo nas operações golpistas – desde as ações de rua em 2013, ando pela Lava Jato, até o recente “encontro” de John Kerry com José Serra. As manifestações de rua tentaram reproduzir as “primaveras” golpistas, a operação Lava Jato mirou na Petrobras e no Pré-Sal, nas empreiteiras nacionais e no submarino nuclear. Ao mesmo tempo, os chefes do golpe apostam no alinhamento unilateral e suicida aos Estados Unidos, do que não deixa dúvidas a imediata visita do senador Aloysio Nunes (PSDB) ao Pentágono, logo após o afastamento da presidenta Dilma Rousseff.
Ao mesmo tempo, é cada mais temerária a postura belicista norte-americana para impedir o desenvolvimento de países e regiões, do que são exemplos a destruição do Iraque e da Líbia, e as demais guerras no Oriente Médio. Os exércitos de China, Índia e Rússia, não por acaso três países do BRICS, por outro lado, junto com EUA e França serão as forças armadas mais poderosas do mundo em 15 anos, segundo publicação político-militar “The National Interest”. O que está em jogo, portanto, nesse momento, para os interesses nacionais, geopolíticos e militares, por certo, vai além dos temas da democracia e dos direitos sociais, embora fundamentais.
O povo brasileiro, em boa parte, nas ruas de todo o país, já demonstrou seu total repúdio ao golpe e aos golpistas interinos; enquanto outra parcela certamente reagirá ainda com mais vigor diante do “pacote de maldades” sociais previsto para o pós-impeachment, se vingar. O mundo, governos, lideranças intelectuais, políticos, artistas, até mesmo dos Estados Unidos, e a mídia internacional em sua grande maioria também identificam como um golpe de estado o que está em curso no país. A CNBB acaba de perguntar “para onde vamos?”, advertindo que “democracia é respeito à vontade do povo” e conclamando “ao diálogo e à busca de soluções democráticas que preservem as conquistas e os direitos do nosso povo”.
Em 1982, a Guerra das Malvinas sepultou a política de segurança nacional regional e mundial vigente até então, quando os Estados Unidos negaram munição à Argentina, deixando os argentinos à mercê da covarde e cruel agressão dos exércitos da Inglaterra. Da mesma forma o que os EUA pretendem agora, em ultima instância, é transformar o Brasil em comprador de suas sucatas e sobras de guerras superadas tecnologicamente. Pode ser uma ironia a visita do secretário de Estado John Kerry à equipe americana na Escola Naval, durante as Olimpíadas, no Rio de Janeiro, mas não tem nada de casualidade a perseguição e a absurda pena de 43 anos de prisão ao Almirante Othon, responsável pelo desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro.
Nos anos 70, o general Ernesto Geisel já havia apostado na multipolaridade, ao abrir relações diplomáticas e comerciais com a China, e na independência tecnológica, ao romper o acordo de fornecimento de material bélico com os EUA, assinando o Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, que resultou nas usinas Angra I e II, dando início a moderna indústria bélica nacional. Em sua Política de Defesa Nacional, sancionada em 2005, pelo presidente Lula, o Brasil definiu que “a segurança, em linhas gerais, é a condição em que o Estado, a sociedade ou os indivíduos se sentem livres de riscos, pressões ou ameaças, inclusive de necessidades extremas”. Neste momento em que tentam destruir o Poder e Estado nacional, assim como povo brasileiro, as FFAA não aceitarão o papel de “capitães do mato” do Império colonial, e honrarão a herança de Floriano Peixoto.
O Plano Nacional de Defesa
Movimentos retomam agenda de debates sobre o Cais Mauá 4i4c5m
Depois de semanas inteiramente dedicadas à preparação de uma audiência pública na Assembleia Legislativa – que lotou o auditório Dante Barone para debater o projeto de revitalização do Cais Mauá – os movimentos contrários ao modelo baseado na construção de edifícios, shopping center e estacionamentos na antiga área portuária de Porto Alegre retomam a agenda ordinária de reuniões e debates.
Leia o Dossiê Cais Mauá do Jornal JÁ
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Mudanças acionárias movimentam milhões
O primeiro encontro será nesta terça-feira, 29, às 18h, no Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura da Ufrgs. “É inegável que melhorias devem ser feitas nesse espaço, mas qual é a revitalização que realmente queremos">evento, que defendem levar a discussão para dentro da Universidade.
Na quinta-feira, 31, será a vez de ampliar o debate dentro do coletivo A Cidade Que Queremos, enfocando dessa vez, a política de meio ambiente de Porto Alegre. “Queremos avançar na proposta de um projeto de lei municipal visando uma Porto Alegre mais verde e construir posições coletivas diante das ameaças à democracia e suas implicações no campo ambiental”, explica o presidente da Agapan, Leonardo Melgarejo, que integra o grupo.
A reunião é aberta à participação de cidadãos ou entidades interessadas no tema e acontece às 14h na Sala Sarmento Leite da Assembleia Legislativa.
Já no sábado, 2 de abril, a partir das 16h, a pauta do Cais Mauá entre no debate do Conexões Globais, dentro da mesa “Movimentos Sociais por uma Cidade Mais Democrática“, que aborda ainda as ocupações organizadas de Porto Alegre e as ações pela redução da tarifa do transporte público na Capital.
Além de representantes dos movimentos Cais Mauá de Todos, Bloco de Luta pelo Transporte Público e das ocupações, o debate contará com a participação, via webconferência da militante do Ocupa Estelita, no Recife, Liana Cirne Lins.
O encontro, assim como as demais atividades do Conexões Globais ocorrem na Vila Flores, no bairro Floresta.