Apicultores assumem centro para pesquisar viroses que dizimam abelhas 4b2wf

Seis anos depois da extinção da Fepagro pelo governador Ivo Sartori, a Federação Apícola do RS assumiu a gestão do histórico Centro de Pesquisas de Taquari, que está em ruínas e será recuperado para pesquisas genéticas, formação, treinamento e reciclagem de produtores de mel. 2e4n17

Estima-se que serão necessários seis meses para limpar a área e retomar projetos abandonados, dando prioridade a problemas sanitários surgidos nos últimos anos.

Além de sofrer com o uso abusivo de agrotóxicos em lavouras, as abelhas estão sendo vítimas de seis espécies de vírus que vêm causando mortandade de 10 a 20% nas colmeias.

“Essas viroses equivalem a uma covid”, disse Ademir Haetinger, ex-presidente da FARGS, que terminou seu
mandato no sábado (6), quando foi substituído por David Vicenço, dirigente da Associação Caxiense de Apicultura.

Como as abelhas são bioindicadoras da sanidade ambiental, é urgente pesquisar causas e remédios para esses problemas. Por isso, será transferido para Taquari um laboratório apícola particular em atividade em Voçoroca, no noroeste do Rio Grande, última base operacional de Haetinger, nascido em 1960 em Ijuí.

O principal cientista envolvido nessas pesquisas é o veterano agrônomo Aroni Satler,  professor da UFRGS
que já foi diretor do centro apícola de Taquari, há mais de 40 anos, quando se iniciava na carreira. Uma das medidas em andamento é a coleta de abelhas em todas as regiões do Estado. “Nós precisamos que os apicultores nos enviem amostras de material para aprofundarmos as
investigações”, disse Haetinger, salientando que somente são válidas amostras com a identificação do apicultor e do local em que o material foi colhido.
Com tudo isso, Taquari retoma seu papel como núcleo apícola profissional iniciado na primeira década do século 20 pelo imigrante alemão Emilio Schenk, que liderou o setor no Rio Grande até falecer em 1945.

O parque tem 460 hectares e já abrigou nos anos 1920 uma faculdade de agronomia de fugaz existência. Parte da sua área deve ser usada para cultivos agrícolas propícios à criação de abelhas.

O município de Taquari foi grande produtor de laranjas, tanto que ali operou um centro de pesquisas em citricultura.  Após o desmanche promovido em 2017, a cambaleante Fepagro foi absorvida pela Secretaria da Agricultura, que acaba de fechar um convênio de dez
anos com a Federação Apícola, organismo privado que representa cerca de 30 mil apicultores.

O veterinário Clovis Schenk Bavaresco, bisneto do
pioneiro, aceitou trabalhar voluntariamente como novo diretor do centro apícola, em cujas dependências ou a infância — ele mora na frente do parque.
A formação de apicultores jovens é considerada fundamental para dar continuidade ao trabalho de uma maioria de produtores que envelheceram na atividade nos últimos 30 anos.

Se não houver renovação, a apicultura gaúcha corre o risco de sofrer um colapso produtivo que pode levar à
intensificação da importação de mel uruguaio, fonte eventual de abastecimento de exportadores estabelecidos nos três estados do Sul.

Novo presidente da Associação Brasileira de Imprensa pede mobilização pela democracia 6j6y5i

Começou  nesta sexta, 13 de maio, a nova gestão da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), uma das principais entidades da sociedade civil, fundada em 1908 no Rio de Janeiro.

A nova diretoria para o triênio 2022/25 é liderada pelo jornalista Octávio Costa, cujo discurso de posse, feito de improviso, não deixou dúvidas sobre sua orientação: “Minha posição pessoal, compartilhada pelos companheiros da diretoria, é pela eleição e posse de Lula, sem lugar para golpe”.

Ex-repórter de Veja, ex-editor do Jornal do Brasil, Octavio Costa começou sua fala de 10 minutos lamentando a falta da sogra Maria Prestes (viúva de Luiz Carlos Prestes), que faleceu de covid em fevereiro, depois de incentivá-lo muito a disputar a presidência da ABI.

“As mulheres foram fundamentais na vitória da nossa chapa, a começar pela vice-presidente Regina Pimenta”, lembrou Costa, que recebeu 361 votos contra 264 dados à chapa liderada por Cristina Serra e Helena Chagas.

Foi eleita “por aclamação e unanimidade” à presidência do conselho deliberativo da ABI a jornalista Irene Cristina Gurgel do Amaral. Para o conselho fiscal foi eleito um trio de peso: Luis Nassif, José Paulo Kupfer e Luiz Gonzaga Belluzo.

“NACIONALIZAÇÃO”

A posse da nova diretoria ocorreu numa cerimônia presencial no auditório lotado da ABI, onde foi instalado um telão em que todos puderam ver e ouvir intervenções virtuais de conselheiros situados em outros estados ou do Rio mesmo.

O Hino Nacional, por exemplo, foi cantado a capela por Beth Bruno de sua casa num local elevado da ex-capital federal.

O evento híbrido sinalizou a “nacionalização” da entidade, até agora concentrada no Rio, com escritórios em Brasilia e em São Paulo – a sede da ABI na rua Augusta 555 foi um dos palcos iniciais da fundação do PT em 1979/80.

A partir de sábado,  começou a campanha para aumentar o número de associados para 1 mil até o fim do ano. A primeira adesão (ao vivo) foi de Maria José Braga, presidente da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), que se declarou disposta a trabalhar em parceria com a ABI.

Em 2019, a entidade tinha apenas 290 sócios quites com a tesouraria. Agora são 701. “Se cada um dos eleitores arranjar um sócio novo, atingiremos a meta”, disse Marcelo Auler, um dos mais ativos militantes da ABI.

BRADO FORTE

Marcado pela informalidade e a sinceridade, o discurso do novo presidente começou lembrando o envolvimento da ABI com grandes campanhas democráticas como “O Petróleo é Nosso” (anos 50), a Anistia (anos 70) e “Diretas Já” (anos 80).

“A democracia é a alma da ABI”, bradou, dizendo-se inconformado com as ameaças de golpe feitas por generais vinculados ao governo Bolsonaro.

Lembrando que “não há lugar golpe”, Costa enumerou as principais bandeiras da ABI:

1 – Luta pela democratização dos meios de comunicação, sem monopólios nem oligopólios comandados por famílias ou grupos econômicos

2 – Luta pela regulamentação da profissão de jornalista

3 – Luta pela liberdade de expressão, de imprensa e pelos direitos humanos

No final, fez duas citações extraordinárias. Começou citando o jornalista Sergio de Souza, ex-Realidade, ex-Bondinho, ex-Placar, ex-Caros Amigos:

“Todo sábado, em sua casa em São Paulo, Serjão fazia uma feijoada para os amigos mas dela podia participar quem quisesse, pois a porta da rua ficava aberta”.

Usando a feijoada do Serjão como exemplo, ele afirmou: “A ABI estará aberta a quem quiser colaborar”. Para encerrar, referiu-se ao ex-governador carioca. “Eu sempre gostei muito do Brizola e gostaria de terminar essa fala como ele fazia em cerimônias públicas”.

Imediatamente, Octávio Costa levantou o braço direito e puxou o refrão do Hino da Independência, acompanhado pela plateia:

“Brava gente brasileira

longe vá temor servil

Ou ficar a pátria livre

ou morrer pelo Brasil”

 

Especialistas debatem o papel dos militares na crise brasileira 6sd6i

Foi lançado na noite de terça 16 de março o livro “Os militares e a crise brasileira” (Alameda Editorial), com 25 artigos de especialistas em assuntos militares, sob a coordenação de José Roberto Martins Filho, estudioso da história militar contemporânea da Universidade Federal de São Carlos.

Sem querer teorizar pois fez questão de dar a palavra aos colaboradores do livro, Martins deixou no ar uma pergunta: onde estão, se ainda existem, os nacionalistas das Forças Armadas? Ninguém respondeu.

Após largar com um atraso de meia hora, a live dirigida pelo editor Haroldo Sereza rolou sem percalços, enterrando o temor de sabotagens por hackers ligados ao governo militaróide do presidente Jair Bolsonaro.

Cada um dos articulistas teve de cinco a dez minutos para expor o conteúdo dos seus artigos, que resumem anos de estudos e investigações. Como disse Manuel Domingos Neto, “esse livro só foi possível graças a uma teia de muitos anos”, mas assim mesmo esse veterano pesquisador itiu que é preciso pesquisar mais para conhecer e definir “as fileiras desconhecidas que deram o golpe na democracia brasileira”.

Segundo ele, Jair Bolsonaro é apenas a ponta de um iceberg ancorado nas costas do Brasil.

Entre as novidades apresentadas pelos palestrantes e que estão explicadas no livro, destacam-se as seguintes:

+ Analisando as chamadas “guerras híbridas” – conceito criado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos em 1980 –, o antropólogo Piero Leirner explicou que os militares brasileiros assimilaram automaticamente a ideia de que na vida moderna a guerra não se faz apenas no âmbito militar, mas envolve “estratégias comunicacionais” para atacar inimigos que, no caso brasileiro, seriam o PT, o comunismo, as ONGs, o MST, os gays, os quilombolas e outros querelantes do status quo.

Situado no front dessa guerra híbrida, Bolsonaro seria o homem-bomba em quem os militares, como “elementos de salvação do caos”, estariam de olho… Conclusão de  Leirner: “Isso vai longe”.

+ Comentando o risco de ruptura institucional pela militarização do governo brasileiro, Eduardo Heleno lembrou a situação do Uruguai em 1968, quando Pacheco Areco assumiu o governo, abrindo caminho para a ditadura militar implantada em 1973.

+ Analisando a educação dos militares, a jornalista Anna Penido, especializada em pedagogia, atribui a um processo educacional distorcido a resistência dos militares brasileiros ao controle civil na democracia.

Por exemplo, a prioridade na instrução militar inibe o ensino de princípios de direitos humanos, de cooperação e integração.

Segundo Penido, os militares vivem num mundo paralelo que lhes garante privilégios como o de possuir não apenas uma educação específica, mas uma justiça própria e um exclusivo sistema de inteligência que paira sobre os civis.  + Eduardo Mei, professor de sociologia da Unesp de Franca, afirma que o governo militar está usando a pandemia como oportunidade de eliminar os “indesejáveis” da sociedade brasileira, a maioria pobre, daí o clamor contra o que vem sendo chamado de genocídio.

+ Eduardo Costa Pinto, da UFRJ, disse que os militares se envolveram tanto no governo – refletindo o chamado pensamento olavista (de Olavo de Carvalho, o guru bolsonarista), que representa a extrema direita dos EUA – que já não se sabe mais seu papel institucional, pois estão presentes na defesa, na segurança civil e na política, sem que se saiba exatamente se estão em todas por ideologia ou pragmatismo.

+ Pesquisando o mundo dos chamados “influenciadores digitais” que pairam sobre o governo Bolsonato, o jornalista Marcelo Godyoy, autor do livro A Casa da Vovó – Biografia do DOI-Codi 1969-1991, encontrou 115 oficiais superiores (principalmente do Exército) que operam uma rede de twittadores cujo assunto quase exclusivo são ações e medidas do atual governo.

Quase um terço desses oficiais é constituído por generais que “sustentam o bolsonarismo”. Com sua vivência como jornalista na área militar, Godoy fez um paralelo entre os atuais influnciadores digitais e os “guerreiros ideológicos” da época da ditadura que promoviam reuniões no Clube Militar. Como exemplo de “guerreiro ideológico”, ele citou o general Dale Coutinho, da chamada Linha Dura.

+ Uma das intervenções mais didáticas e serenas coube ao coronel da reserva Eduardo Pimentel, que afirmou: “O partido militar dificulta o estado democrático de direito”. Segundo ele, o PM tem o que os partidos têm: memória histórica, pautas corporativas e base eleitoral. Falta-lhe apenas legalizar-se. Será possível?

+ Decano da Faculdade de Sociologia da UFPR, Ricardo Costa de Oliveira fez a mais longa e contundente palestra da live.

Baseado em estudos genealógicos, afirmou que, ao contrário do que se diz, são poucos os militares (oficiais) egressos das classes populares. Os militares de altas patentes fazem parte das elites desde os tempos coloniais e, tal como os juizes e os políticos, possuem visões de mundo conservadoras.

Ele deu alguns exemplos. O atual vive-presidente, general Mourão, é filho de general. Augusto Heleno, filho de almirante. Os generais Villas Boas e Etchegoyen, ambos oriundos de famílias militares, uniram-se recentemente para golpear a democracia.

Essa visão conservadora é perpetuada pelas escolas militares.

 

 

Morreu Mestre Pinho, que formou gerações de jornalistas em Pelotas 5k51j

Morreu neste domingo em Pelotas o jornalista Jota Pinho, pioneiro na formação acadêmica de jornalistas pela Uel, a Universidade Católica de Pelotas.
Sem curso superior, deu aulas de técnica de jornal por mais de 20 anos. Formou várias gerações de repórteres. Também trabalhou como secretário de redação do Diário Popular, fundado em 1895, até hoje controlado pela familia Fetter.
Joaquim Salvador Coelho Pinho, seu nome completo, tinha 84 anos.
A seguir, o perfil  de Jota Pinho, publicado no livro coletivo “50 Tons de Rosa –
Pelotas no Tempo da Ditadura” (Artes e Ofícios, 2016)
O ator que foi Mestre em jornalismo
Geraldo Hasse
Jornalista, professor de jornalismo e publicitário, Joaquim Salvador Coelho Pinho foi um dos mais notáveis profissionais da comunicação social de Pelotas na segunda metade do século XX.
Nascido em 23/02/1936 em uma família de classe média – pai comerciário, mãe do lar – já antes dos 30 anos era um multimidiaman que trabalhava em três turnos de quatro a cinco horas cada um, deslocando-se pela cidade ao volante de um Renault Dauphine, o menor dos carros fabricados no Brasil nos anos 1960. Nas raras horas vagas, dedicava-se ao teatro.
Em seus três turnos de trabalho, Pinho praticava a comunicação social em três diferentes dimensões: pela manhã, tocava seu próprio negócio, uma agência chamada Domus Propaganda, pela qual assinava artigos de jornal e comentários de rádio em nome de Salvador Coelho.
À tarde era, simplesmente, Joaquim Pinho, secretário de redação do Diário Popular, o jornal mais antigo da cidade (1895), dirigido então pelo advogado Clayr Lobo Rochefort (1928-2012.
À noite, finalmente, era o professor-âncora do curso de jornalismo da Universidade Católica de Pelotas, fundada e dirigida pelo bispo dom Antônio Zattera (1899-1987). Foi na faculdade que ganhou dos seus alunos o título que o acompanharia pela vida toda: Mestre, Mestre Pinho.
De qual trabalho J. Pinho gostava mais? Onde se deu melhor? Minha impressão é que a manhã era para ele um sacrifício; a tarde, uma penitência; e a noite, a jornada mais prazerosa, pois era na sala de aula que se sentia mais livre.
Mas essa é uma simples impressão baseada na convivência que mantivemos no final dos anos 1960, quando fui seu aluno por três anos e, no último ano (1968), seu subordinado na redação do Diário Popular.
Infelizmente, não houve tempo para uma entrevista. Quando liguei para o mestre, em fevereiro de 2016, não rolou a comunicação desejada. The time is over, disse a máquina do tempo.
Foi então que me dei conta: fora a profunda iração e o respeito reverencial aos mestres, eu tinha poucos dados sobre a figura mais lembrada e querida pelos ex-alunos do jornalismo da Uel.
Como escrever o perfil de um estranho? Sim, estranho, pois nunca tive intimidade com o Mestre. Nunca fui à sua casa. Não sei onde morava quando éramos colegas de imprensa. Não conheci seus pais. Nunca soube se tinha irmãos, ignoro como foi sua infância e adolescência. O único parente seu que conheci em Pelotas foi seu primo Hamilton de Pinho, publicitário até debaixo d’água, mas os dois não se bicavam.
Enfim, Jota Pinho era um cara muito ocupado, não sobrou tempo para uma aproximação. Menos ainda depois que deixei Pelotas para me aventurar na imprensa do centro do Brasil. Mas vamos por partes, respeitando a cronologia dos dados.
Rádio
No início deste texto, mencionei o Dauphine de Pinho. É uma lembrança de 51 anos atrás. Eu me recordo da Figura assomando o topo da longa escadaria da Rádio Tupanci, na rua XV, defronte ao Diário Popular.
Ele chegava com uma pastinha embaixo do braço e, com uma mesura, entregava ao sonoplasta de plantão uma fita cassete contendo um comentário de cinco minutos (ou seriam dois minutos apenas?) a ser veiculado pouco antes do Jornal do Meio Dia. Qual o conteúdo?
Era uma crônica de utilidade pública sobre o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), o principal cliente da Domus Propaganda. Quem a lia e assinava era Salvador Coelho, a versão publicitária de Joaquim Pinho.
Confesso que nunca prestei atenção ao conteúdo das mensagens levadas ao ar por Salvador Coelho; o que me impressionava era o jeitão do sisudo mensageiro do SAAE. Ele se inspirava, provavelmente, nos locutores do serviço em português da BBC de Londres ou, quem sabe, nos caras da Voz da América – aquele timbre impávido, impecável, impoluto, impagável.
– Gosto muito dos comentários desse Salvador Coelho, parece ser um homem muito sério.
Era minha tia Elma se declarando fã dele e perguntando se eu o conhecia. Ela se preocupava com o saneamento, um dos temas de Salvador Coelho, porque morava nas Terras Altas, bairro onde os resíduos líquidos de matadouros e indústrias de conservas corriam em valas a céu aberto.
Num tempo em que poucos tinham aparelho de televisão era comum encontrar fãs de radialistas. O rádio tinha uma força extraordinária, era formador de profissionais de imprensa. Foi no meio radiofônico que Pinho começou. Na escola do rádio. Fazendo rádio-teatro…
Na casa das minhas tias, nas Terras Altas, havia uma caixa de fotos de artistas do rádio de outrora. Orlando Silva. Emilinha Borba. E outros mais. Para minha surpresa, havia lá um retrato (P&B 6×8) autografado de Gilberto Gomes, ex-Rádio Tupi, diretor da Tupanci e, mais tarde, professor do curso de comunicação social da Uel. Tudo a ver e ouvir. GG bem jovem fazendo pose de galã. O rádio era (ainda é) veículo que mesclava realidade e fantasias.
Eu ainda cursava o terceiro ano colegial quando comecei a trabalhar no departamento de jornalismo da Tupanci. Sabia o essencial sobre o ofício de informar porque havia frequentado um cursinho básico de jornalismo ministrado num final de semana pela Associação Riograndense de Imprensa.
E prestava atenção nos macetes usados pelas raposas do rádio, cuja programação misturava uma série de práticas como animação de auditório, divulgação musical, jornalismo e publicidade – não necessariamente nessa ordem de importância.
Na Tupanci, Gilberto Gomes jogava em todas as posições, mas deixava claro: quem comanda o espetáculo são os anunciantes. Ali, como em outros lugares, prevalecia a máxima expressa na frase “O cliente sempre tem razão”.
Pelo jeito, Salvador Coelho pensava a mesma coisa, mas sem o fanatismo da maioria dos publicistas da cidade. Em nossos encontros fortuitos dentro da rádio nunca fomos além dos cumprimentos formais. “Bom dia, tudo bem?” Por incrível que pareça, somente no início do ano seguinte eu descobriria que, além de trabalhar no Diário Popular, aquele careca meio esquisito era professor de jornalismo. Mas na Uel ele não era o Salvador do SAAE. Nem o tocador da redação do DP. Era uma terceira pessoa. Mais risonho e expansivo. Sem dúvida, era nesse terceiro papel que ele se sentia mais à vontade.
Paradoxo
”Professor de jornalismo que não teve a oportunidade de diplomar-se em curso superior (concluiu o colegial no Gonzaga e começou a trabalhar, batendo perna no comércio), J. Pinho se constituiu num paradoxo dentro da primeira universidade pelotense.
Quando a Uel abriu o curso de Comunicação Social (na Universidade de Brasília, o mesmo curso foi denominado Meios de Comunicação de Massa), ele se inscreveu como aluno mas logo, pela escassez de docentes, foi convidado a dar aulas. Natural, pois sabia mais do que qualquer um dos frequentadores do prédio da Gonçalves Chaves, onde tudo começou.
Entre pagar para estudar e receber um salário como professor, ele não teve dúvida. Naquela época, a universidade não fazia questão de títulos. Bastava o saber. Muito tempo depois, quando as regras mudaram e se tornou necessário possuir mestrado e/ou doutorado para ser professor universitário, Pinho foi obrigado a desocupar a cadeira. Mas aí o Mestre já estava careca de tanto lutar contra a burocracia.
“Tenho poucas anotações das aulas de Mestre Pinho na agenda de 1970 que me serviu de caderno para os quatro anos de estudo de Jornalismo (1972/1975). Sei que começamos por Roma. Anotei então: “Acta diurna popoli romana. Publicação diária dos acontecimentos no Senado. ‘Fofoca política’, periódica e atual, variedade, só lhe faltava circulação”.
Por essa rara lembrança de Lourenço Cazarré, vemos o quanto Pinho foi um autodidata erudito.
É pertinente lembrar que, no curso de jornalismo, Mestre Pinho nos apresentou apenas dois bons autores didáticos: o brasileiro Luiz Beltrão (1918-1986), que foi professor em Recife e Brasília; e o norte-americano F. Fraser Bond, que versava sobre o padrão jornalístico dos EUA.
Ambos editados pela Agir no início dos anos 1960, a Introdução ao Jornalismo (de Fraser Bond) e a Iniciação à Filosofia do Jornalismo (de Beltrão) eram praticamente os únicos alfarrábios disponíveis na época para o estudo deste ofício. O resto, no curso, eram ensinamentos práticos, obtidos no exercício da profissão e por meio de leituras. E foi aí que Pinho fez a diferença. Entre outras coisas, ele nos ensinou a regra básica do jornalismo norte-americano, segundo o qual o primeiro parágrafo de uma notícia (o lead) deve responder a cinco perguntas – o que, quem, quando, onde e como. Nós acrescentamos mais uma: por quê.
Na década de 1960, muitos professores de Pelotas desfrutavam de uma aura de prestígio que, certamente, começou a ser construída lá atrás por sábios como o francês Guilherme Minssen (anos 1910) e o polonês Ceslaw Maria Biezanko (anos 1930), profetas do cultivo da soja décadas antes que essa leguminosa chinesa se tornasse o carro-chefe da agricultura brasileira.
Depois da escola de Agronomia (1883), tivemos mais: Farmácia e Odontologia, 1911; Direito, 1912; Música, 1918; Ciências Contábeis, 1937; Belas Artes, 1949; Filosofia, 1953. Medicina e Jornalismo, anos 60. Com duas universidades, Pelotas se tornou um dos maiores pólos de ensino e pesquisa da América Latina. A base disso? Um baita elenco de escolas secundárias, entre as quais se destacam: Assis Brasil, Gonzaga, Pelotense, Monsenhor Queiroz, Santa Margarida, São José, Escola Técnica Federal, Visconde da Graça…
Poderíamos lembrar aqui os nomes de professores que deixaram rastros notórios na história educacional de Pelotas – alguns até se destacaram em cargos públicos, enquanto outros ficaram mal vistos por dedurar colegas aos órgãos de segurança da ditadura militar de 1964/85 –, mas não percamos o rumo: o único professor pelotense a operar em 3D foi J. Pinho.
Sendo assim tridimensional, não ira que tenha virado uma lenda entre alunos e repórteres, duas categorias que frequentemente viravam uma só nas mãos dele.
Mestre Pinho tinha olhos e ouvidos para a diversidade dos talentos rolantes nas ruas de Pelotas. A propósito, leiamos o depoimento de Ayrton Centeno (Pelotas, 1949):
O mestre Joaquim Salvador foi o cara que, para o bem ou para o mal, me inventou jornalista. Eu estava ali, na condição de revisor do nosso DP, e ia levando. Era, na carteira profissional, jornalista, por conta da legislação que assim considerou aqueles que exerciam o ofício até então, mas era um mero transeunte da coisa toda.
Meu destino era outro. Cursava direito e seria um causídico, faria concurso para promotor ou juiz. Na verdade não tinha muita convicção mas era algo por aí. Então o JP me convidou — acho que estimulado pelo Luiz Lanzetta — para trocar a revisão pela redação. Foi o que acabou mudando a minha vida.
Depois do Diário Popular, Centeno trabalhou como repórter e editor em vários veículos, terminando por se dedicar à produção de livros como Os Vencedores (Geração Editorial, 2014), que conta a história de militantes de esquerda que sofreram na pele a repressão da ditadura militar brasileira. Um excelente trabalho de um jornalista que não precisou do curso para se tornar uma referência profissional. Mas teve a ajuda providencial do Mestre num momento decisivo.
O espírito da época
Por um ano trabalhei nos fundos da redação do Diário Popular, onde haviam alojado o equipamento inédito na cidade: o teletipo, que despejava notícias nacionais (Agência JB) e internacionais ( Presse). Naquele ano, a salinha do fundo era mostrada com orgulho aos visitantes. E a mim, guardião do noticiário nacional/internacional, cabia resumir as matérias e á-las ao chefe. Mal sobrava tempo para ler um livro ou escrever uma crônica.
Lembro bem do dia 14 de dezembro de 1968, o day after do AI-5, que sacramentou a ditadura militar. No início da tarde, quando chegou o exemplar do JB, Pinho vibrou – braços para o alto, como um torcedor de futebol diante de um gol – ao perceber que o editor-chefe do jornal carioca, Alberto Dines, havia driblado a censura ao publicar no quadrinho da previsão do tempo, no alto da capa, uma nota dizendo que o país fora “varrido por um vendaval”, metáfora inaugural de um tempo em que os jornalistas precisariam usar de elipses, hipérboles e parábolas para tentar contar o que se ava. Também coloquei nas mãos do chefe Pinho grandes reportagens internacionais escritas por cobras da AFP sobre a guerra do Vietnã e a Primavera de Praga, a qual foi seguida pela invasão da Tchecoslováquia pelos tanques da URSS – tudo isso em 1968, o ano que até hoje inspira jornalistas, escritores e cineastas.
Quando deixei Pelotas para me aventurar na imprensa de São Paulo, indiquei para o meu lugar, como redator do Diário Popular, um ex-colega do secundário que estudava Direito. Goleiro campeão do citadino pelotense de 1967 pelo Esporte Clube Camponês, onde eu também jogava, Newton Peter tinha duas credenciais para trabalhar em jornal: escrevia bem e, além de ler escritores como Morris West (As Sandálias do Pescador), recitava Goethe em deutsche. De fato, ele se deu bem na cozinha do Diário Popular, tanto que se tornou editor e, mais tarde, secretário de redação, função que combinou com o exercício da advocacia.
Ao contrário de Centeno, bacharel que ficou no jornalismo para sempre, Peter optou finalmente pela carreira de advogado, mesmo depois de ter trabalhado por alguns anos na imprensa de Porto Alegre.
Como saí de Pelotas em 1969 e fiquei quase uma década sem voltar, não acompanhei as mudanças no jornalismo e na Uel. Hora de recorrer a outros ex-alunos para descrever melhor nosso personagem principal. Lourenço Cazarré (Pelotas, 1953), que se alçou do jornalismo para a literatura:
Aos 35 anos, o mestre Pinho tinha a parte central do crânio raspada por uma reluzente calvície. Na lateral, porém, exibia uma notável cabeleira de cacheados cabelos negros. Talvez para vingar-se da calvície que certamente o acometera muito cedo, ele exibia um formidável bigode. Um senhor bigode, para ser justo. Dois centímetros de altura e uns dez ou doze de extensão.
emos ao rosto. Mestre Pinho tinha uma cara redonda, um queixo fino, uma testa obviamente larga e uns olhos espertos. Espertíssimos. O mestre ria com os olhos. E ele ria muito. Às vezes eu tinha impressão de que ele mais se divertia do que ensinava. Ria sempre quando nos dirigíamos a ele.
O mais impressionante no Mestre era o gestual. Ele vinha do teatro, sabíamos. Movimentava-se muito pela sala. Obedecia cegamente a uma marcação, sem dúvida estabelecida por um bom diretor de cena. Assim que acabava de escrever algo no quadro, voltava-se imediatamente para nós, brusco, como se temesse uma punhalada pelas costas. E, a seguir, caminhava de um lado a outro, nervoso, falante, empolgado pelo discurso. Mas, de repente, freava. Essas paradas eram sensacionais. Ele se detinha subitamente, jogava o tronco para trás, cruzava os braços diante do peito, enterrava as mãos nos sovacos e exibia os ombros largos.
– E você, aí, rapaz, o que pensa disso?
– Bem, eu acredito que, na verdade, de certo modo, o senhor estava querendo nos dizer que…
– Muito bem, rapaz, obrigado.
Os olhos luzindo, gargalhando por dentro, sarcástico, o Mestre alisava o bigode. O dedão afagando o lado direito do gigantesco marandová, o fura-bolo, o esquerdo.
O Mestre também se divertia, e muito, com as moças que sentavam nas primeiras cadeiras e copiavam tudo o que ele dizia, vírgulas inclusive.
Quando alguém lhe fazia uma pergunta completamente imbecil, o que não era raro, ele não perdia o ensejo. Brecava, espantado, olhos esgazeados, sobrancelhas levantadas, testa enrugada.
– Como assim?
O Mestre achava que toda asneira, para melhor ser apreciada, tinha de ser repetida.
Pinho era respeitado pelos jornalistas e, mais ainda, pelos estudantes de jornalismo. Alguns o temiam e mitificavam.
Em minha última conversa com o professor Pinho, eu lhe contei das minhas intenções.
– Vou embora de Pelotas!
Sentado por trás da sua mesa, ele reprovou meu plano:
– Nem todos os jornalistas devem deixar a sua cidade natal, pois nós necessitamos de um bom jornalismo feito aqui, na nossa terra, por gente nossa.
Mas de todas essas agens que me vêm à memória, nunca me esquecerei de um episódio muito triste, quando perdemos dois colegas de turma – um rapaz e uma moça – que, aliás, eram notoriamente os preferidos do Mestre.
Um dia depois da perda daqueles dois estudantes, esperávamos pelo professor em sala. Surpeendentemente, ele não nos cumprimentou. Atirou com violência a sua pasta preta em cima da mesa, reclinou a cabeça sobre o móvel, ou as mãos no rosto suado. Em seguida, rumou aos janelões, jogando cada uma das suas partes para um lado, fazendo com que batessem na parede e produzissem um estrondo. E por ali permaneceu por alguns minutos, não sei se meditando, recompondo-se ou se maldizendo, até que conseguiu se voltar para nós. Caminhou, então, até o centro do quadro-negro, e firmou-se no chão como um pranchão que sustentasse bandeiras hasteadas a meio pau.
E nos falou:
– Se alguém, aqui nessa sala de aula, puder me dar uma explicação para o que aconteceu com estes dois jovens, colegas de vocês, tão cheios de vida e de planos, estes que, com certeza, seriam ótimos profissionais, por favor, me diga!
Depois, sem mais poder ocultar o que sentia, entregou-se a um pranto convulsivo.
Falta saber como atuava o mestre na redação. Era um gentleman, mas não dava mole para ninguém. Escutem mais um depoimento de Ayrton Centeno, o bacharel que abdicou do direito em favor do jornalismo:
Acho que o Jota Pinho, de uma maneira discreta, foi a principal força renovadora do Diário Popular num momento de sua história, que inclui os anos 60 e metade dos 70, justamente uma época em que o mundo — e o jornalismo — vivia em efervescência. Pinho e sua gestão compreenderam o espírito da época.
Afinal foi ele quem começou a colocar na redação gente que pensava jornalismo de uma maneira diferente do que sempre havia sido na história do jornal. Trouxe os seus alunos, rejuvenesceu a redação, até então entregue à geração anterior, de jornalistas feitos na própria lida diária. Lembro que, como revisor (comecei lá pelos 12 anos, ajudando, de graça, o então revisor da noite, o Vilas-Boas), recebia originais que eram simplesmente recortes do Estadão. Com uma emenda-foguete o, digamos, redator só trocava a data e tocava o barco. Brincava-se que o jornal não tinha reportagem e sim recortagem. E que no dia que roubassem as tesouras e giletes da redação não haveria jornal…
Essas coisas começaram a mudar com a aposentadoria dos mais velhos, a chegada dos mais novos e a adoção de outras práticas. Pinho não era o jornalista mais conhecido do DP — o que cabia ao Irajá Nunes e ao Clayr Lobo Rochefort — mas era quem estava mudando cara e conteúdo do Diário. Abriu espaço para os novos. Me colocou, primeiro, como editor de internacional e, logo, como secretário de redação.
Eu e o Lanzetta inventamos uma coluna de cinema. Pinho nos deu liberdade e incentivou. Ganhamos meia página por semana. Animados, criamos outra meia página semanal com dicas de gastronomia. Eu, com meu ex-comparsa de revisão, João Pedro Lobo da Costa, ei a uma terceira coluna sobre música popular. Eu, o Lanzetta, o fotógrafo Paulo Lanzetta (primo do Lanza) e o próprio Pinho lançamos pelo jornal um concurso de fotografia que teve uma carrada de inscrições e o DP, claro, publicou numa página os premiados.
Mas houve um momento em que a barra pesou no jornal e Pinho teve de sair. Junto com ele saiu a metade da redação, inclusive sua mulher Maria Clara Michels. Alguns foram trabalhar na Domus Propaganda, outros buscaram saídas fora de Pelotas.
O próprio Pinho saiu para o jornal Agora, de Rio Grande. Até que assumiu o cargo de diretor da Biblioteca Pública e também coordenou por largo tempo as atividades artísticas na Secretaria de Cultura do município. Mais uma vez estava no seu chão. Sobre o lado livresco do Mestre temos o depoimento de Klécio Santos, que fez de Pinho uma fonte rica em dicas e furos.
“Conheci Joaquim Salvador Pinho no começo dos anos 1990, quando ingressei na Católica. Era meu professor em três disciplinas: Teatro, Técnica de Redação em Jornalismo e Técnica de Edição em Jornalismo Gráfico.
Já sabia de sua fama como ativista cultural junto com a Maria Clara Michels à frente da retomada dos festivais de teatro em Pelotas a partir de 1985 ou como ator de peças de John Steinbeck, como Amor Ardente, pelo Teatro Escola, nos anos 1960, quando era conhecido como Jota Pinho, agens essas retratadas no meu livro Sete de Abril, o Teatro do Imperador.
À época em que ingressei no curso de Jornalismo, Pinho liderava a reconstrução da Bibliotheca Pública Pelotense após enxotar os vereadores que ocupavam o segundo piso do prédio, depois de uma longa ação judicial. Ainda lembro dele em meio aos escombros e andaimes. Comecei a trabalhar, no segundo semestre do curso, como estagiário na Rádio Pelotense. Depois ei a editor de Cultura do Diário da Manhã.
Ao final do curso, já como correspondente de Zero Hora, me encontrava com Pinho não só na faculdade, mas por conta das pautas. Invariavelmente, também avistava o Mestre em frente ao Campus II da Católica, onde ele podia ser encontrado dormindo dentro do seu carro (não recordo se era um Chevette). Pinho era das antigas, fazia questão de cultuar o estereótipo do jornalista boêmio. Eu o achava o máximo.
Às vezes, cruzava com ele no Laranjal onde eu também morava. Pinho estava sempre na frente do sobrado de tijolos, no jardim ou deitado na rede. Juntos, fomos jurados de concursos nas áreas de Teatro e Literatura. Fizemos várias matérias sobre a BPP para ZH como a retomada do Museu Histórico ou quando Pinho criou uma sala com obras raras com livros como Espinhos D’Alma, de Lobo da Costa, editado em 1872. Ainda me lembro em detalhes quando me chamou para anunciar a incorporação de duas obras de François Rabelais, escritas em 1546 e 1552, doadas pelos herdeiros do ex-ministro Adriano Cassiano do Nascimento. Ele sabia o que rendia notícia, tinha faro. “Pelotas consegue livro raro”, foi o título.
Embora eu fosse estudante, Pinho sempre me tratava como se eu já fosse um profissional. Jamais deu ouvido aos sindicalistas de plantão que buscavam seu apoio para denunciar a prática do jornalismo – no caso, a minha – antes de ser formado. Naqueles anos, não havia outro jeito. O alto custo das mensalidades obrigava os alunos menos abastados – no caso, eu – a terem uma renda.
Por tudo isso jamais me recusei a participar de suas empreitadas, até mesmo quando quis retomar o jornal laboratório Atuação. A ideia era “furar” os jornais da cidade com matérias mais elaboradas. Na verdade, Pinho queria mostrar que era possível fazer um bom jornalismo, mesmo através de um veículo universitário de oito ou 12 páginas. Lembro quando nos convocou. Éramos apenas oito alunos. Se topássemos, ele ia atrás de recursos para impressão (tudo naquela época era difícil). Lógico que aceitamos. Guardo até hoje o exemplar, confeccionado em papel jornal como manda o figurino, em formato tablete. Escrevi sobre a luta dos estudantes para retomar a meia-entrada nos cinemas em Pelotas. Nunca tinha visto Pinho com tanta motivação, quase um adolescente, orientando as entrevistas e revisando os textos, um verdadeiro editor como se estivéssemos no NYT. Nunca aprendi tanto.
Aliás, foram dele as principais dicas que recebi no jornalismo. “Jamais usar gravador”. Aquilo me invocava. Mas como? E ele sempre dizia que o gravador fazia com o entrevistador perdesse o foco. Sempre que possível, segui à risca essa orientação e, confesso, que os melhores textos, foram aqueles em que dispensei o instrumento.
Quando fiz uma pós em Patrimônio Cultural, precisava de uma carta de recomendação e Pinho me rotulou como “um dos seus melhores alunos”. Na época, vaidoso, não dei bola, mas hoje o saudosismo fala mais alto. Nunca tive tempo de agradecer. Então, faço aqui. Obrigado, mestre!”
Por fim, não percam o depoimento de Carlos Eduardo Behrensdorf, o Garça, outro autodidata que, só pra variar, se mandou para Brasília nos anos 1970:
“No Diário Popular fui repórter de “geral”. Cobria de tudo um pouco, ou seja, era pau pra toda obra. Acumulava cobertura de esportes e, depois, polícia. Virei chefe de reportagem e secretário de redação. Este foi o meu trajeto percorrido no jornal de novembro de 1968 a fevereiro 1973.
Diariamente, me encontrava com o Pinho para o fechamento. Quando eu pisava na redação, ele levantava a cabeça, olhava firme e perguntava: ”E aí, meu rapaz”? Era chegada a hora da prestação de contas sobre pautas cumpridas ou não.
Com ele aprendi a respeitar a profissão e, mais do que isso, a entender um jornal por dentro, da primeira à última página, numa fase de mutação: era a chegada do “lead” e da diagramação.
Os espaços ficaram valorizados. Notícias na primeira e na última página aram a ter um crivo de valor de conteúdo e estética. Uma pergunta detonava a discussão: “Vale primeira página”? A primeira página do Diário Popular era seu cartão de apresentação.
Com Jota Pinho também aprendi a fazer legendas. Quem não é do ramo não sabe o que é escrever com espaço limitado, sem computador. Tenho um recorde: reduzir 18 linhas para quatro.
Quando entreguei ao Pinho, ele sacudiu a cabeça, afirmativamente, grafou a fonte dos tipos e abriu a janelinha para a oficina. Lá se foi minha legenda, intacta.
Fiquei parado na frente dele, esperando um elogio. Ele levantou a cabeça, me olhou, sorriu e disse: “Tá me olhando por quê? Te manda, meu rapaz… Amanhã tem mais”.
Ousado mas sem rompantes, Pinho se pautava pela discrição. Em aula ou na redação, não há registro de que alguma vez tenha levantado a voz para qualquer uma das centenas de pessoas que estiveram diante de suas mesas de trabalho na faculdade, no jornal, na publicidade, na biblioteca pública ou no departamento de cultura.
Aparentemente incapaz de dar uma bronca nos subordinados, tratava alunos e repórteres por um genérico “meu rapaz”, expressão amistosa e professoral que não causava estranheza, pelo menos nos meios universitários e jornalísticos. Na Pelotas sesquicentenária, a absoluta maioria dos praticantes de jornalismo era do sexo masculino. As mulheres ainda eram minoria nas salas de aula. Nas redações, menos ainda.
Ouçamos o que nos diz Núbia Ferro, a primeira ex-aluna do Jornalismo da Uel contratada para trabalhar na redação do Diário Popular:
Não tenho dúvidas de que o professor Joaquim Pinho foi o grande responsável pela minha formação profissional para um jornalismo sério, isento e investigativo. De todos os professores que tive durante o curso de Comunicação Social na Uel, Pinho foi o mais capaz de transmitir a seus alunos como se faz um bom jornalismo. Sem deixar de lado a teoria necessária, ele nos levou à prática, apontando nossos erros e acertos, nos orientando como sempre buscar o aperfeiçoamento. Tenho especial gratidão a esse grande mestre, que me proporcionou trabalhar e ser requisitada para grandes jornais nacionais, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo,O Globo e Correio Braziliense, entre outros.
Quarta dimensão: o teatro
O cabelo só na volta da cabeça produzia uma imagem marcante, próxima dos retratos de William Shakespeare. Contribuía para a semelhança o nariz aquilino do mestre pelotense. Permitam que o chame de ShakesPinho.
E aqui chego ao ponto que pode dar origem a 1001 divergências: nosso Mestre possuía uma quarta dimensão – a paixão pelo teatro. Sim, nosso multimidiaman amava o teatro mais do que a cátedra, o jornal ou a propaganda.
A imprensa, as aulas e a agência de reclames foram seus ofícios de sobrevivência numa cidade que sempre se destacou na arte de representar papéis idealizados – a Atenas Riograndense, a Princesa do Sul… –, oscilando entre os extremos da carolice e do pernosticismo.
No início de sua vida profissional, Pinho fez rádio-teatro, ofício que o ensinou a empostar a voz, a dosar a respiração e a istrar o tempo das falas. Ele não era um grande orador, às vezes se deixava levar pela ansiedade, mas sabia conduzir-se diante de quaisquer plateias. Claramente não gostava de aparecer, mas a vida o colocou em posições de evidência. Contradições da existência, diria ele, à maneira de Shakespeare.
Sentindo-se talvez sem espaço para ser ator numa cidade onde só havia lugar para o brilho da estrela solitária do professor-ator Luiz Carlos Correa da Silva (pelo menos uma vez por ano ele lotava um auditório com o monólogo As Mãos de Eurídice, de Pedro Bloch), Pinho criou o Teatro Experimental do Jornalismo de Pelotas (TEJOP), ao qual dedicava suas horas de lazer, sem remuneração, com ensaios nos sábados à tarde ou em aulas noturnas. Era um hobby intelectual, quase um exercício terapêutico. Nada mais romanticamente shakespeareano no fog pelotense, mais conhecido como cerração.
Em 1967, na flor dos seus 31 anos, lá estava ele encenando O Amante, do inglês Harold Pinter, um dos principais nomes do teatro do absurdo. O papel-título era de José Luiz Mendonça, ator escolado que também representava o marido da personagem principal, vivida por Zaida Guterres; o elenco era completado por José Cruz, escalado para uma aparição-relâmpago, como o leiteiro da história.
Os três atores eram alunos do Jornalismo. E de quem era o cenário? Da genial Lenir de Miranda, artista plástica que, além de trabalhar na Domus Propaganda, cursaria jornalismo – mais para ilustrar-se do que visando tornar-se profissional – na primeira metade dos anos 1970.
A peça estreou com casa cheia no palco-auditório do Colégio Gonzaga, berço do aprendizado teatral do nosso ShakesPinho. No intervalo da peça, uma surpresa: abriu-se uma cortina no fundo do palco e lá estava o conjunto musical Os Lobos, que fazia sucesso na cidade e na região.
O público, pouco familiarizado com o teatro, recebeu o show como parte do sofisticado enredo de Harold Pinter. Absurdo por absurdo, foi J. Pinho quem apresentou a Pelotas um conteúdo teatral até então conhecido apenas em Londres, Nova York e Rio-São Paulo. Cabe inserir aqui uma conclusão algo tardia de Lourenço Cazarré:
Décadas depois, acho hoje que Pinho nunca foi um professor. Era um rapaz já maduro que representava, e como representava bem, o papel de Mestre numa peça de um só ator, ele, diante de uma displicente platéia de uns trinta gatos pingados.
Antes tarde do que nunca
A combinação de rádio+jornalismo+magistério+teatro levou Pinho a esticar a corda tanto nas atividades profissionais quanto na vida pessoal. Depois do primeiro casamento com Maria Nanci, com quem teve um filho (Marcelo), nosso Mestre se apaixonou por uma aluna chamada Maria Clara Michels, com quem casou para sempre (tiveram dois filhos, Juliana e Joaquim Filho). Tudo isso sem a bênção do bispo, sem perder o cargo no jornal do prefeito, sem renunciar ao posto de professor e sem precisar fugir da cidade de Glória Menezes, a gloriosa atriz que fez como a lagunense Anita Garibaldi, a heroína de dois mundos.
Para encerrar, leiamos o email-resposta de Maria Clara Michels Pinho, a eterna Macacha, enviado em 26 de fevereiro de 2016, três dias depois de Sal, seu apelido na intimidade familiar) ter completado 80 anos:
“Estamos juntos há 43 anos, ele foi meu professor também e acabamos com nossos casamentos para ficarmos juntos. Foi bem escandaloso na época, principalmente por ser meu professor e pela diferença de idade. Ele quase foi expulso da Católica”.
 
 
 
 
 

Marcela é a planta medicinal mais usada no RS 48364

Das 50 plantas medicinais mais usadas no Rio Grande do Sul, apenas 20 são nativas. As outras 30 foram trazidas de fora por imigrantes que ao longo dos séculos sacramentaram seu uso pela população em geral.

Entre as plantas nativas, a campeã é a marcela, ou macela. Dos vegetais exóticos, o mais usado é o capim-cidró. A lista foi montada por técnicos da Secretaria Estadual de Saúde a partir de levantamento realizado em 134 publicações de 1984 a 2015.

Baseada na Lei Estadual 12.560/2006 e no Decreto Federal 5.813/2006, que regem o uso da fitoterapia na saúde popular, a relação das plantas mais usadas no RS consta da Portaria 588/2017 assinada (em 5/12/2017) pelo secretário João Gabbardo dos Reis para atender ao interesse do Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo a portaria, as plantas medicinais abaixo, separadas em quatro listas, podem formar “farmácias vivas” nos municípios, sendo usadas como chás ou para projetos de inovação farmacêutica.

Plantas medicinais nativas mais usadas no RS 1q4y2f

Nº de ordem / Espécie / Família / Nome popular

1 Achyrocline satureioides (Lam.) DC. Asteraceae – Marcela

2 Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek Celastraceae   – Espinheira-santa

3 Baccharis crispa Spreng. (=Baccharis trimera (Less.) DC.) Asteraceae – Carqueja

4 Bauhinia forficata Link Fabaceae  –  Pata-de-vaca

5 Eugenia uniflora L. Myrtaceae   – Pitangueira

6 Casearia sylvestris Sw. Salicaceae  –  Erva-de-bugre

7 Luehea divaricata Mart. & Zucc. Malvaceae  – Açoita-cavalo

8 Phyllanthus niruri L. Phyllanthaceae  – Quebra-pedra

9 Cunila microcephala Benth. Lamiaceae – Poejo

10 Coronopus didymus (L.) Sm. Brassicaceae – Mastruço

11 Ocimum carnosum (Spreng.) Link & Otto (ex Benth. (=Ocimum selloi Benth.) Lamiaceae  – Alfavaca

12 Plantago australis Lam. Plantaginaceae  –  Tansagem

13 Sida rhombifolia L. Malvaceae  – Guanxuma

14 Stachytarpheta cayennensis (Rich.) Vahl Verbenaceae  – Gervão

15 Aloysia gratissima (Gillies & Hook.) Tronc. Verbenaceae  – Erva-santa

16 Campomanesia xanthocarpa (Mart.) O.Berg Myrtaceae  – Guabiroba

17 Lippia alba (Mill.) N.E.Br. ex P. Wilson Verbenaceae  –  Sálvia-da-gripe

18 Mikania laevigata Sch.Bip. ex Baker Asteraceae  –  Guaco

19 Baccharis articulata (Lam.) Pers. Asteraceae  –  Carqueja-miúda

20 Polygonum punctatum Elliott Polygonaceae  –  Erva-de-bicho

21 Aristolochia triangularis Cham. & Schltdl. Aristolochiaceae  –  Cipó-mil-homens

22 Pluchea sagittalis (Lam.) Cabrera Asteraceae  –  Quitoco

23 Sambucus australis Cham. & Schltdl. Adoxaceae  –  Sabugueiro

24 Solanum paniculatum L. Solanaceae  –  Jurubeba

25 Cuphea carthagenensis (Jacq.) J.Macbr. Lythraceae  –  Sete-sangrias

26 Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltr.) Micheli Alismataceae  – Chapéu-de-couro

27 iflora edulis Sims ifloraceae  –  Maracujá

28 Chaptalia nutans (L.) Pol. Asteraceae  –  Arnica

29 Sphagneticola trilobata (L.) Pruski (= Wedelia paludosa DC.) Asteraceae  –  Arnica-do-mato

30 Mikania glomerata Spreng. Asteraceae  –  Guaco

31 Moquiniastrum polymorphum (Less.) G. Sancho (=Gochnatia polymorpha (Less.) Cabrera) Asteraceae  –  Cambará

32 Parapiptadenia rigida (Benth.) Brenan Fabaceae  –  Angico vermelho

33 Blepharocalyx salicifolius (Kunth) O.Berg Myrtaceae  –  Murta

34 iflora alata Curtis ifloraceae  –  Maracujá

35 Psidium cattleianum Sabine Myrtaceae  –  Araçá

36 Acanthospermum australe (Loefl.) Kuntze Asteraceae  –  Carrapicho-rasteiro

37 Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze Amaranthaceae  –  Penicilina

38 Erythrina crista-galli L. Fabaceae  –  Corticeira-do-banhado

39 Solidago chilensis Meyen Asteraceae  –  Erva-lanceta

40 Urera baccifera (L.) Gaudich. ex Wedd. Urticaceae  –  Urtiga-brava

41 Bromelia antiacantha Bertol. Bromeliaceae  –  Banana-do-mato

42 Elephantopus mollis Kunth Asteraceae  –  Suçuaiá

43 Ilex paraguariensis A.St.-Hil. Aquifoliaceae  –  Erva-mate

44 Jodina rhombifolia (Hook. & Arn.) Reissek Santalaceae  –  Cancorosa

45 Muehlenbeckia sagittifolia (Ortega) Meisn. Polygonaceae  –  Salsaparrilha

46 Leandra australis (Cham.) Cogn. Melastomataceae  –  Pixirica

47 Piper mikanianum (Kunth) Steud. Piperaceae  –  Pariparoba

48 Scutia buxifolia Reissek Rhamnaceae  –  Coronilha

49 Varronia curassavica Jacq. Boraginaceae  –  Baleeira

50 Waltheria communis A.St.-Hil. (=Waltheria douradinha A. St.-Hil.) Malvaceae –  Douradinha

5q145w

Plantas medicinais nativas mais pesquisadas no RS 563a3p

Espécie  /  Família  / Nome popular

Achyrocline satureioides (Lam.) DC. Asteraceae  –  Marcela

Ageratum conyzoides L. Asteraceae  –  Mentrasto

Baccharis crispa Spreng. (=Baccharis trimera (Less.) DC.) Asteraceae  –  Carqueja

Bauhinia forficata Link Fabaceae  –  Pata-de-vaca

Bixa orellana L. Bixaceae  –  Urucum

Casearia sylvestris Sw. Salicaceae  –  Erva-de-bugre

Cedrela fissilis Vell. Meliaceae  –  Cedro

Dodonaea viscosa Jacq. Sapindaceae  – Vassoura-vermelha

Erythrina crista-galli L. Fabaceae  –  Corticeira-do-banhado

Eugenia uniflora L. Myrtaceae  –  Pitangueira

Euphorbia prostrata Aiton Euphorbiaceae  –  Quebra-pedra

Ilex paraguariensis A.St.-Hil. Aquifoliaceae  –  Erva-mate

Lippia alba (Mill.) N.E.Br. ex P. Wilson Verbenaceae  –  Sálvia-da-gripe

Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek Celastraceae  –  Espinheira-santa

Mikania glomerata Spreng. Asteraceae  –  Guaco

iflora alata Curtis ifloraceae  –  Maracujá

iflora edulis Sims ifloraceae  –  Maracujá

Phyllanthus niruri L. Phyllanthaceae  –  Quebra-pedra

Piper umbellatum L. (=Pothomorphe umbellata (L.) Miq.) Piperaceae  –  Pariparoba

Psidium cattleianum Sabine Myrtaceae  –  Araçá

Schinus molle L. Anacardiaceae  –  Aroeira

Scoparia dulcis L. Plantaginaceae  –  Tupeiçava

Sida rhombifolia L. Malvaceae  –  Guanxuma

Solanum mauritianum Scop. Solanaceae  –  Fumo-bravo

Plantas medicinais exóticas (naturalizadas e cultivadas) mais usadas e pesquisadas no RS 326h4r

 Nº de ordem / Espécie / Família / Origem* / Nome popular

1 Cymbopogon citratus (DC.) Stapf Poaceae Naturalizada  – Capim-cidró

2 Matricaria chamomilla L. Asteraceae Exótica – Camomila

3 Foeniculum vulgare Mill. Apiaceae Naturalizada – Funcho

4 Rosmarinus officinalis L. Lamiaceae Exótica – Alecrim

5 Melissa officinalis L. Lamiaceae Exótica – Melissa

6 Cynara scolymus L. Asteraceae Exótica – Alcachofra

7 Bidens pilosa L. Asteraceae Naturalizada – Picão-preto

8 Artemisia absinthium (Mill.) DC. Asteraceae Exótica – Losna

9 Aloe arborescens Mill. Asphodelaceae Exótica – Babosa

10 Tanacetum vulgare L. Asteraceae Naturalizada – Catinga-de-mulata

11 Achillea millefolium L. Asteraceae Exótica – Mil-folhas

12 Malva sylvestris L. Malvaceae Exótica – Malva

13 Plectranthus barbatus Andrews (=Coleus barbatus (Andrews) Benth.) Lamiaceae Exótica – Boldo-brasileiro

14 Psidium guajava L. Myrtaceae Naturalizada – Goiabeira

15 Salvia officinalis L. Lamiaceae Cultivada – Sálvia

16 Symphytum officinale L. Boraginaceae Exótica – Confrei

17 Ruta graveolens L. Rutaceae Exótica – Arruda

18 Persea americana Mill. Lauraceae Naturalizada – Abacateiro

19 Plantago major L. Plantaginaceae Naturalizada – Tansagem

20 Mentha x piperita L. Lamiaceae Exótica – Hortelã-pimenta

21 Syzygium cumini (L.) Skeels Myrtaceae Naturalizada – Jambolão

22 Taraxacum officinale F.H. Wigg. Asteraceae Exótica – Dente-de-leão

23 Petiveria alliacea L. Phytolaccaceae Naturalizada – Guiné

24 Malva parviflora L. Malvaceae Exótica – Malva

25 Calendula officinalis L. Asteraceae Exótica – Calêndula

26 Eriobotrya japonica (Thunb.) Lindl. Rosaceae Naturalizada – Nêspera

27 Mentha pulegium L. Lamiaceae Naturalizada – Poejo-miúdo

28 Dysphania ambrosioides (L.) Mosyakin & Clemants (=Chenopodium ambrosioides L.) Amaranthaceae Naturalizada – Erva-de-santa-maria

29 Zingiber officinale Roscoe Zingiberaceae Cultivada – Gengibre

30 Arctium lappa L. Asteraceae Exótica – Bardana

31 Pimpinella anisum L. Apiaceae Exótica – Erva-doce

32 Anethum graveolens L. Apiaceae Naturalizada – Endro

33 Chelidonium majus L. Papaveraceae Exótica – Celidônia

34 Tagetes minuta L. Asteraceae Naturalizada – Chinchila

*classificação segundo site da Lista de Espécies da Flora do Brasil (http://floradobrasil.jbrj.gov.br)

Lista complementar das nativas do RS prioritárias para pesquisas com financiamento do SUS 6k5z2j

Espécie  /  Família  /  Nome popular

Acanthospermum australe (Loefl.) Kuntze Asteraceae – Carrapicho-rasteiro

Aloysia gratissima (Gillies & Hook.) Tronc. Verbenaceae – Erva-santa

Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze Amaranthaceae – Penicilina

Aristolochia triangularis Cham. & Schltdl. Aristolochiaceae – Cipó-mil-homens

Baccharis articulata (Lam.) Pers. Asteraceae – Carqueja-miúda

Blepharocalyx salicifolius (Kunth) O.Berg Myrtaceae – Murta

Bromelia antiacantha Bertol. Bromeliaceae – Banana-do-mato

Campomanesia xanthocarpa (Mart.) O.Berg Myrtaceae – Guabiroba

Chaptalia nutans (L.) Pol. Asteraceae – Arnica

Coronopus didymus (L.) Sm. Brassicaceae – Mastruço

Cunila microcephala Benth. Lamiaceae – Poejo

Cuphea carthagenensis (Jacq.) J.Macbr. Lythraceae – Sete-sangrias

Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltr.) Micheli Alismataceae – Chapéu-de-couro Elephantopus mollis Kunth Asteraceae Suçuaiá

Jodina rhombifolia (Hook. & Arn.) Reissek Santalaceae – Cancorosa

Leandra australis (Cham.) Cogn. Melastomataceae – Pixirica

Luehea divaricata Mart. & Zucc. Malvaceae – Açoita-cavalo

Mikania laevigata Sch.Bip. ex Baker Asteraceae – Guaco

Moquiniastrum polymorphum (Less.) G. Sancho (=Gochnatia polymorpha (Less.) Cabrera) Asteraceae – Cambará

Muehlenbeckia sagittifolia (Ortega) Meisn. Polygonaceae – Salsaparrilha

Ocimum carnosum (Spreng.) Link & Otto ex Benth. (=Ocimum selloi Benth.) Lamiaceae  – Alfavaca

Parapiptadenia rigida (Benth.) Brenan Fabaceae – Angico vermelho

Piper mikanianum (Kunth) Steud. Piperaceae – Pariparoba

Plantago australis Lam. Plantaginaceae – Tansagem

Pluchea sagittalis (Lam.) Cabrera Asteraceae – Quitoco

Polygonum punctatum Elliott Polygonaceae – Erva-de-bicho

Sambucus australis Cham. & Schltdl. Adoxaceae – Sabugueiro

Scutia buxifolia Reissek Rhamnaceae – Coronilha

Solanum paniculatum L. Solanaceae – Jurubeba

Solidago chilensis Meyen Asteraceae – Erva-lanceta

Sphagneticola trilobata (L.) Pruski (= Wedelia paludosa DC.) Asteraceae – Arnica-do-mato

Stachytarpheta cayennensis (Rich.) Vahl Verbenaceae – Gervão

Urera baccifera (L.) Gaudich. ex Wedd. Urticaceae – Urtiga-brava

Varronia curassavica Jacq. Boraginaceae – Baleeira

Waltheria communis A.St.-Hil. (=Waltheria – Douradinha

Fonte: Portaria SES/RS 588/2017, por indicação da Dra. Silvia Czermainski

Há uma rede de pesquisadores de plantas medicinais no serviço público de saúde 2o1r69

Em vias de aposentar-se na Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, onde trabalha há 39 anos, a farmacêutica Silvia Ciemainski decidiu manter-se trabalhando em sua especialidade — o uso de plantas medicinais na saúde pública –, mesmo sabendo que a escassez de recursos orçamentários criou uma situação extremamente desfavorável à pesquisa e ao uso de fitoterapia no Serviço Único de Saúde (SUS).
Para Silvia, não teria cabimento desanimar só porque o tratamento da maioria das doenças é feito com medicamentos sintéticos fabricados por grandes laboratórios industriais. Ela coordena há 13 anos no RS um programa que, ao nascer em 2006, envolveu 13 ministérios coordenados pelo de Saúde. No Rio Grande do Sul, foi criado o projeto Planta Viva, liderado pela farmacêutica Jussara Cony, militante do PCdoB que chegou a exercer o cargo de deputada estadual. Graças a uma rede de mais de 800 pessoas, o Planta Viva se espalhou por todo o território gaúcho, onde “cada município tem pelo menos uma prática nessa área”, informa a Dra. Silvia.
A lei estadual 12560/2006, denominada lei da fitoterapia, prescreve práticas integradas, em contraponto à fragmentação da prática médica, dividida em especialidades que se ignoram ou pouco se comunicam entre si. Além de fazer seminários para difundir os objetivos e métodos de uso de plantas medicinais no SUS, o departamento de Silvia (composto por oito especialistas) promove cursos de 42 horas para capacitação de pessoal, dando ênfase às políticas públicas, ao princípio da integralidade, esmiuçando a legislação e ensinando o cultivo de espécies vegetais e sua aplicação. Já aram pelo curso 320 pessoas. Ela acredita que a partir de 2020 o uso de plantas medicinais vai virar rotina na gestão da Saúde, como já acontece em alguns municípios.
Nova Petrópolis, na Serra Gaúcha, é modelo de atuação no SUS. Lá, além de cultivar, o pessoal colhe, seca e embala o material fitoterápico. Para chegar a esse nível, chamado de “farmácia viva”, o município precisa ter um horto, como acontece também no município de Sapucaia do Sul, na Grande Porto Alegre. O Jardim Botânico de Porto Alegre, ameaçado de extinção pelo governo de Ivo Sartori (2015-2018), foi preservado sob a responsabilidade do biólogo Fernando Vargas.
O berço da farmácia viva no Brasil é Fortaleza. Em Curitiba, funciona sob o comando do Dr. Graça. No Espírito Santo, sobressai Henriqueta Sacramento. No Maranhão, onde trabalha a Dra. Moema, há mais de 500 farmácias vivas. Em Pelotas, destaca-se a Embrapa. No Rio, a Fundação Osvaldo Cruz. Em tudo quanto é lugar, a Emater, que dá assistência a agricultores familiares, indígenas e quilombolas. No Cepes, em Porto Alegre, onde trabalham seis pessoas, foram criadas quatro patentes na época do governo Olívio Dutra. No Ministério da Saúde, a pessoa de referência se chama Katia Torres. Parece pouco, mas é uma rede.
Segundo um levantamento sobre as 50 espécies vegetais mais usadas em fitoterapia, concluiu-se que 30 não são nativas, contrariando exigência da lei 12560. A partir dessa descoberta, o pessoal envolvido com o projeto ou a focalizar a salvação de espécies nativas ameaçadas de extinção, como a espinheira santa. “Não é fácil trabalhar no universo vegetal”, diz Silvia, salientando que só de carqueja há 60 variedades, nem todas portadoras dos mesmos princípios ativos.
Por tabela, ou-se a encarar mais fortemente o trabalho das abelhas no campo da preservação da biodiversidade, ameaçada pelo uso predatório de produtos químicos de alta toxicidade na agricultura. Segundo a Dra Silvia, os riscos sobre os seres vivos crescem à medida que se agravam os sinais das mudanças climáticas na superfície terrestre.
 
 
 

Profissionais debatem os caminhos da comunicação na era digital 3p6m2t

Uma centena de pessoas, seis palestrantes e um mediador estiveram no MenuPOA desta terça-feira (3), no 7º andar do Palácio do Comércio, no centro de Porto Alegre, para refletir sobre “Para Onde Vai a Comunicação” no mundo dominado pela digitalidade.
Duas horas depois, a pergunta restou sem respostas, mas deixou no ar uma síntese possível: o avanço da tecnologia é inevitável pois, segundo a percepção da maioria dos falantes, a comunicação se tornou indispensável à sobrevivência  das empresas, que precisam vender seus produtos a pessoas mais conectadas (esta a palavra) no mundo digital do que na vida real.
Antes das intervenções dos convidados, o presidente da Associação Comercial, Paulo Afonso Pereira, colocou algumas balizas para situar a platéia. Ele começou falando de Gutemberg, o alemão inventor da imprensa no século XV, até a revolução cibernética, nos anos 1980, quando os computadores . Já no século XXI, a  interconexão propiciada pelo  iphone permitiu reproduzir cenas e falas instantaneamente pelas redes sociais.
“Facebook é veículo de comunicação?” A pergunta do mediador ficou sem resposta, pois cada um dos palestrantes convidados trouxe de casa ou do seu office falas pragmáticas, resumidas nos parágrafos abaixo:
Fernando Silveira, do Sindicato das Agências de Propaganda: “Eu não sei para onde vai a comunicação, mas quero ir junto. Seja como for, é essencial que os profissionais da comunicação tenham ética ao buscar posicionamento para suas marcas”.
Renata Schenkel, da Associação Riograndense de Propaganda: “O fato de todo mundo estar conectado à internet, sentindo-se mesmo fora do mundo quando não está com o celular ligado, torna nosso trabalho profissional mais difícil. Tudo é mídia, até a chaminé do Total é mídia”.
Fernando Lemos, do Conselho Estadual de Relações Públicas: “Não podemos esquecer que o poder está nas mãos das pessoas.”
Moisés Costa, da Associação Brasileira de Agências Digitais (Abradi): “Precisamos observar três tendências: o crescimento da apropriação de conteúdos digitais, o desenvolvimento da inteligência artificial para produção de dados, diante do que é preciso ser criativo na exploração dos dados.”
Alexandre Koubronsky: “Precisamos aprender a utilizar dados para adquirir audiências, eis a chave do nosso trabalho.”
Cristiane Finger, vice-presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e professora de jornalismo: “Como em todo processo de competição entre espécies, a mídia está num momento de reciclagem e ninguém sabe o que vai sobrar da atual disputa por espaço, mas a tendência é que a tecnologia se adapte. Diz-se que ‘todo mundo está no digital’, mas a maioria das pessoas ainda se informa pela TV e pelo rádio. Sim, as redes sociais são veículos de conteúdo, mas as pessoas se cansaram de ficar ouvindo caladas, querem participar e interagir, especialmente em bairros onde os chamados usuários inquietos têm muita informação sem veiculação. Daí talvez possamos concluir que a função do jornalista mudou. Agora nós somos mediadores. amos muito tempo falando sozinhos. Há muito espaço para trabalhar. Não esqueçam que 51% dos municípios brasileiros não têm nenhum veículo de comunicação. Nenhum!”.
 
 
 
 

Emater lança livro sobre a pobreza no campo p6v4g

Dez dias depois de encerrada a Feira do Livro, saiu uma das obras mais
importantes do ano: lançado na manhã desta terça (26/11) no auditório da
“extinta” Fundação de Economia e Estatística (FEE), o livro de 252
páginas relata a experiência de extensionistas da Emater na execução do
Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais e o Combate à
Pobreza Rural no Rio Grande do Sul.
São seis relatos sobre diversos aspectos do programa criado em 2012,
logo após o lançamento do Bolsa Família (2011), para estudar e amparar
famílias situadas na faixa da extrema pobreza (com renda inferior a dois
dólares por dia). Das 400 mil propriedades rurais familiares, 50 mil
vivem em situação de extrema pobreza, lembrou o agrônomo Luiz Fernando
Fleck.
A tarefa coube à Emater, a instituição público-privada que se dedica a
ajudar os agricultores não protegidos pelo guarda-chuva do Pronaf. A
experiência levada a 250 mil famílias foi um sucesso: ajudou a gerar
renda, melhorou a autoestima, treinou e deu esperança a famílias rurais
“esquecidas” pelas instituições públicas e vistas com preconceito pela
sociedade em geral. O fomento alcançou também indígenas e quilombolas.
O programa deu visibilidade aos invisíveis, disse Catia Griso, do
Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Rural, da UFRGS, que deu
apoio à experiência da Emater. O problema é que as verbas para
assistência técnica rural foram radicalmente cortadas nos últimos anos.
Em 2019 caíram para R$ 173 milhões; para 2020, estão programados R$ 73
milhões num contexto de crescimento da pobreza, aumento da desigualdade
de renda e ampliação da vulnerabilidade social.
O agrônomo Lauro Bernardi, que participou do piloto do Fomento levado a
Fontoura Xavier, o município mais pobre do Estado, com 10,7 mil
habitantes no Alto da Serra do Botucaraí, fez um relato dramático sobre
os efeitos do extensionismo aos miseráveis dos grotões perdidos desse
interior situado a pouco mais de 200 km da capital. A sua conclusão,
transformada em conselho aos colegas da Emater, da UFRGS e do Ministério
da Cidadania (que custeou a publicação do livro), é que não se deve
“subordinar a mitigação às mudanças estruturais”. Em outras palavras, é
preciso botar o pé na estrada e estender as mãos — com métodos
profissionais, criatividade e coragem para superar a burocracia — para
levar um mínimo de cidadania aos que mais precisam.  As pessoas
vulneráveis reagem à chegada das instituições públicas. “Em Liberato
Salzano”, relatou Bernardi, “o Fomento gerou uma dinâmica tal que no
final, das 50 famílias assistidas, 20 tinham construído casas novas”.

Direito ao equilíbrio climático, o novo front da ecologia 4g7367

GERALDO HASSE
Apavorada com o degelo do Ártico, a comunidade de Kivalina, um vilarejo do Alaska, está processando a Exxon e outras petroleiras indiciadas como responsáveis primárias pelo aquecimento global causador das mudanças climáticas.
Embora apresente poucas chances de vitória, este processo foi apontado nesta quinta (31/10) pela promotora Ana Maria Marchesan como um sinal das demandas levantadas ao redor do mundo por pessoas lesadas por transtornos ambientais e dispostas a lutar por alguma forma de ressarcimento.
O caso de Kivalina foi citado como exemplo extremo de desespero ambiental numa exposição sobre o panorama da jurisprudência brasileira diante do agravamento das mudanças climáticas provocadas pelo efeito estufa.
Duas dezenas de jornalistas que participam de um curso promovido pela Fabico, da UFRGS, sobre como cobrir a crise climática, ouviram a procuradora Marchesan concluir sua fala com a seguinte afirmação: “Prevenção e precaução são mais importantes do que mitigação e reparação de danos ambientais”.
Mais tarde, comentando os riscos ambientais do megaprojeto carboquímico de Charqueadas/Eldorado do Sul, ela itiu que “o carvão nos apavora”, referindo-se à preocupação de todos os procuradores do meio ambiente envolvidos na análise do empreendimento da Copelmi não apenas quanto à poluição do ar nas comunidades vizinhas, mas em relação ao risco de contaminação das águas que abastecem Porto Alegre, cidade que não tem plano de emergência para o abastecimento de água, como lembrou o geólogo Rualdo Menegat.
Lembrando que “o direito ambiental não nos pertence” e que, “por definição, a lei não contém palavras inúteis”, Marchesan disse que é obrigatório, por lei, promover audiências públicas junto às comunidades potencialmente impactadas por projetos de mineração e outros.
No Superior Tribunal de Justiça, o mais avançado em questões ambientais, já se firmou a norma segundo a qual “In dubio, pro natura”. Para se orientar, os técnicos em direito ambiental se baseiam na Constituição — artigos 1, 23, 170 e 225). E todos são obrigados a respeitar tratados internacionais como o Acordo de Paris, de 2015.
Por fim, Marchesan lembrou que o Rio Grande do Sul possui desde 2010 uma lei estadual (a 13.594/10, assinada pela governadora Yeda Crusius) sobre as mudanças climáticas.
É uma longa (4 850 palavras) e bem intencionada carta de intenções cujo artigo 13 tem a seguinte redação:  “Cabe ao Poder Público propor e fomentar medidas que privilegiem padrões e coeficientes de produção, comércio e consumo, de maneira a reduzir a demanda de insumos, energias, utilizar materiais menos impactantes e gerar menos resíduos, com conseqüente redução das emissões dos gases de efeito estufa.”
 

Cooperativismo mostra sua cara (sem as marcas da crise) 2s5p2g

Com um crescimento de 12% em 2018, o cooperativismo gaúcho está dando uma lição a um Brasil que oscila entre a recessão e a estagnação da economia. Mas tal sucesso não é um fenômeno exclusivo do Rio Grande do Sul. O cooperativismo em Santa Catarina, do Paraná, de Goiás…mostra resultados tão ou mais brilhantes.
Há um Brasil Cooperativo que prospera sem sinais de crise, operando perfeitamente com mecanismos próprios de governança, de acordo com normas aperfeiçoadas ao longo do século e meio da doutrina nascida na Europa convulsionada pelo confronto do capitalismo x socialismo.
O sucesso realçado dias atrás pelo líder Vergilio Perius em evento na Federasul, em Porto Alegre, recoloca no ar a pergunta: até que ponto o cooperativismo pode ser uma alternativa real para sair do atoleiro em que o Brasil se meteu por apostar exclusivamente no capitalismo?
O cooperativismo amadureceu e parece estar curado da queda do início da década de 1980, quando o edificio político-econômico da Centralsul desabou junto com o “default” do Brasil sob o governo do general Figueiredo, o último dos cinco generais responsáveis pela ditadura de 1964.
Parece não haver dúvida de que os líderes cooperativistas aprenderam a lição: melhor andar pelas próprias pernas do que acreditar em governos inseguros ou se deixar usar por ministros com excesso de poder.
Durante o “milagre econômico” (1968/1975), que propiciou a eclosão da sojicultura no país, alguns lideres do cooperativismo se deixaram instrumentalizar pelo governo.
Ari Dionisio Dalmolin da Fecotrigo e Rubem Ilgenfritz da Silva da Cotrijuí foram talvez as maiores vítimas do regime, do qual se tornaram agentes involuntários —  a Fecotrigo como trading company ancorada em Chicago e a Cotrijuí como colonizadora no Cerrado e na Amazônia.
Depois vimos uma espécie de renascimento do cooperativismo no primeiro governo petista, quando (2003) o presidente Lula nomeou ministro da Agricultura o agrônomo paulista Roberto Rodrigues, renomado líder cooperativista global.
Ensaiou-se ali um grande “revival” cooperativista enquanto se dava um enorme impulso à agricultura familiar e se prometia dar chão à reforma agrária, atendendo a demandas que já haviam sido parcialmente acolhidas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso (1995/2002).
As pressões contrárias foram tantas do lado político-empresarial que em dois anos Rodrigues caiu fora do governo, deixando claro que, para ele, o Brasil só iria para a frente mediante o fortalecimento do agronegócio ou, seja, adotando o viés ultracapitalista da agricultura com “plantations”, “tradings”, transgênicos e tudo que as empresas transnacionais prescrevem como fórmula ideal para produzir alimentos.
Quanto à agricultura familiar, que tratasse de ficar contentinha nos seus cantinhos de terra.
Olhando de fora, conclui-se que dentro do governo petista, sob Lula, quem ganhou a parada foram os grandes grupos empresariais enraizados no sistema financeiro, além dos exportadores de commodities originárias do agronegócio.
, Bunge, Cargill, Louis Dreyfus…Essas e outras saíram ilesas da crise de 2008 que torpedeou a Sadia, a Aracruz. Até o grupo Votorantim foi pego no contrapé e precisou de uma ajuda substancial do Banco do Brasil.
Em vez de perseverar no apoio ao cooperativismo, restou ao petismo a ideia – bizarra, para dizer o mínimo — de apostar no fortalecimento de grandes grupos identificados como “campeões nacionais”, alguns dos quais estão hoje enrolados em processos judiciais.
Se tinham vocação para campeões, por que precisariam de ajuda do governo? Já o cooperativismo ficou do lado de fora das festas dos campeões…
Hoje se pode perguntar tranquilamente: em vez da competição desenfreada que leva ao conflito em que o mais forte ganha sempre, por que não investir na cooperação e na conciliação dos interesses?
Os marxistas condenavam o cooperativismo porque, diziam, ele “mascarava” a luta de classes e, com isso, retardaria a chegada do socialismo.
Democrático e solidário, o cooperativismo pratica o capitalismo mas distribui as sobras dos seus negócios entre todos os membros da sociedade.
Os governos brasileiros, oscilando entre o paternalismo estatal e o individualismo grosseiro do capitalismo, andam um o para a frente e depois ficam marcando o por anos a fio, paralisados por desavenças ideológicas cujo resultado mais notório é a exclusão de imensas maiorias. Não é exatamente isso que se vê agora?
O cooperativismo é uma porta aberta para um caminho equidistante dos extremos.